CRÓNICA

Luís Calisto                                                                                            

2021: VACINA SÓ É EFICAZ

COM DUAS INJECÇÕES EXTRAS

É preciso injectar bazuca e credibilidade no sistema de Albuquerque. 

Temos assistido nestes dois dias a transmissões televisivas em directo sobre a implementação do plano de vacinação anti-coronavírus. Reportagens com tantos pormenores que, se alguém tinha dúvidas, ficou a saber o que é um avião aterrar em Santa Cruz, mesmo de noite, trazendo a bordo certo produto delicado sem ser a bomba atómica. 

Outro directo pela TV foi quando da primeira "inoculação da vacina", realmente o "momento emocionante" que os comunicadores relataram. Em diversas partes do País, Madeira incluída, os primeiros vacinados foram escolhidos entre os profissionais da Saúde.

Como não podia deixar de ser, o Presidente do GR aproveitou as circunstâncias para se dirigir aos Madeirenses, com mais recomendações, conselhos e avisos. Até porque estamos a poucas horas da concentração de pessoas que pretendem assistir ao fogo da meia-noite ao vivo. 

Ao que me dizem, as redes sociais têm feito chacota com os quadradinhos desenhados nas praças do Funchal. Mas já agora: como é que as redes acham que deveria ser? 

Enfim, temos a vacina contra-vírus no terreno, esperemos que tudo decorra sem novidade para não termos em 2021 uma segunda edição de 2020.

 

Acontece todavia que esta vacina milagrosa não vai chegar para ultrapassar o estado em que vivemos se ela não for complementada com duas injecções especiais.

Em primeiro lugar, uma injecção de bazuca. O que exige trabalho e "chatices". Quando o negócio mete dinheiro nacional ou europeu atribuído à Madeira, o processo emperra no caminho. Como se sabe, a crise económica imobilizou a Região. Sem alternativa para o nosso ramo único de economia, o turismo, não há dinheiro a entrar nos nossos falidos cofres. A hotelaria esmorece, a restauração definha, a construção civil vive de carunchos. De tudo isso resulta um desemprego galopante e sem rédeas. E fome nas casas.

A Madeira precisa pois de uma dose cavalar da bazucada que Bruxelas se prepara para enviar aos países-membros da UE. 

Não é desconfiar de tudo o que se mexe, mas, repito, com António Costa a mandar na capital, as obrigações para com a Madeira cheiram a calendas gregas.

As dificuldades levantadas ao CINM e os juros de ouro cobrados à Região levam-me a estes maus pensamentos, misturados com outros sobre a inabilidade dos governantes ilhéus. Parece que a pronúncia regional impede os nosso governantes de se fazerem entender pelos tipos do "pá", isto é, os instalados na capital.

 

A segunda injecção que deve complementar a vacina já no terreno é a injecção contra o descrédito. Porque uma série infindável de 'presidentices' tem dado cabo dos nervos do cidadão.

Começa em Belém. Em 2021, teremos Presidente da República recauchutado, mas pouco. Um Presidente que se diz indissociável do cargo quando os jornalistas lhe pedem uma opinião difícil, para "não poder" comentar. E que lembra ser candidato quando interessa. Teremos um Presidente que funciona ao sabor das críticas dos eleitores. Ele programa uns quantos convívios de Natal e reduz tudo a uma consoada porque as redes sociais o "rasgaram" de cima a baixo. Ele planeia dar umas sugestões de Ano Novo ao Povo e, acusado de eleitoralismo, diz que, pronto, não dirige mensagem nenhuma dia 1 de Janeiro. 

Não admira que no meio da bagunçada o povo queira resolver os seus problemas entrando nas sessões municipais de cajado na mão; ou descarregando raivas nos ucranianos que tentam entrar em Lisboa pelo Aeroporto; ou votando no Tino de Rans e no André Ventura. 

 

Veja-se a quem está entregue a Presidência da UE a partir deste 1.º de Janeiro! 

Certamente que o covid também tem afectado as cabecinhas pela Europa p'ra lá.

 

A injecção-coerência também precisa de chegar à Quinta Vigia - e como! 

Miguel Albuquerque deu com o jeito de lidar com a pandemia, e tem agradado ao povinho. Mas continua a abusar da sorte. Aquilo é uma jogada certa para dez calinadas. 

As pessoas desesperam. 

O homem diz que a situação de pandemia não é brincadeira nenhuma e depois aparece a tocar piano e até a cantar, o que só pode ser brincadeira. Mostra-se muito sorridente em sessões de fotografia para revistas de estilo (que o antecessor dizia de cabeleireiro) e logo depois ameaça estender um cordão sanitário pr'aí. Aparece sem máscara a dizer que a populaça tem de usar máscara. Proíbe convívios de trabalho enquanto almoça com os secretários regionais uns em cima dos outros! 

Pois, o Governo é um caso diferente, mas mesmo esses que não trabalham deviam ter cuidado com as patuscadas em grupo. Ou há democracia ou comem todos.

Depois é o costume de invocar a importância da economia quando é preciso fugir a uma questão incómoda da Saúde; e fazer o contrário quando urge ignorar o tema economia. 

O Presidente chama "coitadinhos" aos nossos estudantes que querem vir à Madeira. Ameaça que põe uns carros da bomba na pista de Santa Catarina. Aponta o dedo ao prevaricador culpado por duas mortes. Manda gasolina para a fogueira onde arde o piloto Miguel Campos, a fazer lembrar a expressão "está tudo sob controlo" (enquanto o Funchal e subúrbios ardiam). 

Albuquerque já disse que "felizmente a Madeira regista menos vítimas do covid do que o resto do País" - o que pode ser interpretado como alegria mórbida pelo facto de o resto do País estar a registar mais mortes do que a Madeira.

Será que o nosso Chefe está a tornar-se um indivíduo perigoso?

Essas manias de incendiário e de músico fazem-me lembrar o paranóico do Nero e o perturbado comandante do Titanic.

O pior é que, entretanto, a população desorientada vai matar porcos sem máscara e abana o capacete sem distanciamento nenhum.

É ou não é preciso inventar uma injecção de credibilidade?

Já tenho saudades do tempo em que o GR não fazia mais do que culpar Lisboa de tudo; e em que o PS não fazia mais do que dizer que o GR culpava Lisboa de tudo. E assim se passava o tempo, sem necessidade de vacinas nem de injecções.