DO PASSADO AO FUTURO
Nos anos 30, imperava a indisciplina cívica em Portugal. No fim da década surgiu a 2ª Guerra. Às dificuldades internas juntou-se o caos Mundial.
Na Madeira, de 1931 a 1936, interesses
locais geraram intrigas junto do Dr. Salazar, que levaram à falência da Casa
Bancária Henrique Figueira. A memória colectiva regista o cortejo de desgraças
que lhe está associado, perda de depósitos, falências e insolvências. Tentava o
Governo reorganizar o importante sector dos lacticínios, concentrando pequenas
fábricas e novamente interesses locais geraram uma situação de alta
conflitualidade que degenerou na revolta do leite. A PVDE – antecessora da PIDE
– prendeu muitos, alguns deportou e expulsou da Madeira o Pe. César Teixeira da
Fonte que ousara defender os produtores de leite da zona do Faial e Santana.
Sossego só houve em 1945. Dez anos depois as feridas sociais começaram a ser
tratadas numa perspectiva global dos interesses da Madeira e do País.
O Cap. de Mar e Guerra, Inocêncio Camacho
de Freitas (mais tarde Governador), a 21/12/1949 enviou ao Dr. Salazar uma
carta, da qual transcrevo este excerto*:
“…o assunto do Porto Funchal transcende os
limites dum problema portuário segundo a concepção[…]de uma solução ajustada às
necessidades do porto. Cometeu-se um erro grave[…]continuando os navios de
grande porte a fundearem ao largo. Os navios da Union Castle[…]têm mais de 200
mts de comprimento e 13 de calado. A área de manobra entre a batimétrica dos 13
mts e o molhe da Pontinha[….]terá cerca de 300 mts de largura, pelo que nenhum
dos grandes navios a demandará debaixo de temporal, com mar grosso à popa ou
pelo travez . Recordo[….]ouvir V. Exª, referir-se à trindade dos problemas
capitais da Madeira – a irrigação[…]a emigração de grande complexidade pelas
dificuldades nacionais e alheias[…]e o turismo de grandes possibilidades locais
– e manifestar os desejos de intervir por forma que fossem criadas fontes de
riqueza na Madeira para melhoria das condições de vida da sua pobre gente. Mas
na base de tão complexo problema está o porto do Funchal.[…]o verdadeiro
interesse da Madeira e do Estado, indirectamente, está na construção de um
porto que permita a atracação fácil e segura dos grandes navios[…]não
seria de aconselhar uma solução para o Porto do Funchal que resolvesse
inteiramente o problema…?”
Qualquer Português – Madeirense
mais ainda - de bom senso, aplaude a afirmação de Salazar relativa aos 3
pilares. Arrancaram as obras no domínio da irrigação e do porto. O terceiro pilar
– a emigração – é irresolúvel. O 25 de Abril abriu portas a que a gestão dos
interesses regionais passasse para a RAM.
Cavalgando a memória colectiva que atribuía a Salazar
as sequelas da Administração Pública, uma retórica contra os “cubanos colonizadores”
criou a mística que encobriu a instalação de interesses que se sobrepuseram ao
Bem Comum.No pós-Abril a riqueza exibida e assente em dinheiro fácil era
insustentável. Os interesses locais alimentados nisso, devolveram-nos aos anos
30. Hoje, Henrique Figueira é BANIF. Viviam as populações em más habitações,
agora dormem pela rua. Desemprego e fome pede meças a esse tempo. O porto,
também ele afogado em dinheiro, ficou inseguro. Resta o Turismo que, vivendo da
paisagem, promove-se em postais dos anos 50/60. As populações foram esquecidas
– vejam Porto Santo – nas suas actividades tradicionais. A Madeira segue-lhe o
exemplo. A “riqueza”que se procurava para os madeirenses está entregue aos
“mercados”.Tivemos inimputabilidade? Salazar usava a polícia contra os
“comunas”, mas, por outro lado, procurava retirar-lhes o terreno fértil para a
contestação, arranjando trabalho e criando riqueza. Aqui fez-se o contrário
daquilo que era ter juízo, mas do bom! Conhecidas as causas, não combate-las, é
caminhar para o desastre inevitável. Não assumir os resultados será o quê?
Gaudêncio Figueira
5 comentários:
Excelentes analogias! Ontem, tal como hoje, o Porto do Funchal...
Quem ignora os erros do passado, está condenado a repeti-los no futuro.
Meus Caros Luís Calisto, Luís Oliveira e Fernando Vouga
Agrada-me sentir que três pessoas, com nome e BI, reconhecem mérito naquilo que escrevi. Durante anos poucos se atreveram a apoiar-me
Caro Dr. J. Figueira
É que há por aí muita gente que teme o regresso do papão. Talvez numa manhã de nevoeiro...
Esse, o do nevoeiro, foi o D. Sebastião, combateu, e foi à guerra em África, não se pôs a milhas.
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