Powered By Blogger

quarta-feira, 20 de janeiro de 2021


CRÓNICA



JUVENAL XAVIER                                                                                                               

     O FADO DO FUTEBOL

 

O futebol nunca se conforma. De pé descalço, gaiato, revolta-se. Arma um pé de vento, uma borrasca. Compra uma briga e remata o mundo para os cornos da sorte. Transforma-se e forma-se noutras formas. É um vulcão que faz abanar a multidão. Enche primeiras páginas com fotografias de corpo inteiro e títulos gordos, vermelhos.

Um olhar sobre o futebol em tempo algum será, ou dificilmente será, um olhar desapaixonado, descomprometido, desligado. Mesmo pouco atento, ou aparentemente desinteressado, esse olhar longínquo sobre o desporto-Rei existe fora da aparência enganosa e do insensível, raramente será um ato anónimo de distanciamento ou frieza.

E mesmo que não exista sequer, que nem se sinta qualquer ponto em comum, qualquer traço de familiaridade, a realidade emergente do futebol da era pós-industrial não passa isolada ou despercebida, nem é puramente indiferente.

Há no imaginário uma ligação infantil, pueril, entre uma bola branca, que salta, e um desejo da cor do céu sem nuvens que nos foge. Uma extrema ligação oculta, sobrenatural, que a memória ora esquece ora reaviva à flor de um gesto aparentemente inconsciente.

A bola (transnacional, autobiográfica, com losangos de massa cinzenta) fica, eternamente, prisioneira nas margens lodosas das malhas estreitas do futebol. Essa bola que há muito conquistou, com ressaltos, o poder de driblar à vontade mercados de interesses subterrâneos, onde se somam somas astronómicas. Somas fascinantes como uma bola vadia a desenhar cifrões que alindam esse desfile de milhões. E o poder que dá esse novo poder gera apetites violentos e seduz como o cheiro selvagem das framboesas vermelhas.

Partir em busca dos caminhos entrelaçados, que há muito pertencem ao fado do futebol, é fazer-se à estrada de sonhos e candongas que leva a mil e um cantos do mundo, a mil e muitos aplausos e apupos, que se interpretam à sua maneira e comunicam nessa linguagem simples de códigos comuns, mas infinitamente complexa, pois expressa-se ao nível do intraduzível sotaque popular de uma bola universal.

1 comentário:

Anónimo disse...

Gostei
Este jovem, pela aparência já foi vacinado contra a nova estirpe
Deixou já alguns anos de fazer relatos de futebol
Passou a escrever
Parabéns