Lei de Salazar "salva" Jardim na "guerra" entre procurador e juiz do Tribunal de Contas
Mais contundente despacho do responsável pelo TC na Madeira promete intensificar hostilidades.
TOLENTINO DE NÓBREGA
Uma lei do Estado Novo, assinada por Oliveira Salazar em 1933, está na origem da "guerra" entre o juiz do Tribunal de Contas (TC) na Madeira, João Aveiro Pereira, e o procurador-geral adjunto da República junto desta instituição, Varela Martins.
O "fogo-cruzado" entre os dois magistrados deverá intensificar-se nos próximos dias, com a publicação de um novo e mais contundente despacho do juiz contra o procurador, por este não ter procedido judicialmente contra governantes regionais na auditoria ao financiamento do Centro Internacional de Inteligência Conectiva. Em causa está o arquivamento de infracções financeiras, com responsabilidade reintegratória, por "assunção de despesas sem suporte documental" e "pagamentos causadores de dano para o erário público", num total de 1,67 milhões de euros, imputadas aos secretários da Educação e do Plano e Finanças.
Anteriores arquivamentos de auditorias que detectaram infracções, puníveis por lei com multa e devolução de verba, aqueceram o ambiente no TC da Madeira. Entre outros casos controversos, o procurador do MP decidiu em Fevereiro não requerer procedimento jurisdicional contra os membros do Governo Regional, considerados responsáveis por ilegalidades detectadas na auditoria à Viamadeira, em que o TC acusa o Governo Regional de sobrecarregar "imprudente e ilegalmente o seu orçamento" com esta PPP rodoviária, assumindo encargos na ordem dos 300 milhões, que não foram orçamentados e deram origem ao "buraco" descoberto no Verão de 2011.
Interpretações antagónicas
Jardim e membros do seu Governo estão assim a passar incólumes, por entre interpretações antagónicas de um decreto de Salazar em que o procurador do MP se fundamenta para não os levar a julgamento. No caso mais recente (arquivamento da auditoria que imputava responsabilidades financeiras na omissão de dívidas dos Institutos da Saúde do Desporto na Madeira, no valor 180 milhões), noticiado na semana passada, o magistrado invocou o regime especial de que gozam os ministros nas condições fixadas pelo decreto 22.257, de Fevereiro de 1933. Para a sua responsabilização financeira, alega Varela Martins, é necessário que se mostre que não seguiram os pareceres das "estações", o que, adianta, não se verificou no caso em apreço.
Mas o juiz do TC, no polémico despacho que levou a PGR a ordenar um "inquérito urgente" aos serviços do MP e a sugerir ao presidente do TC a abertura de um processo disciplinar aos responsáveis da secção regional do tribunal, reitera que da auditoria resulta que os governantes "não deram ouvidos ao que as "estações" lhes transmitiram". "Os indiciados governantes é que, para beneficiarem da imunidade instituída por Oliveira Salazar, teriam de alegar e provar que ouviram as ditas "estações" e que decidiram de acordo com o parecer que delas receberam." E conclui: a remissão da lei do TC para "o tal decreto do Estado Novo encontra-se hoje sem conteúdo, pelo menos, no que à responsabilidade sancionatória diz respeito e, por isso, sem aplicabilidade".
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