domingo, 6 de maio de 2012

O que vai na Praça

O AMBIENTE ANDA TURVO E O HOMEM NÃO SABE



Quem tem as rédeas da Região desconhece como resfolegam de raiva os bofes do povo. O dinheiro evaporou-se dos bolsos e, quando isso acontece, a populaça deixa de enxergar bem. Qual política de subsídios que beneficiou tantos, qual obra feita, quais empregos dos primos e tios! Falta pão na mesa para os pequenos, o carro foi devolvido ao banco e o apartamento segue o mesmo caminho, pois importa saber quem levou ao descalabro a economia desta terra infeliz. Parece não faltar muito para o interesseiro do povo se esquecer das espetadas e vinho seco das inaugurações e virar as iras para o paternalista rei das Angústias.

Há dias em que nem apetece a uma pessoa dar a voltinha higiénica pelo nosso aterro.

Todos os cidadãos conscientes conhecem a situação. Eis por que toda a gente se admirou com a teimosia de um frequentador da esplanada, baixote com bigode amarelado, que tem um irmão a trabalhar naqueles serviços ligados à presidência. O indivíduo insistiu sem descanso na ideia de que o homem lá de cima continua bem a leste da realidade.
- Ele não sabe que o povo passa fome? - insurgia-se o ex-bancário, boquiaberto.
- O que ele diz é que a situação está sob controlo e que não há nada que recear - transmite o do bigode.
- E as dívidas da Madeira que vamos pagar? Ainda aqui vamos, isto vai piorar!
- Pois o homem insiste em dizer que está tudo normal. Que as dívidas serão todas pagas.
- Mas - intromete-se o contabilista sem trabalho - os próprios homens de mão que ele tem à volta dizem cá fora que a tragédia não demora muito a rebentar...
- Para ele, não há problemas que o aflijam - torna o bigodes - Tanto assim é que ele diz à mesa do café, ao sábado no 'Number Two', que ninguém ficará com dinheiro por receber. Os amigos já perceberam que ele tudo fará para continuar a mandar depois de 2015.
- Já não manda nada...
- Homem, o que ele quer é o gabinete na Quinta Vigia com funcionários às ordens, umas inaugurações de veredas para poder aparecer na televisão e duas ou três viagens a Bruxelas por mês. 
- E fingir que manda - sopra o ex-bancário.
- Mas os amigos não tentam abrir os olhos ao cavalheiro? - abana-se o contabilista sem trabalho.
- Qual! - suspira o bigodes - Ele senta-se no café com o João Dantas, o Luís Dantas... o Carvalhinho das Finanças... o Dr. Sampaio... Acha que eles vão lançar ideias para apanharem um raspanete do grande chefe?! Só quem não conhece aquele feitio mimado, que se melindra com tudo e com nada.
- Mais do que certo, ele não vai largar isto da mão - profetiza o ex-bancário. Em último caso, barrica-se dentro do quarto de banho da presidência para não se deixar arrancar de lá.
- E estamos nós entregues a um inconsciente para quem está tudo bem, como se não houvesse 22 mil desempregados, pobreza envergonhada, sem-abrigo aos pontapés - remata o contabilista, desolado - Muito gosta ele daquilo, de vender o peixe às massas...
- Isso das massas passou à história, como vemos agora nos adros - intervém o empregado de mesa enquanto distribui chávenas de café pelos clientes - O que as pessoas querem saber não é o rosário de tretas que o tipo despeja para cima de cada um, no adro. O que se quer saber é por que é que a gasolina é mais cara na Madeira do que no resto da Europa toda, acho eu. O que se quer saber é por que não souberam negociar, nem puderam por causa das dívidas loucas do governo regional... por que é que temos 22% de IVA e sai tudo ainda mais caro do que no Continente, por causa dos transportes.
- Realmente, nisso...
- O que se quer saber é por que é que uma garrafa de gás custa na Madeira 16 euros e nos Açores 27, isso é que se quer saber. A garrafa é a mesma, o gás é o mesmo... e o transporte para os Açores é mais longo. Isso é que queremos saber, não é a teoria da maçonaria e do Sócrates que ele ainda despeja por aí.

O empregado sai da mesa vermelho como um pero da Ponta do Pargo. E a cavaqueira continuou pela manhã deste sábado fora. Cada circunstante a lançar o seu tema. Registámos algumas ideias.


Pingo Doce: a corrida, os atropelos, as discussões, os confrontos físicos... por preços baratos. Imaginem o que não será um dia, pelo caminho para onde este governo regional nos leva, se faltarem mantimentos!

Traidores: o chefe da Madeira costuma falar em traidores, referindo-se a quem não lhe protege as costas quando das suas delirantes diatribes com Lisboa. Pois um dos convivas da esplanada recordou uma quadra que o povo cantava quando, também por incúria de D. Henrique, Portugal perdeu a independência:

O cardeal D. Henrique / viva no inferno muitos anos / Por ter entregue / Portugal aos castelhanos.

E o mesmo conviva trazia a seguinte adaptação, relativa ao momento presente de subjugação financeira:

O chefe Bokassa / viva no inferno muitos anos / por ter entregue / a Madeira aos cubanos.


Broncas na ALM: não se percebe o motivo de espanto de ser o chefe da bancada do PSD a mandar em Miguel Mendonça. Alguma vez foi diferente?!


Deslize de Coelho e a hipocrisia do sistema: o deputado do PTP mostrou uma foto no Parlamento num acto francamente infeliz de que ele próprio depois se penitenciaria. Mas andam aproveitando isso para lhe denegrir o seu trabalho político. Ora, os familiares da senhora da foto não gostaram do sucedido. Normalíssimo. E os adversários de José Manuel Coelho tentam envenená-los e indispô-los mais do que já estão. 
Evidentemente que o deputado pretendia alcançar o efeito contrário daquele que alcançou. Seguramente, ele não ofenderia de propósito a memória de alguém. A forma infeliz tramou o conteúdo da acção. Mas respondam os puritanos da política tribal: é verdade ou é mentira que se têm sucedido os suicídios em consequência das misérias que este país e esta região vêm causando ao adormecido povo?
Pelos vistos, temos por aí muitos moralistas sem mácula, mestres do dramatismo e do farisaísmo, ideais para lançar a primeira pedra contra quem peca. Há um pormenor a que dar atenção, porém: o lapso no parlamento, grave, saiu mal na forma, porque visava outro efeito: alertar para uma situação desesperada que afecta cruelmente as classes desfavorecidas. O mesmo não se poderá dizer de quantos se aproveitaram de 50 vítimas mortais das enxurradas no 20 de Fevereiro. E outro pormenor: num caso, houve pedidos de desculpas, em público; no segundo caso, houve contas bancárias a engordar e proventos políticos de monta.
O embaraço teria também sido muito menor se as TV's reparassem atempadamente na gravidade daquele lapso.
A hipocrisia do sistema não tem tamanho.


Ao fim desta manhã de sábado, nem sequer nos apeteceu dar a saltada do costume ao aterro.



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