CENÁCULO NAS NUVENS
A reunião da tropa laranja esta quarta-feira à noite confirmou que o partido perdeu a noção da realidade. Propositadamente.
Falam, falam, falam... mas lá dentro não dizem nada. Dia 29 à noite, os candidatos que não deitem culpas a Jardim. |
O líder social-democrata entrou na sala, cumprimentou normalmente a plêiade presente, de comissários políticos e candidatos às câmaras, e repetiu o discurso já mais do que conhecido sobre as autárquicas de 29.
Depois, convidou cada cabeça-de-lista para descrever a situação da pré-campanha no respectivo concelho. Todos se pronunciaram. Nenhum teve uma ideia diferente para propor, uma necessidade, um protesto, uma queixa, uma dificuldade por mais pequena que fosse.
Uma equipa de Alices, salvo seja, 'no país das maravilhas'.
Que tinha Jardim a fazer? Nada. A não ser uma indicação ou outra, para tramar a oposição de cada concelho.
E acabou-se a reunião.
Que diabo foram fazer ali aquelas poucas dezenas de criaturas? Quantos convivas não terão reclamado interiormente o episódio que perderam da telenovela?!
Entra em campo a II Divisão de autarcas
Em termos de política regional, é grave. Porque a falta de qualidade dos protagonistas reflecte-se negativamente no bem-estar das populações. Aquele deserto cultural sai caro a todos.
Por alguma razão, alguns velhos autarcas, agora de saída, costumam dizer de uns para os outros, em privado: a primeira divisão acabou, vamos ver o que os da segunda divisão são capazes de fazer nos próximos 4 anos.
Pode ser um bocado injusto, porque os seguintes - se ganharem as eleições - poderão mostrar as capacidades que tiverem. Mas, pelas amostras que temos visto!...
Entre o dilatado lote de candidatos social-democratas não há uma alma capaz de dizer que 'o rei vai nu'? Até aqui já houve.
Já sabemos o que pensam: o chefe quer assim, então ele que depois assuma as coisas, se o dia 29 der para o torto.
Ele que assuma?
Os senhores candidatos, que pelos vistos acham tudo bem na caminhada eleitoral, não poderão alegar desconhecimento das regras do jogo. Porque Jardim não as esconde. Ele revela em cada passo, em cada palavra, que a sua guerra é outra: a guerra dele é manter seguros quanto baste os pilares que o suportam no poder. O resto vem por acréscimo.
Será que o homem escondeu as críticas a Jaime Ramos, quando inclusivamente lhe atirou em rosto antigos negócios da Meia Serra? Ele não disse, alto e bom som, que nada tem a ver com a estratégia desta campanha, para picar Jaime?
E então?
Não foi à vista de todos que ele atravessou ontem o átrio de um novo hotel para dar um abraço a Jaime Ramos? Ele não anda por aí em adros e convívios, e agora em reuniões com os senhores candidatos, para mostrar quem manda?
Ele não bate em Jaime Ramos e depois chega com ele aos convívios, como há dias em Santa Maria Maior?
As contradições que comete, da manhã para a tarde, não são à vista?
Nem pensem em deixar a bomba atómica nas mãos do chefe quando os resultados começarem a sair na noite de 29.
O importante ficou por dizer
Os senhores candidatos vão esperar pela noite eleitoral para perguntar a quem devem obedecer na estratégia eleitoral? Para perguntarem como explicar aos cidadãos, na campanha, o que quer dizer Jardim quando confirma a sua saída irrevogável em 2014 para logo a seguir dizer: das outras vezes, "os meus recuos foram em consciência"? É que... quem garante que não haverá novo "recuo em consciência"?
Se deixarem para essa altura, será tarde.
Confuso?
Traduzamos: para evitar a má vontade do eleitorado, por que não pedem coerência ao chefe ao menos até às eleições?
Já nos cansámos de dizer que cada movimento de Jardim faz parte da luta pela conservação do seu poder pessoal. Não venham depois com justificações imbecis do género "eu não sabia".
Se o chefe vos convoca para uma reunião. Se ele vos dá a palavra para um retrato da campanha no vosso burgo. Que melhor ocasião para finalmente abrir o jogo e pedir realismo no programar da batalha?
Era esta quarta-feira que deviam confrontar o chefe com situações que normalmente ficam sem referência, e a que ele, de resto, tem assistido.
Um exemplo: nos convívios com 'simpatizantes e militantes', os 'simpatizantes e militantes' não são mais do que os candidatos e os contratados para colaborar na campanha. Pessoas do povo, apoiantes, nem uma.
Cada um ao seu e o resto ao ataque!
Já agora, não acham um desperdício tanta segurança, com equipas especializadas a bater com horas de antecedência o local onde se realizará o convívio - tanta segurança para ninguém, a não ser os candidatos e membros do staff?
Para comer tremoços, amendoins, massa guisada e carne-de-vinho-e-alhos com muita gordura, mais uns vinhos e umas cervejas (a cerveja nalguns sítios é paga), é preciso tanto agente de segurança? Nos tempos áureos da espetada com todos os matadouros não era preciso...
Para quê haver sequer discursos? Ali nos convívios estão aqueles que supostamente votarão laranja. Fartos de ouvir o que o chefe continua dizendo: que Lisboa tem culpa das enxurradas e da tabela das marés, que Lisboa rouba dinheiro à Madeira, que agora o povo não pode atraiçoar e voltar as costas a quem tanto fez pela Região...
Aquilo não dá um voto a mais! São os barões a dizer.
Enfim, ninguém confrontou o chefe, na reunião de quarta, com os espinhos do dia-a-dia. É continuar a cavalgar a nuvem da fantasia. Como na gíria futebolística, 'cada um ao seu e o resto ao ataque'. Ou, como aconselharia o bispo das 4 Fontes, 'pontapé para a frente e fé em Deus!'
Jardim candidato à Câmara do Funchal
Cá fora, sim, já ninguém se esconde na hora de escalpelizar a múmia PPD. Os barões são os primeiros a reconhecer que a presença de Jaime e de Jardim ao lado dos candidatos é altamente nociva para os resultados.
Temos ouvido lamentos lancinantes de alguns deles ao referirem o que o chefe anda a fazer a Bruno Pereira. O chefe moveu ao cabeça-de-lista do seu partido no Funchal uma impiedosa marcação cerrada. Mais apertada do que a feita por Paulo Cafôfo, José Manuel Rodrigues e Artur Andrade.
Pelos actos políticos que a TV mostra, percebemos claramente que Jardim se põe ao centro da cena, desprezando quem devia ser protagonista. No debate quotidiano da campanha, Jardim assume as posições que deviam partir de Bruno.
Pois bem: e que tem isto de novo?
Boa pergunta.
Jardim quer tudo. É presidente do governo e do seu partido. Mas morre por ter de aceitar que haja, sem ser ele, autarcas a mandar na aldeia. Directores a dirigir rádios, televisões e jornais. Presidentes a mandar em clubes e treinadores a fazerem o '11'. Presidentes da Casa da Luz, dos Horários, tudo. O homem queria ser tudo ao mesmo tempo.
Em muitos casos, consegue. E a culpa não é só dele.
Pelos vistos, 11 maiorias absolutas...
Sabemos que pelo menos alguns membros da comissão política, depois de ouvirem os candidatos falarem ontem na reunião, voltaram a casa convictos de que serão 11 maiorias absolutas para o PPD.
Convictos, uma ova! Voltaram a casa foi irritados com os candidatos, que fizeram de palhaços para alegrar o chefe, deixando no ar a mentira de que tudo vai bem no reino da Dinamarca.
Perguntamos nós: e os barões que voltaram a casa irritados que é que dizem nas reuniões normais da Comissão Política? Tentam explicar ao chefe o pântano onde se enterra o partido?
Se a ideia da reunião era manter os candidatos sob controlo, de crista baixa, e mostrar quem é que afinal manda na campanha - Jardim e não Jaime -, o programa funcionou em pleno: Jaime Ramos nem sequer falou e os candidatos falaram sem dizer nada.
2 comentários:
O UI é o único candidato a todas as Câmaras. para o bem e,ou, para o mal. Só ele sabe, só ele é o grande responsável pela escolha e estratégia global, aliás como sempre foi. Ontem, tal como durante todos estes anos, toda a gente disse que sim ao UI. Agora, dia 29, ele estará a arrumar as botas...
Caro Luís Calisto
Isto faz-me lembrar o tempo em que Salazar caiu da cadeira. Já não mandava nada mas os ministros continuavam a ir a despacho.
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