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sexta-feira, 6 de agosto de 2021

 

ESTÓRIAS 


JUVENAL XAVIER                                                                                  





NUNCA TINHA LIDO NEMÉSIO


 


Quem da minha geração não ouviu falar de Vitorino Nemésio? Açoriano da Terceira (Praia da Vitória), o autor de Mau Tempo no Canal (1944) agarrou os portugueses ao pequeno ecrã a preto-e-branco, entre 1969 e 1975, com o programa “Se bem me lembro”, em horário nobre. A realizadora da RTP, Maria João Rocha, dizia que “era muito mais que um homem de televisão. Era, sobretudo, um homem do mundo.” Os madeirenses (Distrito Autónomo do Funchal) tiveram esse gosto (só) em agosto de 1972, quando a Radiotelevisão Portuguesa ia fazer 16 anos.  

Graças ao YouTube (inimaginável na minha juventude), apanhei um episódio sobre a importância das Ciências Humanas, com o meticuloso pintor de palavras a perguntar se a cultura será diferente da ciência. E, entre a magia das pausas, respondia: “É e não é.” Porquê? “Quando dizemos cultura, referimo-nos a tudo o que o homem fez ao longo dos tempos, portanto historicamente, e assim a palavra cultura pode identificar-se com história.” 

Mas eu nunca tinha lido Nemésio (1901-1978). Até que, há tempos, a minha inesquecível professora de francês (Dra Margarida Camacho) ofereceu-me vários livros, entre eles (e vejam só), o último da sua obra. Na Introdução, D. M. – F. (David Mourão-Ferreira) escreve: “o Quase Que os Vi Viver, apontado no título, também aqui corresponde a Quase Que os Vi Escrever.” 

E quem eram eles?  

Gil Vicente que “está no cruzamento das linhas que trazem ao homem moderno a substância do cómico.” Bocage, “sempre ladrão da própria felicidade. Um homem malfadado, uma grande alma metida num corpo frenético, sem sossego nem juízo.” Garrett, “um insatisfeito moderado, um homem de paixões e de estos sofreados, por elegância e por apego ao mesmo tempo estético e moral à direcção e ao pudor.” Júlio Dinis, cujo romance “é, “sob o aspecto moral, um antídoto contra o romantismo.” Gomes Leal “Com a pensão paga tarde ou gasta até ao último ceitil, agora dorme nos bancos do Rossio, ao pé dos monumentos, onde calha.” Cesário Verde que “trata o concreto como quem leva consigo a medida do essencial e do poético e só pede às coisas verdade e forma autêntico.” Moniz Barreto para quem “Há três pontos de vista na interpretação da natureza: a causalidade, a finalidade e a necessidade; o primeiro é o da Ciência, o segundo o da Arte, o terceiro o da Filosofia; os dois primeiros estão contidos no terceiro.” Eugénio de Castro, “poeta e, acima de tudo, um artista. Não houve em Portugal maior escritor de versos.” E Júlio Dantas “que lhe devemos do mais e do melhor que se sabe em Portugal da petite histoire dos séculos XVIII e XIX.”  

quase que os vi viver 

1 comentário:

Luísa disse...

Que forma tão bonita de aproveitar as palavras de Vitorino Nemésio! O Mestre teria gostado deste périplo literário a partir das suas palavras. Parabéns!