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sexta-feira, 1 de outubro de 2021

 

ESTÓRIAS 


JUVENAL XAVIER                                                                                  





O ILIMITADO LUGAR

DO PRESENTE

 

 

E quando o encanto sem fim se desencanta num instante mágico? Tudo se desfaz em nada como o espelho que se desprende da parede e estilhaça-se sem remédio. Os olhos caem perdidamente num chão feito de pedaços que nunca se juntarão. Num soluço, esvazia-se o resto do fundo da alma. Nem um pingo sequer; nem uma lágrima vazia. Apenas, friamente, o peso de uma dor que se carrega sempre.  

O futuro não é o que há de vir amanhã de manhã. Não é o mesmo do que um futuro já desenhado pelas estrelas. É a construção permanente do ilimitado lugar do presente. Miguel Torga (pseudónimo de Adolfo Correia da Rocha) diz-nos: “É preciso fazer um esforço contínuo para amar o presente. Viver pelo passado, pelo que se fez, pelo que se conseguiu, é o mesmo que alimentar uma fome premente com banquetes de outrora.”  

Olho com carinho para o tempo a passar com a pressa que só ele tem. Há horas que demoram quando se espera com inquietação; outras, nem temos conta, porque nos enchem de novos e velhos sonhos. Não é um balde de água fria que faz encurtar o caminho para a floresta do encantamento. Ter de voltar atrás perturba a consciência tranquila. Valha-me a lucidez dos cabelos brancos: devagar que tenho pressa. Pressa que atrapalha e sobra menos tempo. 

Deixo escorregar vagarosamente pela alma o amanhecer do dia, seja verão ou inverno. Porém, para o poeta brasileiro do século XX, Carlos Drummond de Andrade, “o outono é mais estação da alma do que da natureza.” As estações já não se parecem com o que eram; confundem-se mais e mais.  

O tempo perdeu o Norte? Por este mar abaixo não é mais o Sul? 

1 comentário:

Unknown disse...

"Tudo se desfaz em nada" é verdade! Mas é preciso saber que há sempre um amanhã! Cabe a cada um de nós preencher esse amanhã!