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segunda-feira, 9 de junho de 2014


INSISTO, É URGENTE UM DEBATE SÉRIO SOBRE O TURISMO DE NATUREZA NA MADEIRA

Cascata na ribeira de João Gomes, junto à origem da levada do Bom Sucesso (25.10.2003)

Sábado passado, após a morte de mais duas pessoas, apelei a um urgente e sério debate sobre o Turismo de Natureza na Madeira.
Conhecendo bem a maioria dos intervenientes, quer do sector público, quer das empresas e associações que promovem percursos pedonais, não me surpreendeu o fluxo e o teor das declarações feitas enquanto os caixões eram removidos e antes das autópsias. Mais dois ou três dias e o assunto deverá ser enterrado.
Tudo continuará na mesma, até que aconteça mais um acidente. Até que se percam mais vidas humanas nas veredas e levadas da Madeira.
Continuarão a percorrer trilhos perigosos grupos de sessenta, setenta e até mais caminhantes. Continuarão a circular em zonas de baixas temperaturas, nevoeiros, chuva e ventos fortes, turistas sem roupa adequada e com sandálias. Continuarão a andar em veredas com subidas e descidas extremamente cansativas, pessoas idosas e/ou obesas. Continuarão a cruzar-se perigosamente, em levadas e veredas, bicicletas todo o terreno (e motas) e caminheiros. Continuarão  veículos motorizados a transportar praticantes de “canyoning” até o mais próximo possível das cascatas. Continuará a falta de informação e a confusão entre percursos recomendados e não recomendados.
Afirmar que o trilho onde, no último sábado,  apareceram mortos os dois turistas é um “percurso sinalizado mas não recomendado” é uma meia verdade, que em nada contribui para evitar novos acidentes.
É necessário assumir responsabilidades, é imperioso falar a verdade, porque é mais fácil apanhar um mentiroso, do que um coxo.
O percurso em questão foi aberto em 1999, pela Câmara Municipal do Funchal (era eu o vereador responsável pelo ambiente), após cerca de um ano de trabalhos de recuperação da velha vereda entre a freguesia do Monte e a origem da levada do Bom Sucesso, e todo o percurso ao longo do aqueduto até à capela de Nossa Senhora do Bom Sucesso. Paralelamente aos trabalhos no terreno, foi elaborado um opúsculo (30 páginas) com a descrição da vereda e da levada, e informações sobre a paisagem, a flora e a fauna do “Corredor Verde da Ribeira de João Gomes”.
O “Corredor” constituía o último segmento dum percurso com início no Poço da Neve (pico do Areeiro), passagem pela levada do Barreiro, estação de tratamento de água dos Tornos, levada dos Tornos e túnel do Pisão. Este primeiro segmento foi batizado de “Epopeia da Água”, curiosamente uma das bandeiras de duas candidaturas às eleições autárquicas de setembro passado.
O Decreto Legislativo Regional nº 7-B/2000/M, de 01 de março de 2000, que estabeleceu pela primeira vez os percursos pedonais recomendados na Região Autónoma da Madeira, engloba o percurso entre oPoço da Neve e a levada do Bom Sucesso.
Um ano após a sua abertura o percurso onde apareceram mortos os dos turistas alemães, foi classificado como percurso recomendado (PR14) e foi colocada a adequada sinalética. Mais. Até eu ter deixado a Câmara do Funchal, em Janeiro de 2002,  todo o percurso era vistoriado mensalmente e eram tomadas as devidas medidas com o objetivo de reduzir os riscos de acidente.
Em 2010, um despacho conjunto da secretária regional do turismo e do secretário regional do ambiente, publicado no JORAM – 2ª série de 20.08.10, reduziu a lista de percursos recomendados na Ilha da Madeira de 52 para 25. Ou seja, os trilhos degradaram-se, logo não se recuperam, desclassificam-se.
Do percurso PR14 desapareceram, por despacho, os troços Monte – levada do Bom Sucesso  e casa do Barreiro – levada dos Tornos. No primeiro continuaram a passear turistas alheios à produção legislativa regional. O segundo, aguardou pela redescoberta na campanha eleitoral de setembro de 2013.
Dos atuais 25 percursos pedestres recomendados na ilha da Madeira, 12 são apenas em veredas e velhos caminhos reais, 4 são parcialmente em veredas e levadas e 9 são exclusivamente em levadas. Todos estes percursos pertencem à categoria designada internacionalmente por Percursos de Pequena Rota. É manifestamente pouco para o elevado potencial  deste nicho de turismo.
Neste momento o percurso pico do Areeiro – pico Ruivo (recomendado) é mais seguro que o percurso parque municipal do Monte – Curral dos Romeiros – Choupana (não recomendado)?
O percurso Rabaçal – 25 Fontes (recomendado) é seguro, especialmente ao sábado de manhã, quando as agências arrebanham centenas de turistas à mesma hora? Será desclassificado ou serão colocados semáforos para evitar os frequentes embates de grupos?
Poderia continuar a desenrolar o espesso novelo das dúvidas sobre a gestão e utilização das levadas e veredas da Madeira.
Por agora, quedo-me por aqui e insisto.
É URGENTE UM DEBATE SÉRIO SOBRE O TURISMO DE NATUREZA NA MADEIRA

Funchal, 09.06.2014

Raimundo Quintal

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