VOTO DE BRAÇO NO AR
EMBARAÇA MIGUEL ALBUQERQUE
O pretendente à liderança do PSD-M terá de corresponder à expectativa que criou para a conferência de imprensa de amanhã. Mas está um pouco de mãos atadas.
O edil cessante da Câmara do Funchal criou altas expectativas com a conferência de imprensa que marcou para esta sexta-feira, na qualidade de pretendente à liderança do PSD-Madeira. Não poderá limitar-se, pois, a lamentar os péssimos resultados que castigaram o seu partido nas autárquicas e a pedir bom senso à Direcção do partido, aliás composta por um único membro, Jardim.
Para 'anunciar' banalidades desse calibre, mais valia o candidato à sucessão laranja redigir um comunicado com meia dúzia de linhas e enviá-lo às redacções.
O que esperam ouvir os social-democratas em especial, mas também os outros madeirenses, é o anúncio de medidas concretas com possível impacto no futuro da Região.
Para isso, Albuquerque terá de explicar claramente o seu plano para deter a derrapagem do seu partido evidenciada nos resultados eleitorais do passado domingo.
Teoricamente, seria simples: exigir a demissão do líder, apontado unanimemente como culpado pelo descalabro eleitoral (menos por quem está na sua presença), e propor um congresso extraordinário com eleições directas nas quais discutiria, com quem se candidatasse, o posto de presidente do PSD.
Mas, na prática, o caminho não se apresenta linear assim. Esta manhã, explicava-nos uma destacada personagem do jardinismo que os estatutos, não sendo taxativos na matéria, dão confortável margem a quem pretender deixar tudo como está.
Como nos referiu esse jardinista de média idade, os congressos extraordinários podem ser convocados a pedido da comissão política ou do conselho regional ou ainda mediante um rol com 300 assinaturas. Mas, neste último caso, compete ao conselho regional a decisão final sobre a marcação ou não do congresso. Caso a ordem de trabalhos do congresso solicitado pressuponha um debate sobre a situação político-partidária, por exemplo, a situação é pacífica. Mas caso a pretensão aponte para um congresso electivo, então o mais certo, tratando-se do caso Albuquerque, é o pedido se ficar por aí. Por uma razão simples: a votação do assunto é feita... de braço no ar.
Estamos todos entendidos nessa matéria? Claro.
Primeira derrota de Albuquerque?
Outro aspecto que o mesmo barão laranja releva: pela primeira vez, há um congresso marcado também em congresso, para 10 de Janeiro de 2015, antecedido de eleições directas em 19 de Dezembro. Miguel Albuquerque esteve no congresso que estabeleceu essas datas - insiste o nosso interlocutor - e não se manifestou, ou seja, não votou contra nem sequer se absteve. Que direito tem de inverter agora a caminhada?
Tudo isto para dizer que, se é um congresso extraordinário que Albuquerque anunciará na conferência de imprensa de amanhã, mediante as 300 assinaturas, apenas o fará para pressionar e deixar a 'bola' no lado de Jardim. Porque o conselho regional, depois de estudar a justeza ou não do pedido, obviamente o rejeitará, com os braços bem no ar. E essa seria, segundo o referido barão, uma primeira derrota do pretendente à liderança.
Custa prever o que terá então Albuquerque para anunciar esta sexta-feira capaz de produzir efeitos práticos.
No fundo, ele vive um dilema particularmente incómodo: diligenciar no sentido de um congresso que não acontecerá; ou ficar quieto, a dar tempo a uma possível recuperação de Jardim, mas sobretudo às oposições que certamente não querem perder o grande salto no trampolim das autárquicas.
Exigir a demissão de Jardim é anúncio pleonástico, redundante, é chover no molhado. A primeira medida que ouvimos ao líder laranja derrotado no passado domingo foi que não se demitiria - disposição de que nunca tivemos a menor dúvida. Perdesse Jardim 10 câmaras e os culpados seriam sempre os outros. A noite passada, o chefe dos Netos convocou a comissão política para legitimar a evolução na continuidade. Para consagrar a ideia de que nada de anormal aconteceu. O líder lavou as mãos da derrota, apontou culpados e mantém o calendário partidário que, em seu entender, lhe permitirá recuperar para continuar depois de 2015.
Como sempre, e mau grado a hecatombe eleitoral desencadeada pelos 'patas rapadas', os comissários políticos ratificaram a 'realidade fictícia' do chefe.
Dizer apenas o que o chefe quer ouvir
Todos eles, à excepção de 3, usaram do seu direito à palavra. Para dizerem o que se adivinhava. Ou seja, para dizerem o contrário daquilo que dizem cá fora, esbaforidos.
Pois. Eles aplicam todos os 'preservativos' quando falam com o chefe, porque não sabem o que é que o chefe quer ouvir no dia e na hora em que vão falar. Muitos se 'queimaram' já por dizerem branco numa hora em que o chefe pensava preto.
Mas há um manual de pensamentos sagrados, que são 'música para os ouvidos' de quem manda.
Foi fácil, desta vez, porque Jardim já dera as orientações discursivas na noite da derrota. Assim, foi ouvirem-se ali na comissão política as desculpas esfarrapadas da crise nacional e internacional, da impopularidade que vem do PSD e do governo de Passos Coelho. Esses factores, sim - discursaram com veemência os comissários - é que são os culpados de o PSD-Madeira ter perdido a simpatia da juventude, dos idosos, dos funcionários públicos, dos enfermeiros, dos porto-santenses.
Mas também há uma pulga atrás da orelha... os poucos meios de campanha eleitoral que, pela primeira vez, o PSD-M usou em comparação com os rivais. Tantas bandeiras que os outros tinham e...
Foi a única ocasião em que o secretário-geral Jaime Ramos, a sentir a bicada, teve necessidade de falar na reunião. Disse quanto tinha para gastar na campanha, quanto gastou e sacudiu responsabilidades.
A comissão política fez ainda a tradicional análise pelos concelhos, a retrospectiva ideal para endereçar culpas aos candidatos a juntas derrotados. Sim, porque importante era reforçar a ideia de que o líder nada tinha a ver com os resultados. Os comissários falaram sem sequer aludir a essa possibilidade, mas um deles - que ainda sonha que o 'pai natal' do Quebra Costas lhe há-de deparar no sapatinho um bilhete para as Angústias - fez questão de vincar com toda a veemência: o líder não está em causa nem estará.
Ninguém está para ganhar um inimigo em Jardim, depois de tantos anos. Pronto. Entende-se.
Na moral da história, e depois da maratona, Jardim diria aos jornalistas que a comissão política deliberou rejeitar ideias de congressos extras e negar a partir de agora mais palco a Miguel Albuquerque.
Ele pensou e disse que a comissão política deliberou.
Que há de novo nesse procedimento? Nada.
Conferência de imprensa para inglês ver?
Depois deste parêntesis para referir a catarse da noite passada na Rua dos Netos, voltamos à ideia inicial: como é que Miguel Albuquerque arrancará o chefe da cadeira dos Netos para poder meter-se imediatamente no caminho de uma oposição em franco crescimento?
Aguardemos até amanhã. Conferências de imprensa para marcar presença, para cumprir calendário, não.
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