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domingo, 8 de outubro de 2017



A apreciação do Mérito[i]


ou porque é que os Imbecis têm os “tachos”



Sempre que se fala em Remodelação Governamental vem à baila o tema do Mérito.
A apreciação do Mérito é uma das questões fulcrais na nossa Sociedade Capitalista. Ensinam-nos desde criança, que quem tem mérito terá maior remuneração[ii]… mas não é isso que se observa. Esta inversão prática do valor do mérito tem dois conjuntos de razões: umas relacionadas com a obtenção do Mérito e outras com a sua apreciação pelos “avaliadores” (incluindo a própria Sociedade).
A obtenção do Mérito
Para ter-se Mérito é preciso capacidade, esforço e um ambiente favorável.

As capacidades são distribuídas desigualmente entre os indivíduos, e é essencial ao Mérito ter-se inteligência pois “nem toda a ciência pedagógica de um Pestalozzi chegaria a fazer de um imbecil de nascença um pensador: nunca! Imbecil nasceu e imbecil vai morrer.”
Os mais inteligentes deveriam ser os que deveriam ter maior propensão para terem Mérito… mas também não é isso que se observa. A principal razão para isso é que os mais inteligentes para além de trabalharem para obter Mérito, têm que estar atentos às trapaças de outros que também o desejam (pois “Quando honramos os demais, devemos depreciar a nós mesmos” Goethe) e recebem sucessivas afrontas de quem o decididamente não o tem (pois a “inveja incitada por qualidades pessoais é a mais implacável, e também a mais cuidadosamente dissimulada”).
Uma vez que associada à inteligência existe quase sempre maior sensibilidade (pois “as grandes faculdades intelectuais, em consequência de uma atividade preponderante dos nervos, produzem uma grande sensibilidade à dor, em todas as suas formas”), então os inteligentes têm tendência a desistir devido ao constante assédio que sofrem.
Quanto ao esforço, pouco após à entrada no mercado de trabalho, os inteligentes também percebem que o Mérito não é valorizado.
O Ambiente favorável inclui a satisfação das necessidades físicas e emocionais mas também acesso a formação. Este acesso é condicionado pela disponibilidade financeira disponível do individuo e pelas opções dos seus superiores hierárquicos… e estes últimos nem sempre conseguem distinguir o Mérito e têm sempre uma agenda pessoal (“Ademais, são a baixeza e a perversidade que governam o mundo, e a tolice predomina.”)
A apreciação do Mérito
O Mérito é fruto de uma obra, não de um acto. Isto significa que raramente é reconhecido mérito a alguém enquanto jovem… e é difícil conhecer as obras dos outros.
Ninguém conhece todos, nem domina todas as ciências, pelo que é obrigado a atribuir o Mérito consoante o que lhe dizem; o Mérito é reconhecido pela reputação de cada um. Poucos ou quase nenhuns verificam o que lhes é dito, seja na apreciação de Mérito ou de outra coisa qualquer.
No fundo, a reputação de alguém é a opinião emitida por duas ou três pessoas que foram tão boas a promover e a defender esse parecer a ponto que outros confiassem na fiabilidade dessas opiniões[iii].
 “Um homem de intelecto elevado tende à insociabilidade[iv]”, e são as “opiniões favoráveis de outrem, em todas as formas, auxiliam-nos na obtenção de posses” (incluindo a apreciação do Mérito). Logo, mais uma desvantagem para os inteligentes.
Se os conhecimentos do avaliado são universais (como por exemplo “características essenciais e universais do espírito ou do coração humano, ou forças naturais cuja ação passa constantemente ante vossa vista, ou o bem conhecido curso na natureza em geral”) então é muito difícil destacar-se dos restantes, pois todos pensam que sabem muito do assunto. No caso contrário, só um pequeno grupo de especialistas é que está em condições de fazer essa avaliação.
A apreciação por grau académico também é falha; quantas obras executadas por especialistas existem na região que foram perfeitas imbecibilidades e que muitos “pata-rapadas” identificaram como tal?
A apreciação curricular praticamente só mostra os recursos a que o avaliado teve acesso.
A experiência profissional, por seu lado, só mostra as oportunidades que foram oferecidas ao avaliado.

Conclusão
Para apreciar o mérito, defendo a entrevista, e a verificação das afirmações e obra do avaliado.
Aconselho o estimado leitor também a preparar os vossos filhos para a dor, incluindo desrespeito, insulto e assédio.
De cacordo com Schopenhauer, Se o objetivo do descendente for um “tacho”:
Algo muito distinto ocorre quando o fim que se persegue é elevar-se em serviço do Estado, quando se trata, por conseguinte, de obter favor, amigos, relações, por meio das quais se possa subir de grau em grau e chegar talvez algum dia aos postos mais elevados. Em tal caso, no fundo, mais valeria ter chegado ao mundo sem a menor fortuna. Para um indivíduo que não é da aristocracia e que tem algum talento, ser um pobre indigente constitui uma vantagem real. Porque o que cada qual busca e ama, antes de tudo, tanto na simples conversa como forçosamente no serviço público, é a inferioridade do outro. Assim sendo, somente um miserável está convencido e penetrado de sua inferioridade profunda, positiva e indiscutível, de sua completa insignificância e de sua nulidade, convenientemente às circunstâncias. Só um miserável se inclina muito frequentemente e por muito tempo, e sabe encurvar sua espinha dorsal em reverências de noventa graus bem contados; só ele sofre com um sorriso nos lábios; só ele reconhece que os méritos não têm valor algum; só ele apregoa como obras mestras, publicamente, em voz alta, ou em grossos caracteres impressos, as inépcias literárias de seus superiores ou dos homens influentes em geral; só ele sabe mendigar; por conseguinte, só ele pode iniciar-se a tempo, isto é, desde sua juventude, nesta verdade oculta que Goethe nos revelou nestes termos:
“Nada se queixe da inferioridade, porque é o que move o mundo, diga-se o que se quiser.”
Aquele que, pelo contrário, herda de seus pais uma fortuna suficiente para viver será, em geral, recalcitrante; está acostumado a caminhar tête levée [com a cabeça erguida]; não aprendeu todas essas artes de mendigo. Talvez até se vanglorie de ostentar certas habilidades que possui, mas deveria compreender quão insuficientes são perante o médiocre et rampant [medíocre e rasteiro]. Por fim, é bem capaz de observar a inferioridade dos que estão colocados sobre ele; e se, além disso, as coisas chegarem a ser indignas, se faz contemplativo e misantropo. Não se vence com isso no mundo. Pelo contrário, poderá dizer, finalmente, como o descarado Voltaire:
Não temos mais que dois dias de vida; não vale a pena passá-los rastejando aos pés de patifes desprezíveis.”


Eu, O Santo




[i] Baseado em Schopenhauer.
[ii] Todo o sistema educativo português está concebido para privilegiar o mérito: desde o início as crianças são graduadas e categorizadas segundo o “mérito”.  Uma vez que nem todas as crianças têm capacidade para ter Mérito, será que este Sistema deveria continuar a vigorar?
[iii] Faço uma analogia ao pensamento universal:
“O que se chama de pensamento universal, visto à luz, é o pensamento de duas ou três pessoas; e seríamos convencidos disso se pudéssemos ver como realmente surgem esses pensamentos. Descobriríamos então que existem duas ou três pessoas que a princípio os aceitaram, promoveram ou defenderam; e que foram tão boas a ponto de se confiar que os testaram muito bem. Então, convencidas de antemão de que estas tinham capacidade, algumas outras pessoas também aceitaram a opinião. Estas, por sua vez, receberam a confiança de muitos outros, cuja preguiça lhes sugeriu que era melhor acreditar de uma vez do que ter o trabalho de testar a questão por si mesmas. Assim, dia após dia, cresce o número de tais preguiçosos e seguidores crédulos; então logo a opinião tem um bom número de defensores, e os seguidores atribuem isso ao fato de que tal opinião só poderia ser obtida pela convicção de seus argumentos. Os que ainda tivessem dúvidas eram compelidos a validar o que era admitido universalmente, para não passarem por cabeças-duras que resistem às opiniões validadas pela maioria, ou por pessoas rudes que querem ser mais espertas que o resto do mundo. Agora, aderir, torna-se uma obrigação. A partir deste ponto, os poucos que são capazes de julgar se calam. E quem se aventura a falar é completamente incapaz de ter ideia ou julgamento próprios, simplesmente ecoam a opinião alheia; e mesmo assim a defendem com grande zelo e ignorância. Pois o que elas odeiam nas pessoas que pensam de outra maneira não são as ideias que elas professam, mas a pressuposição de que querem julgar as coisas por si mesmas, o que elas mesmas nunca fazem e disso são conscientes”.
[iv] “Os homens inteligentes e sábios buscarão, primeiramente, se libertar do sofrimento e das moléstias, e encontrar quietude e repouso, isto é, uma vida tranquila e modesta que se resguarda ao máximo de transtornos. Depois de alguma convivência com o que se denomina seres humanos, optarão por uma vida de isolamento ou, no caso de um intelecto elevado, de solidão. Pois quanto mais um homem encontra em si próprio, tanto menos precisa do exterior e menos úteis podem ser as demais pessoas. Por esse motivo, um homem de intelecto elevado tende à insociabilidade.”

17 comentários:

Margarida disse...

Parabéns! Muito bem escrito e pleno de realismo!
Porém demasiado extenso: as alíneas, na minha perspetiva são dispensáveis e desnecessárias!
A maior parte dos leitores não as lerão!!

Anónimo disse...

Quando a ALRAM está cheia de gente que nem sabe ao certo como lá foi parar. Quando alguns ocupam/aquecem cadeira sem sequer ter qualquer formação de base relacionada, ou quanto mais não seja, uma Licenciatura... (Caso do Romulo Coelho (PSD), José Manuel Coelho do PTP, e outros) é caso para dizer que nesta terra vale tudo. É indecente para dizer o mínimo.
O Sr. José Manuel ainda se percebe, pois na altura ninguém dava nada por ele e respectivo PND, mas há lá muitos que não têm qualquer meritocracia para além do cartão de militante e o subir às costas do partido.

Anónimo disse...

O real mérito está longe dos canudos e dos CV´s dos candidatos aos "job´s".
O genuíno mérito deve estar nas capacidades inatas do indivíduo, no seu carácter pessoal enquanto interveniente e, na sua competência e aptidão para a função correspondente!

Anónimo disse...

Desde quando para se ser deputado e preciso uma licenciatura? Tristeza de comentario.

Anónimo disse...

Anónima das 13:37 - Leia novamente o comentário, ninguém disse que tem de ter Licenciatura para ser deputado, mas nos dias que correm, com tanto licenciado que batalhou duro para tirar o seu curso superior, é duvidoso que certos indivíduos ocupem cargos de tamanha responsabilidade sem serem licenciados. É apenas senso-comum.

Anónimo disse...

Anónima das 17:37 - Leia novamente o comentário, ninguém disse que tem de ter Licenciatura para ser deputado, mas nos dias que correm, com tanto licenciado que batalhou duro para tirar o seu curso superior, é duvidoso que certos indivíduos ocupem cargos de tamanha responsabilidade sem serem licenciados. É apenas senso-comum.

Anónimo disse...

Desde quando, é preciso ter mérito, para ter tacho e subir na vida nesta terra? Basta cartão laranja e cunha!

Anónimo disse...

Para chegar a deputado/a, não é preciso mérito nem formação superior. Basta ser filiado/a e ter cartão de um partido qualquer,( de preferência laranja), desde o infantário!

Anónimo disse...

Ao nível da tutela o mérito tem sido a fotogenia, apertos de mãos e assobios para os lados. Ao outro nível, o da administração pública de base tem sido a neutralização e o esconder dos funcionários com competência e alto nível por forma a que os chefes (diretores das instituições, chefes de divisão com cursos tirados pela televisão, etc.) se mantenham com o tachinho. Nem trabalham pela coisa pública por não dominarem o assunto, nem sequer cumprimentam os funcionários escondendo-se nos gabinetes. Passam as comissões de serviço a ver a assiduidade ou a pagar juntas medicas ao domicilio em caso de doença para ameaçar e assegurar que o pessoal está calado e quieto e, como esta situação já não funciona. Não enfrentam ninguém ou sequer reúnem por forma a que não hajam equipas ou objetivos organizacionais e assim não arriscam ouvirem na cara o que se pensa deles. Limitam-se a ver no computador as estatísticas de trabalhinhos de caca executados por gente com habilitações superiores e verificados por colegas com habilitações do ensino secundário. Depois, remetem para as secretarias os quadros com os números do trabalho feito que nem é essencial à coisa pública. O importante é afastar a concorrência e prolongar a cadeira. A continuar assim, a própria administração não se levantará, nem os votinhos surgirão nas legislativas. A motivação é zero e a revolta está à vista. Os trabalhadores deviam fazer parte da avaliação do diretor/chefe, já que estes, e o grande mal, não são resolvidos nas urnas.
Mérito? Como dizia o meu avô: mais vale uma arte como ofício do que andar debaixo das patas de gente mesquinha e gananciosa!

Anónimo disse...

Muito bem dito!!

Anónimo disse...

Excelente exposição. Parabéns!

Anónimo disse...

Um dos casos escandalosos de que me lembro e foi falado aqui no fenix foi aquela da comissão das drogas que nomearem uns afilhados desempregados e incompetentes... a renovação no seu melhor

Anónimo disse...

Agora já não é ter cartão laranja que esses estão na mó de baixo. Agora é preciso ser cafofiano que há Cunha na empresa municipal de boys... frente mar.

Anónimo disse...

07:36 - Um PSD a denunciar favorecimentos políticos é absolutamente Hilariante. Será que não aprenderam nada com os putos da JSD? Atirar pedras aos outros quando se tem telhados de vidro, é, no mínimo, patético.

Anónimo disse...

Verdade sim senhor! Primeiro os que se esforçaram por tirar uma licenciatura... Já não pode haver espaço para cunhas!

Anónimo disse...

"Anónimo disse...
Desde quando para se ser deputado e preciso uma licenciatura? Tristeza de comentario.

8 de outubro de 2017 às 17:37"

Aí eu pergunto: Como é que é possível ser-se deputado(a), sem se ter uma Licenciatura? É inqualificável. Nos dias que correm, quando a grande maioria da população é efetivamente Licenciada, como é possível que esta não seja uma condição "sine qua non", na representatividade parlamentar? Só mesmo numa ilha onde impera o "tachismo" sem mérito. Isso não aconteceria no Continente de certeza absoluta.

Anónimo disse...

Retrato fiel do que se passa na ALRAM, chefias cegas, surdas e mudas!! O quero posso e mando, nem falam com os trabalhadores, permanecem no autismo....