A incrível tragédia
Vitorino
Seixas
A expressão em título é de Jean Claude Junker
que, impressionado com os números aterradores do desemprego jovem nas Regiões
Ultraperiféricas (RUP), classificou essa realidade como a “incrível tragédia” ¹.
No seu discurso, no 4º Fórum das RUP, o
Presidente da Comissão Europeia aproveitou para pôr os pontos nos is: “Temos de conjugar esforços, no combate ao desemprego, essa
é uma responsabilidade nossa e dos governos. É partilhada. A UE não tem
resposta para tudo” ¹.
Neste contexto, de responsabilidade
partilhada, o que tem sido feito pelo governo regional? Comecemos por analisar
os números do desemprego jovem na Madeira tendo em consideração o quadro da
“Evolução do Desemprego Jovem na Madeira” ², elaborado com base nas
Estatísticas de Emprego da RAM, publicadas pela Direção Regional de Estatística
da Madeira (DREM). Basta uma leitura superficial para constatarmos que os
números do quadro não conferem com os números do governo regional. As estatísticas
divulgadas no 4º Fórum ¹ referem que a taxa de desemprego na Madeira é de 14,7%
e a taxa de desemprego jovem de 50,6%, sem indicar o mês ou ano a que se
referem essas taxas. No entanto, na análise efetuada às estatísticas regionais verificou-se
que a taxa de 14,7% de desemprego ocorreu no 4º trimestre de 2015 e coincide
com a média anual de 2015. Assim, se considerarmos o ano de 2015, segundo as
estatísticas da DREM, a taxa de desemprego jovem foi de 42,8% e se
considerarmos o 4º trimestre de 2015 foi de 38,4%. Entretanto, a taxa de
desemprego jovem baixou para 37,4% no 4º trimestre de 2016.
Face à divergência apurada, qual é o interesse do governo regional em
divulgar, por ocasião do 4º Fórum das RUP, uma taxa de desemprego jovem que não
corresponde à realidade? Será que publicando taxas muito altas o governo
regional acredita que o Presidente da Comissão Europeia ficará sensibilizado
para a “incrível tragédia” e dará mais uns milhões para a Madeira e as RUP
combaterem o desemprego jovem?
Acresce que, uma análise mais pormenorizada do
quadro da “Evolução do Desemprego Jovem na Madeira” ² permite constatar que as
estatísticas da DREM, que apresentam valores não coerentes com o histórico de anos
anteriores, suscitam as maiores dúvidas quanto á credibilidade das
estatísticas. Para termos uma ideia, façamos uma comparação com as estatísticas
publicadas pelo Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP) ³ que constam do
quadro “Evolução do Desemprego Jovem em Portugal” ⁴, as quais incluem os Açores
e a Madeira.
Neste quadro, verificamos que as variações entre
os quatro trimestres de 2016 e entre o ano de 2015 e 2016 são relativamente
pequenas quando comparadas com as variações apuradas no quadro relativo à
Madeira. Por exemplo, a população ativa jovem na Madeira teve uma redução de
23,9% entre o 4º trimestre de 2016 e o de 2015, quando a nível nacional teve
uma redução de 1,8%, ou seja, 13 vezes menos. Mais, a população empregada jovem
na Madeira teve uma redução de 22,7% entre o 4º trimestre de 2016 e o de 2015,
quando a nível nacional teve um aumento de 5,5%.
Em síntese, na Madeira, a população ativa
jovem desceu 23,9%, a população empregada jovem desceu 22,7% e a população
desempregada jovem desceu 26,0%. Três descidas que constituem um “fenómeno
único” cuja explicação está no segredo dos deuses do governo regional. Não
deixa de ser muito estranha a descida da população jovem desempregada quando a
população jovem empregada também desce. Por outras palavras, há menos jovens desempregados,
mas não cresceu o número de jovens empregados. Pelo contrário, também desceu,
quase na mesma percentagem.
No entanto, a situação é ainda mais estranha
quando observamos que a nível nacional as variações dos três indicadores
(população ativa, empregada e desempregada) são muito reduzidas, entre o 3º
trimestre e o 4º trimestre de 2016, oscilando entre uma redução de 0,7% e um
aumento de 4,3%, quando na Madeira se verificam reduções entre 21,2% e 28,3%.
Outro “fenómeno único” é a elevada redução de 15% na taxa de desemprego jovem
na Madeira, entre o 3º trimestre e o 4º trimestre de 2016, quando a nível
nacional há um aumento de 4,1%.
Perante as estatísticas do quadro “Evolução do
Desemprego Jovem na Madeira” ² pode
concluir-se que a taxa de desemprego jovem baixou, essencialmente por duas
razões: uma grande limpeza de desempregados jovens e um aumento da
emigração jovem.
Contra factos não há argumentos. Na verdade, há
uma tragédia no desemprego jovem na Madeira, mas a “incrível tragédia” é esconder os jovens debaixo do tapete da
população inativa, condenando-os a um futuro perdido.
¹ Juncker
quer travar “incrível tragédia”
²
“Evolução do Desemprego Jovem na Madeira”
³
“Boletim Estatístico” do Gabinete de Estratégia e Planeamento
⁴
“Evolução do Desemprego Jovem em Portugal”
3 comentários:
E ninguém comenta o Seixas ? Nem sequer aquele que está sempre à espera que ele malhe na gestão cafofiana ?
Contra factos não há argumentos.
Pode-se discutir o incerto, i.e., situações em que podem existir várias versões e interpretações dos factos. Exemplo. A cor das cuecas de Albuquerque é um tema de discussão. O peso de um diamante não é discutível.
Fala-se sobe o que se conhece e sobre o que pensa que se conhece.
Em face do exposto, não há comentários. Este tema foi exposto na publicação "Boatos"
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