É UM SUSTO O
NOSSO QUOTIDIANO
GAUDÊNCIO FIGUEIRA
Nos tempos
que correm, quando a moral está morta e enterrada, mercê dos muitos casos
protagonizados por eleitos para a AR ou autarquias, ainda nos conseguimos
chocar com certas notícias! Tomar conhecimento de decisões da Comissão de Ética
da AR, acrescendo-lhe os negócios que, na esfera privada, envolviam Homens
Públicos foram, há anos, as primeiras notícias chocantes. Face àquela
realidade, eu achei que o País – Portugal, um vetusto Estado-Nação – deveria
mudar de nome. Assentava-lhe muito bem: Centro Angariador de Negócios Obscuros,
CANO. Há eleitos impunes que, por fraca formação cívica dos eleitores, acabam
reeleitos deputados ou autarcas, quando já haviam dado provas de falta de
ética. Alguns casos, sobretudo autarcas, acabaram mesmo condenados em Tribunal
por práticas criminosas.
No pós-Abril,
o debate de ideias fez-se numa comunicação social cuja isenção deixava muito a
desejar. Ela abordava pela rama questões essenciais, sempre impregnadas de
doses intoleráveis de propaganda, visando caçar votos para uma determinada
facção. Jornalismo de investigação, procurando o essencial dos factos, acabava,
no mínimo, em amedrontamento. O chamado “contencioso da autonomia” viveu disto.
A retórica Madeirense tinha duas vertentes: éramos um bom exemplo para o País,
quem não se lembra do sistema de Saúde?; trapalhadas de negócios pouco ou nada
transparentes, logo diziam “lá” é pior.
Ouvi da boca
do Prof. Jacinto Nunes, – fiz com ele o exame da minha penúltima cadeira,
Economia Portuguesa – a descrição da sua experiência na nacionalização da
banca. Foi hilariante ouvi-lo dissertar sobre a insistência na nacionalização
da CGD, instituição pública há muito. O Estado Novo era “amigo” muito próximo
do Poder Financeiro, mas também partidário do princípio: “amigos, amigos
negócios à parte”; controlava as finanças públicas através da “nossa” CGD. Dava
prejuízo manter a agência de “Cebolais de Cima”? Pois que desse, a população
precisava da agência, e ela lá estava.
O descontrolo
e a falta de ética das elites geraram o impensável. A propaganda assente numa
forte componente anti-comunista, diabolizou a nacionalização da banca. A
Madeira, com créditos firmados na captação das remessas de emigrantes, ainda
por cima fixados em zonas sensíveis ao “comunismo” – Venezuela e África do Sul
– beneficiou do facto de ter no seu território uma Instituição com
características de Banco Privado, a Caixa Económica do Funchal. Com a banca
nacionalizada, preocupado com o controlo da despesa pública e com a falta de
meios de pagamento sobre o exterior – lembram-se de exportarmos banana de
avião? Foi por falta de dólares que “os cubanos” suportaram aqueles preços – o
“tecnocrático” Min. das Finanças de Sá Carneiro admitiu a prisão de um Pres.
Câmara despesista.
Os grupos
financeiros regressam lentamente a Portugal. O GES retoma actividade em 1986. O
Totta em 1989. Em 1996, na sequência de várias negociações surgiu o BCP. O Gov
Regional da Madeira, durante dez anos, em manifesto abuso de poder, aproveitou
os depósitos em moeda estrangeira feitos na CEF, financiando-se com esse
dinheiro. Residia nisso o milagre que se exibia ao País. Falida a CEF, em
Janeiro de 1988, com o beneplácito de Cavaco Silva surgiu o BANIF inserido na
privatização da banca. Consta que terá custado 3 milhões de contos. Não
servimos de exemplo mas, infelizmente, o tempo comprovaria que “lá foi pior”.
Fica-nos a
sensação de que neste festim, pós-privatizações, entre eleitos e donos do
capital, os eleitos apenas querem de nós os votos e os impostos e os
Capitalistas, ditos portugueses, têm por pátria a Goldman Sachs. É uma vergonha
vermos as posições de homens como Ricardo Salgado, nas audições na AR, a
entrevista de Jardim Gonçalves ao Público, ou a afirmação de Miguel Sousa,
Pres. da Assembleia Geral do BANIF, em que disse desconhecer a venda de
produtos tóxicos pelo banco. Jardim Gonçalves, nas suas negociatas em Espanha,
com o argumento de que a CGD era banco público, impediu um negócio útil à
Economia Portuguesa. A CGD, jóia da coroa do sistema financeiro, perdia posição
e seria tomada de assalto. Em nome da rentabilidade “Cebolais de Cima” perderia
mais tarde o balcão.
Porém, à
Madeira cabe o prémio “guiness da asneira”. Qual o grau de credibilidade que
pode ter uma Administração Pública, que pactua com um peditório para promover a
restituição de uma verba exigida, pelo Tribunal, a três dirigentes da UM’a? Já
nada me admira mas acho que não vai ser possível afirmar aos quatro ventos: “lá
é pior”.
2 comentários:
O me mais desagrada é que todas essas trafulhices são feitas na presunção de que o pagode é estúpido e não dá conta do que verdadeiramente se passa. Mas, felizmente, resta ainda muito boa gente que não se deixa enganar.
E é bom não deixar cair no esquecimento.
A máquina da propaganda ao dispor é poderosa.
Infelizmente ela conta com o desinteresse das "vítimas" que não compreendem as defende.
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