Há louvores e há louvores. Juntamo-nos empenhadamente à homenagem prestada pelas câmaras de Santa Cruz e do Funchal a Paulo Martins e a João Pestana
Há louvores porque sim. Por capricho de quem louva, muitas vezes com a ideia da permuta, ou seja, não te esqueças de depois me louvares também a mim.
Os madeirenses habituaram-se a esse tipo de homenagem artificial, como que por decreto.
Ora, um louvor não tem de ser atribuído a quem não faz mais do que cumprir a sua obrigação. Um louvor honesto e credível é aquele que se aplica na pessoa de quem foi além do exigível, de quem desinteressadamente, e em benefício do colectivo, deu esforço, sacrifício e saber a que não era obrigado.
Uma Cruz de Guerra não vai para o peito do soldado que se limitou a mostrar botas engraxadas, cabelo cortado, atavio, coordenação na ordem unida, pontaria com a canhota e jeito para a queda na máscara ao primeiro sinal de emboscada inimiga.
Como se sabe, o critério nesta terreola para atribuição do louvor oficial é por exemplo a passagem à reforma dos figurões que pulularam à volta dos orçamentos públicos, seja em que posto da administração for.
E não nos esqueçamos de que o simples facto de um sujeito ter sido secretário regional ou algo que o valha é garantia de nome de rua ou de nome num estabelecimento público - acreditamos piamente que com a discordância dos próprios homenageados. Apostamos que eles jamais se abalançariam a uma diligência de tal jaez, mesmo admitindo que, entre os felizes contemplados, houvesse alguns que mereciam realmente ser louvados.
Só que a vulgarização retirou qualquer sentido e significado aos louvores do sr. governo das Angústias.
JOÃO PESTANA fez carreira nos quadros efectivos da Câmara Municipal do Funchal. Ontem, Dia da Cidade, a edilidade que ele serviu rendeu-lhe homenagem. Pelo trabalho que desenvolveu durante décadas. Mas também pela projecção que deu à entidade autárquica numa carreira paralela que os seus tempos livres permitiram - a de fotógrafo artístico.
João Pestana continua a ser uma referência da cidade no mundo da fotografia. As centenas de exposições e os livros de fotografias publicados constituem um inigualável património da nossa capital. Todos nós aprendemos a observar o Funchal através da câmara perspicaz de João Pestana.
João Pestana passa pelas ruas da sua e nossa cidade naquele estilo inconfundível avivado pelo cachecol vermelho e a cidade sussurra, orgulhosa: ali vai um funchalense notável.
A Câmara Municipal também merece um louvor por esta homenagem em vida do homenageado, sem deixar passar que a iniciativa partiu do CDS-PP.
PAULO MARTINS nasceu político, político democrata de esquerda. Mandou às urtigas um curso de Medicina porque o bichinho da política se tornou indominável a caminho do 25 de Abril de 74 e já em pleno PREC à madeirense, fase conturbadíssima da História da Madeira mas que se calhar se vai transformando em saudade para quem a viveu.
Paulo Martinho Martins andou nas batalhas do Comércio do Funchal e da UPM, o grande movimento à esquerda que combateu com mais virulência o PPD então em gestação e os separatistas da Flama. Na liderança da FEC (m-l) e da UDP, antecessoras do Bloco de Esquerda, Paulo Martins enfrentou os perigos próprios da época de que alguns dos mais perigosos consistiram em bombas de elevada potência estoiradas na Rua do Castanheiro. Mas a sua luta não sofreu abalo nenhum em nenhum momento.
Um dos mais distintos deputados na história do parlamentarismo regional, Paulo Martins foi assediado em diversas ocasiões pelo canto da sereia que levou alguns outros à vida tranquila, confortável e farta das maiorias. Mas não renegou as causas que sempre orientaram a sua forma de fazer a política. Paulo sempre foi um líder e não um segundo ou terceiro mordomo. Norteou a sua actividade pelos ditames da democracia na arena e não pelo pragmatismo que arrastou tantos para os camarotes de veludo.
Nesta fase em que a vida mais uma vez revela quão injusta costuma ser para os Homens de verticalidade inflexível, não podemos deixar de registar a homenagem que partiu, curiosamente, de uma Câmara que não a da capital. Quando a homenagem até deveria partir da própria Assembleia Legislativa da Madeira.
Apoiamos vivamente a decisão municipal de Santa Cruz e do presidente da Câmara Filipe Sousa de atribuir um louvor ao líder e combatente partidário que os madeirenses aprenderam a respeitar com o passar dos anos, independentemente de cores políticas.
Apoiamos vivamente a decisão municipal de Santa Cruz e do presidente da Câmara Filipe Sousa de atribuir um louvor ao líder e combatente partidário que os madeirenses aprenderam a respeitar com o passar dos anos, independentemente de cores políticas.
3 comentários:
Concordo com tudo o que escreve, excepto num pormenor, que até nem tem nada a ver com as duas personalidades mencionadas. Então Santa Cruz é uma câmara rural?
A observação é tão pertinente que já mudei o texto, tornando-o mais linear e objectivo relativamente à mensagem que se pretendia passar. Está lá mais directa, agora.
Ao falar de uma Câmara rural não me esqueci de que Santa Cruz é cidade nem me passaria pela cabeça desconsiderar a entidade em causa, que até é a minha Câmara, dada a minha condição de gaulês.
Em todo o caso, obrigado pela oportuna chamada de atenção.
LCalisto
O Sr.Paulo Martins é comendador desde 2001.A autarquia de Santa Cruz antes de mandar "bitaites" deveria investigar o perfil de quem homenageia...A República Portuguesa, pela mão de Jorge Sampaio, já louvou o Sr.Paulo Martins.
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