Parceiros e parcerias
Rui Nogueira
Fino
O enredo eleitoral do próximo ano parece estar já
praticamente definido. Vai prosseguir, e por motivos cada vez mais pesados, a
nunca terminada discussão sobre a Autonomia, que o optimismo de alguns e a
ingenuidade de outros pretendeu a certa altura adocicar, como se fosse possível
gerar consensos com o Terreiro do Paço sem um quadro de confrontação latente ou
mesmo confronto prévio. Mas sobre a mesa da disputa eleitoral vamos ter com
certeza outro tema igualmente estruturante da vida regional: aquele que diz
respeito ao futuro e integridade da nossa democracia representativa.
É claro que se há-de falar da Saúde e dos Transportes, do
dinheiro que nos falta e dos impostos que nos vergam, da maior ou menor
sustentabilidade da nossa economia, da companhia aérea de bandeira que nos
explora e deixa em terra, quem sabe se do Monte ou da dispendiosa paranoia panfletária
de um candidato imposto por Lisboa, da capital de contrastes cada vez mais pronunciados
onde o comercio tradicional fenece, as esplanadas florescem em cada centímetro quadrado
de passeio, as zonas degradadas degradam-se na desgraçada melancolia do desleixo
camarário, e o betão volta a crescer graças ao solícito, generoso e certamente
desinteressado beneplácito municipal de mandantes, mandaretes e personagens
afins.
Mas a democracia representativa, meus senhores, essa
admirável construção política através da qual o povo soberano exerce o poder
por intermédio de representantes devidamente mandatados, é isso que afinal vai
estar verdadeiramente em jogo. Porque nunca como agora o poder político
regional suscitou o apetite de tantas alianças, parcerias e coligações, que
começam em negociatas locais, passam pela chancela decisora do eixo Rato - S.
Bento, e vêm desaguar na praça funchalense do Município, que bem poderia por
esta altura chamar-se do comércio. Mas sobretudo porque há forças que, actuando
nas margens da democracia formal, operam claramente no sentido de substituir o
primado da política pelo primado dos negócios.
Afirmação abstrusa, dirão prontamente os entusiastas das
virtualidades formais da democracia representativa e das respectivas válvulas legais
de segurança. E lá discorrerão sobre as eleições que ano após ano decorrem sem
mácula ou reparo que se conheça. E lá fulminarão, do alto das suas evidentes
certezas, o meu desavisado dislate com o argumento irrefutável e esmagador de que
as instituições que politicamente nos representam funcionam regularmente. E arrematarão
com o argumento inquestionável de que as democracias a sério acabam sempre por
dotar-se de mecanismos formais e informais de escrutínio e controlo.
Nada mais certo, não me custa reconhecê-lo, embora recuse dar
a mão à palmatória do pantanoso formalismo reinante. Porque, de facto, não só
as eleições têm sido limpas, para tranquilidade geral, como as instituições que
delas resultam lá vão funcionando como a lei e os costumes determinam. A maçada
é que em todas as sociedades, e na nossa em particular, a democracia
representativa é confrontada muitas vezes com ameaças capazes de a minar, com
desafios susceptíveis de a perverter.
Ora, deixem-me que vos diga que, em matéria de ameaças à
democracia representativa, nunca vi antes nada assim: um candidato sem partido vai
concorrer a uma eleição de partidos apoiado em jornais e outras centrais de
negócios, e por alguma razão amparado por um poder central que, pelos vistos, a
propósito da Madeira, só intervém onde e quando não deve. É comparar o que não
faz para acabar com o escândalo diário do transporte aéreo, que noutro país
seria assunto de repercussão nacional, com o afã com que se intromete na
política da Região. E é ver o que por aí vai em matéria de alianças.
De facto, no caso particular da Madeira, essas ameaças já nem
se dão à maçada do pudor. Andam às claras, usam voz grossa e cores berrantes, e
não têm sequer a decência de, ao menos, fingirem que se escondem por detrás da
cortina que protege as verdades inconvenientes. Falo, como é evidente, das engenharias
partidocráticas comandadas por despacho a partir da capital do império, a
pedido, já se vê, de três ou quatro notáveis de cá. Refiro-me à captura do
maior partido da oposição por interesses que, não sendo imediatamente políticos,
nem se dignam ir a votos. Aponto os alinhamentos político-empresariais que por
aí se organizam com óbvias e ilegítimas tentações de poder, e, claro, bem longe
do sobressalto ou do escrutínio dos que há anos vêm fazendo vida misturando
proclamações, cinismo e negócios. E sim, falo igualmente dessas curiosas
relações político-mediáticas, ou mediático-políticas, que o divertido sentido
de humor de alguns jocosamente apelida de parcerias.
Parceria. É esta, de facto, a entidade política mais
interessante e actuante do momento entre nós. Porque, como se sabe, as
parcerias fazem e fazem-se de parceiros. Seja para excursões a capitais
estrangeiras ou para festarolas de trazer por casa. Seja para páginas de
exaltação de feitos notáveis que ninguém vê, na esteira das fake news que animam o debate noutras
paragens e que por cá não se escrutinam. Seja para o mal explicado desfile
mediático dos artífices dessa espécie de poder underground que pacientemente se forja no conforto atapetado de
alguns gabinetes empresariais. Seja para arregimentar cada vez mais parceiros. Seja
finalmente para fortalecer a parceria, ou não fosse ela o princípio e o fim de
todas as coisas.
Parceiros, portanto. É isso que teremos no poder desta terra
se esta espécie de anestesia mediática vier a surtir o perverso efeito desejado.
Parceiros na política, nos negócios, e, já que as mãos se lavam uma à outra, no
negócio da política. E a encimar tão laboriosa pirâmide luzirá uma parceria,
como eles lhe chamam, que não vai a votos, que despreza tanto eleitores como
eleitos, que não reconhece a cidadania alheia, e que tem da democracia
representativa a ideia de que melhor fachada não pode haver para um poder cuja
pretensão é legitimar-se a si próprio sem maçadas eleitorais, ou então
manipulando o voto popular pela força da palavra não contraditada.
Pode ser exagero. Mas confesso que nunca vi nada assim. Um
jornal patrocina um político que, por sua vez, patrocina um jornal, cujo
agrega, por sinal, alguns dos empresários mais relevantes da terra, todos, é
claro, devidamente aparceirados nessa espécie de irmandade político-empresarial
que a si própria se chama parceria, e sonha de olhos bem abertos com a
conquista suprema de um dia subordinar o poder político aos ditames do poder
económico. A questão é saber se este deixa.
4 comentários:
Estamos quase todos anestesiados, mas o FAKE CAFOFO nao dorme. A estrategia é clara, VAMOS FAZER DE CONTA PARA AS VERDADES E DENUNCIAS E MOSTRAR QUE ESTÁ TUDO BEM, SORRINDO MUITO. O DIARIO DE NOTICIAS PUBLICARÁ O QUE ESCREVEMOS COMO SE FOSSE O JORNALISTA A ESCREVER E ESCOLHERÁ AS MELHORES FOTOS,
Depois aparecer o maximo, seja com apresentaçoes de bebidas, de festas, de jogos, qualquer coisa que dê uma foto, na sala de reunioes da Camara.
A proposito aonde vai Fake Cafofo este fim de semana e mais uns dias? E o vice?
Esta Câmara paga tudo.
As eleições municipais surgiram como um campo aberto de possibilidades para reflexão sobre a dinâmica política local. O acontecimento eleitoral utilizou o apoio dos jornais como condição para manutenção ou conquista de bons índices de popularidade, constituindo-se em anunciantes, patrocinadores fundamentais para a sobrevivência dos interesses das empresas "jornalísticas". A situação continua. Vivemos na era da chamada prostituição mediática. E o povo? Está anestesiado.
Este senhor não se fartou de passear com o seu cunhado mamado?
Vota PS e Banif a ver se ainda agarras o comboio...
Para engraxador já há muitos que sobem e descem a avenida do infante para fazerem a vénia ao penteadinho blue
Os jornais de agora estáo submetidos ao poder economico como antes o JM estava sob as ordens do Quebra costas com a conivencia dos seus administradores e diretores.
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