Com a devida vénia ao 'Público', reproduzimos a reportagem da autoria do nosso companheiro Tolentino de Nóbrega sobre o livro dos investigadores Nancy Policarpo e Raimundo Quintal sobre a baía do Funchal, a lançar esta segunfa-feira.
Madeira
Obras continuam, apesar dos pareceres negativos dos especialistas e das
deliberações da autarquia. DR
|
Investigadores
dizem que obra na baía do Funchal é cara e muito arriscada
PÚBLICO - Tolentino de Nóbrega
Autores do livro sobre a baía do Funchal, a ser lançado hoje, chumbam o
novo cais de cruzeiros e alertam que a união dos troços finais das ribeiras irá
gerar uma nova anomalia na dinâmica do litoral
A construção de um
cais de acostagem para navios de cruzeiro e a criação duma nova marina entre o
velho cais da cidade do Funchal e a foz da ribeira de Santa Luzia constituem
uma" interferência demasiado arriscada e cara" na dinâmica do
litoral, concluíram os investigadores Nancy Policarpo e Raimundo Quintal.
No livro Baía do Funchal: Dinâmicas Naturais e Antrópicas, que hoje será apresentado no salão nobre da câmara municipal desta cidade, os dois membros do Centro de Estudos do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território advertem também que "a união dos troços finais das ribeiras de Santa Luzia e João Gomes, o aprofundamento do leito no segmento terminal e a extensão da nova foz 70 metros para jusante da Avenida do Mar, para além de não mitigar o risco de colapso a montante do Campo da Barca (nas cheias de 1993 e 2010 foi aí que a ribeira de João Gomes transbordou), irá gerar uma nova anomalia na dinâmica do litoral".
Neste estudo-síntese de pesquisas que levaram a cabo no âmbito do Projecto SECOA - Solutions for Environmental Contrasts in Coastal Areas, apoiado pela União Europeia, Raimundo Quintal e Nancy Policarpo defendem o desmantelamento de todas edificações a jusante da Avenida do Mar, entre o antigo cais da cidade e a foz da ribeira de Santa Luzia, e o transporte por via marítima dos inertes, aí acumulados após a cheia de 20 de Fevereiro de 2010, para oeste da Barreirinha e/ou para o sector oriental da praia Formosa, troços da costa que, como demonstram, estão em claro recuo.
Recorrendo aos dados dos sistemas de informação geográfica, os investigadores fizeram um exercício de sobreposição da cartografia antiga e contemporânea com o objectivo de verificar a evolução da linha de costa na baía nos dois últimos séculos, em resultado das dinâmicas naturais e antrópicas, questionando, do ponto de vista da sustentabilidade ambiental e do ordenamento do território, o impacto de alguns projectos implantados ou previstos.
A comparação da carta da cidade de 1804 com o mapa do Funchal após a aluvião de 2010, permitiu verificar que as diferenças mais significativas ocorreram entre a Pontinha e a foz da ribeira de João Gomes, com a linha de costa a avançar no mar, em média, 106 metros. Com a criação do depósito de inertes após aquela cheia, avançou 72 metros, com grande impacto na paisagem do litoral da cidade.
O presente estudo corrobora conclusões de pareceres desfavoráveis às obras em curso. Remetida por Alberto João Jardim para um papel residual em todo este processo, a Câmara do Funchal, fundamentada em estudos do Instituto de Hidráulica e Recursos Hídricos da Faculdade de Engenharia do Porto e do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território, da Universidade de Lisboa, deu um contundente parecer negativo aos projectos de intervenção nos troços finais das ribeiras, nos quais era "completamente menorizado" o papel da hidrodinâmica marinha. Por esta mesma razão, opôs-se ao aproveitamento do aterro para construção de um cais acostável, concluindo que a solução "tem grandes limitações em termos de operacionalidade e de segurança, bem como uma relação custo/benefício diminuta".
O governo regional ignorou também o parecer dos seus próprios consultores, que, sobre a viabilidade de um novo cais, em frente à cidade, alertaram que a estrutura só iria funcionar 10 dias por mês. A Declaração de Impacte Ambiental Favorável Condicionada, emitida pela Direcção Regional do Ambiente, adverte também para a "evidente perda de qualidade visual que a obra acarretará para a cidade".
Indiferente aos pareceres técnicos e aos protestos contra uma obra "megalómana não-prioritária", num momento de austeridade e, ainda por cima, recorrendo a verbas da solidariedade nacional, Jardim ordenou o arranque das obras, mesmo com as condições atmosféricas e marítimas adversas, no final de Setembro. Só um mês depois encomendou à consultora Quarternaire um estudo sobre o custo/benefício.
O governo regional nem parou quando, há um mês, a Câmara do Funchal, por deliberação aprovada por unanimidade, proibiu a abertura simultânea de duas frentes de obras no centro da cidade (uma na foz da ribeira de S. João e outra nos troços finais das ribeiras de João Gomes e Santa Luzia), por entender que "é insuportável" para o trânsito, comércio, ambiente e turismo ter estas intervenções a decorrer ao mesmo tempo ao longo de dois anos.
No livro Baía do Funchal: Dinâmicas Naturais e Antrópicas, que hoje será apresentado no salão nobre da câmara municipal desta cidade, os dois membros do Centro de Estudos do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território advertem também que "a união dos troços finais das ribeiras de Santa Luzia e João Gomes, o aprofundamento do leito no segmento terminal e a extensão da nova foz 70 metros para jusante da Avenida do Mar, para além de não mitigar o risco de colapso a montante do Campo da Barca (nas cheias de 1993 e 2010 foi aí que a ribeira de João Gomes transbordou), irá gerar uma nova anomalia na dinâmica do litoral".
Neste estudo-síntese de pesquisas que levaram a cabo no âmbito do Projecto SECOA - Solutions for Environmental Contrasts in Coastal Areas, apoiado pela União Europeia, Raimundo Quintal e Nancy Policarpo defendem o desmantelamento de todas edificações a jusante da Avenida do Mar, entre o antigo cais da cidade e a foz da ribeira de Santa Luzia, e o transporte por via marítima dos inertes, aí acumulados após a cheia de 20 de Fevereiro de 2010, para oeste da Barreirinha e/ou para o sector oriental da praia Formosa, troços da costa que, como demonstram, estão em claro recuo.
Recorrendo aos dados dos sistemas de informação geográfica, os investigadores fizeram um exercício de sobreposição da cartografia antiga e contemporânea com o objectivo de verificar a evolução da linha de costa na baía nos dois últimos séculos, em resultado das dinâmicas naturais e antrópicas, questionando, do ponto de vista da sustentabilidade ambiental e do ordenamento do território, o impacto de alguns projectos implantados ou previstos.
A comparação da carta da cidade de 1804 com o mapa do Funchal após a aluvião de 2010, permitiu verificar que as diferenças mais significativas ocorreram entre a Pontinha e a foz da ribeira de João Gomes, com a linha de costa a avançar no mar, em média, 106 metros. Com a criação do depósito de inertes após aquela cheia, avançou 72 metros, com grande impacto na paisagem do litoral da cidade.
O presente estudo corrobora conclusões de pareceres desfavoráveis às obras em curso. Remetida por Alberto João Jardim para um papel residual em todo este processo, a Câmara do Funchal, fundamentada em estudos do Instituto de Hidráulica e Recursos Hídricos da Faculdade de Engenharia do Porto e do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território, da Universidade de Lisboa, deu um contundente parecer negativo aos projectos de intervenção nos troços finais das ribeiras, nos quais era "completamente menorizado" o papel da hidrodinâmica marinha. Por esta mesma razão, opôs-se ao aproveitamento do aterro para construção de um cais acostável, concluindo que a solução "tem grandes limitações em termos de operacionalidade e de segurança, bem como uma relação custo/benefício diminuta".
O governo regional ignorou também o parecer dos seus próprios consultores, que, sobre a viabilidade de um novo cais, em frente à cidade, alertaram que a estrutura só iria funcionar 10 dias por mês. A Declaração de Impacte Ambiental Favorável Condicionada, emitida pela Direcção Regional do Ambiente, adverte também para a "evidente perda de qualidade visual que a obra acarretará para a cidade".
Indiferente aos pareceres técnicos e aos protestos contra uma obra "megalómana não-prioritária", num momento de austeridade e, ainda por cima, recorrendo a verbas da solidariedade nacional, Jardim ordenou o arranque das obras, mesmo com as condições atmosféricas e marítimas adversas, no final de Setembro. Só um mês depois encomendou à consultora Quarternaire um estudo sobre o custo/benefício.
O governo regional nem parou quando, há um mês, a Câmara do Funchal, por deliberação aprovada por unanimidade, proibiu a abertura simultânea de duas frentes de obras no centro da cidade (uma na foz da ribeira de S. João e outra nos troços finais das ribeiras de João Gomes e Santa Luzia), por entender que "é insuportável" para o trânsito, comércio, ambiente e turismo ter estas intervenções a decorrer ao mesmo tempo ao longo de dois anos.
"Dinheiro
atirado para o fundo do mar"
Raimundo Quintal, Prémio Quercus 2012, apela aos madeirenses
Pela quarta vez, desde
o arranque, "o mar avisa que não gosta daquela obra tresloucada, mas
obstinadamente vão continuar até que um temporal de sul ou sudeste dê cabo
daquilo tudo", adverte Raimundo Quintal, sobre o projecto na baía do
Funchal. "Até quando vão os madeirenses continuar impávidos a ver o
dinheiro da Lei de Meios atirado para o fundo do mar? Vai Portugal e a Europa
permitir que verbas do QREN sejam desbaratadas nestas empreitadas?",
questiona o investigador. As intervenções nos troços finais das três ribeiras
foram adjudicadas às empresas Zagope e AFA, em Dezembro de 2011, por 44, 1
milhões de euros. Em breve será anunciado o vencedor do concurso para a
construção do novo cais de cruzeiros, depois de o governo regional ter anulado
o anterior e ceder no aumento do preço-base para 18 milhões, como pretendiam os
concorrentes. Estranhamente, estas mesmas intervenções estão incluídas numa
candidatura ao Programa Operacional Temático Valorização do Território, do QREN
2007/13, numa operação estimada em 80 milhões, ou seja, no valor, incluindo o
IVA, daquelas intervenções já financiadas pelo Lei de Meios para a reconstrução
pós-temporal.
Raimundo Quintal foi galardoado com o Prémio Quercus 2012, atribuído por esta associação ambientalista, pela "acção muito prática na reflorestação das serras do Funchal e na defesa do património natural da região, manifestando-se contra alguns projectos megalómanos que atentam contra o ambiente e defendendo políticas mais interventivas, nomeadamente no que respeita aos inúmeros riscos que a região corre devido à acção humana e orografia, por exemplo aquando de aluviões e de incêndios".
Raimundo Quintal foi galardoado com o Prémio Quercus 2012, atribuído por esta associação ambientalista, pela "acção muito prática na reflorestação das serras do Funchal e na defesa do património natural da região, manifestando-se contra alguns projectos megalómanos que atentam contra o ambiente e defendendo políticas mais interventivas, nomeadamente no que respeita aos inúmeros riscos que a região corre devido à acção humana e orografia, por exemplo aquando de aluviões e de incêndios".
13 comentários:
Só o Raimundo tem especialistas credíveis.
Os especialistas que fizeram o projeto são menos capazes. São burros. Enfim...
Porque será que ninguém ouve a opinião dos especialistas que fizeram o projeto?
Não interessa, pois não?
Com a devida vénia, já não há pachorra para tanta baboseirada.
Este Raimundo é um fundamentalista. Nem tanto ao mar, nem tanto à serra.
Será que o Dr. Raimundo tirou o curso de engenharia hidráulica com o Miguel Relvas?
O Raimundo, como todos nós humanos, tem limitações. Ele, para quem quiser lembrar-se, deu a cara, não foi anónimo, no debate televisivo como os projectistas. Poderá não ter razão mas até prova em contrário as obras marítimas do Gr têm sempre dado raia. É sudoeste no porto santo (o Lobo fica-se) é a marina no lugar debaixo e é a ribeira brava que "mexe". Venham lá os argumentos que deitam por terra aquilo que o Prof. Raimundo defende! Vive-se neste caso o mesmo que, durante anos, se viveu com a economia. Ela andava a ser rebentada sob uma aparente "riqueza". O ponto de chegada, para qual alertaram, está à vista. Infelizmente a razão estava com os "tontos" que avisaram e ninguém quis ouvir. Está de tal, ordem que nem semilhas tiram da terra.
Caro Doutor Figueira
Não consigo passar do empirismo nisso de ribeiras e litoral. Mas não é preciso fazer um curso para perceber a psicologia de muitos que criticam o Prof. Raimundo.
Só os iluminados estão do lado do Dr. Raimundo.
O resto são uns burros miseráveis.
Antes da discucao tecnica, sem duvida o mais importante era saber da importancia da obra,sem duvida dou razao ao Dr Raimundo Quintal, um cais para ser usado 10 dias por mes ?todo aquele material deveria ser retirado dali, em vez de unirem a foz das ribeiras, os trabalhos deveriam ser feito a montante, evitando assim problemas na foz das ribeiras e poupando alguns milhoes.
OS trabalhos a montante estão a ser feitos:
DOZE AÇUDES NAS RIBEIRAS SEGURAM FUNCHAL - http://impresso.jornaldamadeira.pt/noticia.php?Seccao=17&id=230918&sdata=2012-11-15
o Sr. Paulo sabe o quanto significa para o comercio local, a atracagem de um barco, nem que seja 10 dias ao mês?
Sabe quanto gasta cada passageiro?
Quantos passageiros ao ano receberá a baixa do Funchal com mais este cais de acostagem?
Não deve saber, porque os iluminados estão todos do lado do Dr. Raimundo Quintal
Sr Miguel desculpe mas nao sou nem iluminado, nem pertenco a um povo superior.
Se sei quantos passageiros a baixa do Funchal recebera com este novo cais ? Sei que no ano de 2011 foram 316 escalas, o que significa menos de uma escala dia, em 2012 estam previstas 347 escalas, continua a media a ser inferior a uma escala por dia, a Falta de espaco no porto nao e desculpa para fazer um novo Porto, mas voce acha que com esta media se deve fazer mais um porto, e a sua opiniao.
Quanto a estar ao lado do Dr Raimundo Quintal, estou a vontade porque so o conheco dos orgaos de comunicacao social.
Sou geografo também. Um mero reles licenciado, como tal, um generalista sem especialidade em concreto. Contudo, facilmente percebo e concordo com as preocupações do Drº Raimundo Quintal (provavelmente, todos nós geógrafos estamos enganados, ou não), algo suportado também pela Universidade do Porto e de Lisboa (ambas as universidades com especialistas que provavelmente também andam a comer gelados com a testa). Nunca me debrucei profundamente sobre o assunto, mas facilmente identifico varias razões para não ir em frente com o projecto, até porque não alcançará o principal objectivo que é a mitigação dos riscos. O Drº Raimundo Quintal devia merecer todo o respeito por parte dos madeirenses. É unicamente verdadeiramente especialista em biogeografia, mas antes do seu doutoramento adquiriu "bagagem" noutras áreas chave ao longo da sua licenciatura e mestrado. De relembrar que a geografia é uma ciência multidisciplinar, daí, naturalmente se sentir bem a falar sobre diversos temas. Nunca se esqueçam também do seguinte: Geografia é a ciência que estuda a superfície terrestre e a distribuição espacial de fenômenos significativos na paisagem, tal como as relações reciprocas entre a sociedade e os fenômenos físicos e biológicos (homem-natureza).
Enviar um comentário