Gil Canha

Nos países do Norte da Europa, sempre que um governante se mete em alhadas ou alguma coisa corre mal nos organismos que tutela, a sociedade civil e a comunicação social são de tal maneira implacáveis, que os governantes são obrigados a se demitirem dos seus cargos. Aliás esta intransigência política de tradição luterana e anglo-saxónica chega a situações algo caricatas, como por exemplo, o que aconteceu com o deputado sueco Tomas Tobé que foi obrigado a resignar ao seu cargo de deputado e líder partidário, porque, imaginem, usou em benefício próprio as milhas acumuladas no seu cartão, que o Estado fornece aos parlamentares para uso gratuito nos transportes públicos. E sabem porquê? Porque usou esses pontos para comprar um pacote de amendoins e uma refeição acompanhada com uma garrafa de vinho.

No Reino Unido, os Ministros pedem a demissão por coisas, que na óptica latina, são completamente triviais e corriqueiras. Por exemplo, o famoso Ministro invisual, David Blunkett, (cego de nascença) foi obrigado a demitir-se de Ministro da Administração Interna do Governo de Tony Blair (Dez 2004) porque foi acusado de ter facilitado a obtenção de um visto para a empregada filipina da sua amante. E quem não se lembra do caso do Ministro da Sociedade Civil, Brooks Newmark que se demitiu depois de ser apanhado a enviar fotos eróticas explícitas a uma jornalista que se fez passar por uma jovem activista. E mais modesto ainda, foi o caso do Ministro Britânico da Energia, Chris Huhne, que se demitiu do governo de David Cameron, em Fevereiro de 2012, acusado de perjúrio e obstrução à justiça, por ter declarado à Polícia que era a mulher e não ele, que ia a conduzir o carro em excesso de velocidade. Mais tarde, ele e a esposa foram condenados a oito meses de prisão pela brincadeirinha.

Mais recentemente, em França, o Ministro do Interior de Holland, Bruno Le Roux resignou o cargo, depois da comunicação social ter revelado que na altura que fora deputado, contratara as filhas, de 15 e 16 anos, para suas assessoras parlamentares durante as férias escolares.

Isto tudo, para se dizer que em Portugal, os ministros raramente se demitem mesmo que tenham responsabilidades políticas em coisas muito mais graves, como por exemplo, a tragédia dos incêndios florestais em Pedrógão Grande e o roubo de Tancos, em que só a “arraia-miúda” é que foi posta a andar. Deste modo, o governo da geringonça de António Costa e seus ministros agarram-se aos cargos como lapas vieiras no ilhéu do Lido.

Mas, o mais preocupante ainda é a passividade da nossa sociedade civil que aceita estas desgraças como uma “banalização do mal” na visão realista de Hannah Arendt, ou como um vale de lágrimas a que todo o cristão pecador tem de percorrer resignadamente. Nem os gregos, que nestas coisas costumam ficar atrás de nós, aceitam esta desculpabilização congénita de responsabilidades. Nos trágicos incêndios da Grécia de 2007, em que morreram 64 pessoas, os gregos manifestaram-se ruidosamente nas ruas e puseram em causa o governo conservador do Primeiro-ministro Kostas Karamanlis, e ironia das ironias, os que pediam as cabeças dos ministros com mais veemência e agressividade, eram nem mais nem menos que os socialistas do PasoK, de Giorgios Papandreu. (Na queda da palmeira no Porto Santo, também houve umas vestais que vociferaram todo o tipo de morras ainda estavam os corpos quentes debaixo da planta, mas na recente queda da árvore no Monte, ficaram caladas como ratas).

Contudo, temos de ser honestos e ressalvar o caso de Jorge Coelho, que logo após a tragédia da Ponte Entre-os-Rios, em que morreram 67 pessoas, pediu logo a demissão, um caso raro na política portuguesa.

E sobre a nossa recente tragédia da queda da árvore sobre a multidão no Largo da Fonte, no Monte, não quero aqui discutir se foi um galho dum plátano que caiu em cima dum carvalho, se foi em cima dum cabo de aço e que depois arrastou o carvalho atrás, ou se foi o carvalho que caiu doente. O que eu sei é que houve avisos à Câmara Municipal sobre o estado periclitante do parque arbóreo da zona e que nada foi feito. Deste modo pergunto: E NINGUÉM SE DEMITE? Morreram em Pedrogão Grande e no Monte famílias abraçadas, filhos com pais, pais com filhos, e ninguém põe o seu lugar à disposição? Ninguém dá um passo em frente?! Onde anda a consciência desta gente?

E o mais horripilante é que esses desgraçados, por tudo e por nada, agora cortam árvores num frenesim apalhaçado. Se um cão raivoso morder uma criança não se vai começar a matar todos os cães da zona! Há que haver bom senso e racionalidade, não nos podemos esquecer que as árvores também são seres vivos importantes para a nossa qualidade de vida. Temos é de cuidá-las e tratá-las como fazemos todos os dias com o nosso corpo e com os nossos jardins.

E como uma verdadeira tragédia wagneriana, o Crepúsculo do Deuses foi personificado por um Ministério Público apático e incompetente, que só dois dias depois do trágico evento é que percebeu que o local teria que ser vedado, procedimentos que até uma criança que vê filmes policiais sabe; - um local destes, só pode ser inspecionado por investigadores criminais, independentes, qualificados, e devidamente equipados, para não “contaminarem” a integridade do local do flagício. Sendo o MP uma estrutura hierarquizada, o(s) magistrado(s) que deram esta estranha autorização deveriam levar com um processo disciplinar em cima do lombo e depois demitidos das suas funções.  (Noutros saudosos tempos, eram metidos a ferros numa nau e enviados para Limoeiro)