EUSÉBIO E A CULTURA
SEGUNDO A 'VACA SAGRADA'
Concordo com o chefe das Angústias: dar ou não dar a Eusébio honras de Panteão Nacional apresenta-se questão que requer muitos cuidados. Para evitar a banalização de tal mercê.
Ora, se a sepultura no Panteão está reservada por lei aos portugueses que se distinguiram por serviços ao País em cargos públicos e militares, expansão da cultura lusa, criação literária, científica e artística ou ainda na defesa da civilização, da pessoa humana e da liberdade, honestamente não vemos espaço para Eusébio na Igreja de Santa Engrácia. A menos que se considere agora o futebol como uma arte - ao lado da pintura, da escultura ou da literatura -, o que também não nos parece pacífico, por enquanto.
Há quem veja em Eusébio um caso de heroísmo, confundindo o conceito de herói com o de ídolo. Mas, se repararmos bem, o maior feito de Eusébio na Selecção Nacional, apesar das suas grandes repercussões, está associado a um 3.º lugar no campeonato do mundo. Portugal nunca foi campeão em futebol, o que, seja agradável ou desagradável, prejudica os componentes das sucessivas selecções.
Com Figo foi assim, com Ronaldo tem-no sido.
Eusébio foi um ídolo de Portugal e levou o nome nacional a todo o mundo. É verdade. Mas os critérios, tal como foram estabelecidos, não contemplam Eusébios, Livramentos, Joaquim Agostinhos.
Isto independentemente dos debates caso a caso. Não percebo, por exemplo, que fazem no Panteão Nacional, ao lado de Aquilino, Garrett, Humberto Delgado e Manuel Arriaga, figuras politicamente indigestas como Sidónio Pais e Óscar Carmona. Mais depressa o médico do Nobel Egas Moniz (apesar de sidonista). Muito mais depressa ainda outro Nobel, Saramago.
Enfim.
Mas há outros aspectos da questão.
Por exemplo, a forma como outro ícone da vida lusitana se referiu ao 'Pantera Negra', enquanto o caixão baixava à terra. Mário Soares, interrogado sobre a figura que desaparecia desta vida - a despropósito, porque só foi à bola para entregar a Taça de Portugal quando Presidente da República -, falou de Eusébio como um rapaz modesto e simpático, sem cultura e que começava a beber logo de manhã.
Ou seja, o antigo chefe de Estado, que actua hoje ao estilo de 'vaca sagrada', trata Eusébio como um pobre diabo.
Vamos ver.
Quanto a Eusébio agir com modéstia e simpatia, nem sequer estamos assim tão de acordo. Modéstia, modéstia... longe disso. Simpatia, só quando entre amigos.
Sobre copos e incultura, talvez este certo o Dr. Soares. Mas aqui é que temos de reflectir um pouco.
Tomar uns uísques - bem, ninguém é santo.
Incultura...
O género cultural de Soares
A cultura de Mário Soares deu-lhe para aproveitar a primeira reunião do conselho de ministros a que presidia, no I governo constitucional, para obrigar os caloiros do Ministério, apanhados de surpresa, a concordar com a atribuição de um subsídio de 200 mil contos à Maçonaria... para compensar as perseguições em 48 anos de ditadura. Afiançam-nos que Firmino Miguel, ministro da Defesa desse governo (1976-78) esteve na iminência de se demitir logo depois dessa primeira reunião, acabando por reconsiderar a fim de evitar um abalo nacional em altura tão delicada.
A cultura de Soares - com todo o respeito que o grande democrata nos merece - levou-o a mandar malcriadamente, diante das câmaras de TV, "desaparecer" os agentes da PSP que faziam a segurança à camioneta onde o então PR viajava.
Essa cultura, obviamente contrastante com a incultura de Eusébio, permitiu ao grande Soares, quando recandidato a Belém, enxovalhar os jornalistas madeirenses em plena sala vip de Santa Catarina acusando-os de estarem a fazer perguntas encomendadas pelo chefe do governo regional.
Mário Soares puxou também da sua cultura para chamar 'dona de casa', em sentido aviltante, à francesa Nicole Fontaine, que com ele disputava eleitoralmente a presidência do Parlamento Europeu (ele perderia com a 'dona de casa').
Começamos a crer que, na óptica de Soares, fazer cultura é cumprimentar funcionários quando se precisa deles e não corresponder ao cumprimento quando eles não são precisos, como o mesmo Soares fazia nos corredores de Belém - o que nos foi contado particularmente por uma funcionária do palácio presidencial, um dia, na Madeira.
Por um amigo comum, soubemos também quanto os próprios jardineiros de Belém detestavam Soares nesses tempos de presidência, em contraste com o que se passaria depois, nos mandatos de Jorge Sampaio.
E terá sido também por toda essa grande cultura que Soares, que confundiu, na TV, 3 mil com 3 milhões de contos, foi advertido por amigos seus, várias vezes, para não se candidatar a primeiro-ministro, por falta de características para o cargo.
Em suma, concordamos com as reservas a respeitar na decisão sobre a história do Panteão Nacional, como sugeriu o chefe das Angústias (em momento de rara lucidez humanitária). Já 'bater em mortos', como faz Soares, é muito feio... e revelador de incultura.
2 comentários:
Caro Luís Calisto.
Soares e Jardim perderam uma excelente oportunidade de estarem calados. Se calhar estão com medo de não terem vaga no Panteão.
Caro Coronel
Às tantas...
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