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sábado, 24 de agosto de 2013

POLÍTICA DAS ANGÚSTIAS / SÁBADO


ALBUQUERQUE COMEÇA EM JANEIRO
DISPUTA DIRECTA COM JARDIM




Os empresários levaram Jardim a um jantar no Porto Santo, mas atenção que Miguel também está no areal






O Dia do Funchal esclareceu aquilo que havia por esclarecer: os últimos acontecimentos políticos na Região, apesar de decisivos e surpreendentes, deixaram tudo como estava. Jardim mudou de comportamento sem se libertar da obsessão do poder. Obstinadamente, quer prolongar um passado sobre o qual já se movimentam as gerações seguintes.


A luta no interior do PPD-Madeira, que vem degradando a vida pública na Região, continuará inalterável: Jardim não abdicará do poder a não ser através de uma derrota em eleições internas. 

As incidências do Dia da Cidade (21) trouxeram a 'não-notícia notícia' de que tudo vai continuar na mesma, quando se admitia um golpe de génio da parte do líder, no sentido de aproveitar a pequena porta que lhe restava para sair de cena.
Não. Jardim não resigna, não desiste, não renuncia, não se auto-exonera. Pelo contrário, continua decidido a reivindicar mais um mandato na liderança do seu partido para tentar, ele próprio, ganhar as eleições regionais de 2015 - e por aí prosseguir na presidência do governo durante os 4 anos seguintes. Até ver.


Próxima eleição interna terá de ser 'jogo limpo'


Miguel Albuquerque parece finalmente acreditar nessa predisposição do chefe. Tanto assim que já deu indicações aos seguidores da sua candidatura para o seguinte: em Janeiro de 2014 começa uma guerra para terminar em meados de Dezembro, nas eleições internas do PPD.

O inimigo nessa guerra será precisamente Jardim. Alvo apontado pelas hostes miguelistas. Onde persiste a intenção de não perfilar, desta vez, uma posição passiva, como na eleição anterior.
Na próxima, avisa Miguel Albuquerque, o líder vai ter de 'jogar limpo'. Porque a eleição anterior não foi limpa. A chamada candidatura municipal, como se sabe, não teve acesso ao site do partido nem à imprensa dominada pela facção no poder: 'Jornal da Madeira' e 'Madeira Livre'. Nem tão pouco às listas de eleitores. E houve intimidação aos funcionários públicos. 
A partir de Janeiro, não haverá contemplações - dizem os apoiantes de Miguel Albuquerque, corroborados pelo próprio. Não serão concedidos motivos para Jardim usar o cansado estratagema da vitimização. Mas ninguém se calará quando for hora de falar, protestar e atacar. Nem será permitido ao líder continuar a enjeitar culpas pelo naufrágio aonde conduziu o PPD e a própria Madeira. Fazer asneiras e culpar Lisboa tem de ser atitude condenada pelos madeirenses.


O Monte já mostrara que uma guerra não se acaba assim 

Pelo discurso feito no Dia da Cidade, percebeu-se a determinação do autarca social-democrata de tornar mais agreste, doravante, a forma de tratar com o seu ainda líder partidário.
Jardim indicara no Monte, uma semana antes, que a guerrilha com os lados da Câmara era para continuar. Não cumprimentou os vereadores presentes, a não ser Bruno Pereira. Um ambiente tenso na missa e na procissão bem esclarecedor.
O chefe deve ter reparado na desconsideração ostensiva que lhe haviam dedicado: Miguel Albuquerque não antecipou o regresso de férias um dia para estar no Monte, perto do presidente do governo. Pedro Calado, vice da Câmara, estava ao serviço mas também não apareceu. Em representação da maioria municipal estiveram Costa Neves, incompatibilizado com Jardim, mais Amílcar Gonçalves, que não é das graças das Angústias.
Seria que, uma semana depois, nas cerimónias do Dia da Cidade, o chefe do governo e do PPD aproveitaria para tentar desanuviar o ambiente, deixando perceber que fala verdade quando anuncia a sua saída para 2014 e que afinal quer partir em paz?


Zangado com o mundo, incluindo Jaime Ramos

Um cumprimento de circunstância feito a Miguel e costas voltadas para toda a vereação da Câmara em festa deram a resposta: Jardim está disposto a continuar enraivecido até ao fim.
Ali, na Praça do Município, e depois no interior da Câmara, viu-se um homem incompatibilizado com o mundo inteiro. Pois se já entrou publicamente em conflito com o seu cireneu predilecto, Jaime Ramos!
Viu-se. Não há mais os antigos cumprimentos a toda a gente em todo o lado. Hoje, é a zanga insanável misturada com o receio de não ser correspondido ao estender a mão. O mesmo pavor que o impede há muito tempo de comparecer no Estádio dos Barreiros, de má memória para ele. 
Tudo a sair-lhe mal, como o campeão a quem começou a faltar a estrelinha. Até a bica se lhe entorna diante dos convidados no salão nobre e com a câmara da TV a gravar. Pior: perderam-lhe o medo à conta do qual dominou a Madeira tanto tempo. Atiram-lhe cerveja, tentam arremessar-lhe espetos de carne. Ouve protestos de patas rapadas e assobios de 'cachorros'. Ali na Câmara, diante de toda a gente, um cidadão atirou-lhe o 'Grândola' e adjectivos politicamente incorrectos.
Por isso, teve de interromper um discurso que pretendeu ser uma aula de sapiência para mostrar ao povo que ainda sabe tudo. Repetiu os lugares comuns do "terrorismo incendiário" e da necessidade de regionalizar a Justiça - alimentando ainda, pelos vistos, a esperança de ver os juízes e os procuradores de um tribunal 'à Madeira Nova' desfilarem a seu lado no carnaval.
Chamou a si o mando na Região Autónoma em que "a autarquia funchalense se insere", para subalternizar o cargo de Albuquerque perante o seu. Lá agradeceu o trabalho dos autarcas, principalmente os que saem - e referiu-se a todos. Mas sem evitar criticar os "protagonismos" de que falara durante os incêndios, outra vez referindo-se ao presidente da Câmara.  


Definição política: espetada com americano

Enveredou por caminhos para si desconhecidos, falando do cultivo da diferença nas sociedades democráticas, de pontos de vista alternativos, da legitimidade de discussões inflamadas na diversidade dos temperamentos. Estava em dia de teorização e anestesiou positivamente a assistência divagando sobre os 'calhamaços' que leu de véspera sobre definições de política - a política como arte, como ciência, como ideologia, como filosofia, como metafísica. Abordou a "escatologia marxista" e a "encarnação hegeliana", sem perder a ocasião de mostrar que leu qualquer coisa sobre a "vontade geral" numa tese de Rousseau (iluminista que, se voltasse ao mundo dos vivos, teria de arranjar outra categoria de 'vontade geral' para aplicar à vontade do homem só que nas Angústias pensa por todos).
Teorização política para mostrar conhecimentos quando a política que lhe deu tantos anos de vitórias, longe de Rousseau, Hegel e obviamente Marx, se resumiu a umas espetadas e a uns vinhos depois das inaugurações.
Que xaropada absolutamente inócua, maçadora, inútil, imprópria de um discurso político, afectada, pedante a mais não! O fantasma de um passado maçador querendo impor-se à civilização que continua em marcha.


Discurso cheio de teias de aranha

Jardim acabou a enfadonha lição com um pensamento certamente humorístico: qualquer coisa como os madeirenses continuarem a demonstrar ao mundo que só se sobrevive com dignidade no culto dos valores. 
...A menos que a inveja, a raiva, o rancor, o instinto vingativo e o espírito persecutório sejam valores, naquela cabeça.
Enfim, um discurso arrancado às teias de aranha para mostrar que o provecto dirigente político muito há-de estrebuchar até saltar de vez da cadeira.
Momentos antes, ele havia escutado uma série de provocações que noutros tempos sairiam caro ao seu autor. Foi no discurso de Albuquerque. Alguém que nos diga a quem são dirigidas farpas como as seguintes:
- Os cidadãos do Funchal rejeitam falsos messianismos ou qualquer servilismo intelectual ou político
- Defesa do pluralismo; liberdade individual e livre participação; separação entre os poderes; transparência na gestão de "res publica"; respeito e aceitação das diferenças

Evidentemente que são dirigidas ao destinatário que sabemos.
Mais:
- A Câmara do Funchal tem de continuar a manter a sua independência funcional e política... imune a pressões e influências ilegítimas
- Acabou o tempo do crédito ilimitado e torrencial, da insustentabilidade financeira das instituições públicas e privadas; da realização de investimentos insusceptíveis de gerar efeitos multiplicadores na economia real e no emprego efectivo


Governo de Jardim julgado

Estas declarações de Albuquerque tomaram a forma de análise à governação jardinista dos últimos anos - num juízo condenatório, sem dúvida nenhuma.
Tanto assim foi que o presidente da Câmara e pretendente ao lugar de Jardim na liderança do PPD-M passou a enumerar medidas que considera vitais para safar a Madeira do profundo buraco financeiro onde caiu estrondosamente. 
Ou seja, antes de Jardim se pronunciar num discurso passadista, repetitivo e desenquadrado, Miguel Albuquerque condenara os anos de governo exercido pelo seu próprio partido, de tal forma que "na realização das políticas públicas, nada voltará a ser como no passado recente".

Não se sabe até onde quer chegar este passado. Ou talvez se saiba. 
Sozinho no seu partido, sentindo a necessidade de inventar um 'núcleo duro' para mostrar uma força inexistente, quando não conta com mais do que 3 ou 4 tartufos parapolíticos capazes de fugir dentro em breve, o chefe sabe que os próprios candidatos que escolheu para concorrer às autarquias rezam para que ele não apareça na campanha. Mas, iludido, o homem quer continuar a ir a todas, tendo já anunciado no JM que em Setembro vai a festas do partido em 24 freguesias, 2 comícios e fará 23 inaugurações. 


Jantarada na quinta Leacock


Com o partido em cacos e o governo de mãos atadas, com todos os antigos companheiros contra ele, que resta hoje a Jardim? Ele conta com dois trunfos que podem ser decisivos, neste estrebuchar de moribundo: o eleitorado e os empresários.
Nada pouco.
Depois da cerimónia na Câmara do Funchal, quarta-feira, ele regressou ao Porto Santo. Dispõe lá de 2 ou 3 amigos com interesseirismo de parte a parte. É o comentário de quem diariamente vê o cortejo (hoje mini-cortejo) pelo areal.
Na quinta-feira à noite, Jardim deslocou-se à antiga quinta do Leacock, no Ribeiro Salgado, a convite do proprietário de uma das moradias aí construídas, António Henriques.* Era noite para um jantar com a presença de empresários da Madeira Nova. Por enquanto, os barões emergentes do jardineirismo ainda incluem o seu padrinho (sem segundas intenções) ao preencherem as listas de convidados para os eventos da alta.
Os Sousas também costumam organizar todos os anos, por esta altura de areal, uma festa em honra de Jardim a bordo do navio das ligações entre as ilhas (não sabemos se a tradição continua a ser cumprida). Motivos não lhes faltam para essa homenagem. No meio das insinuações públicas bem conhecidas, haverá mérito próprio dos empresários na progressão dos negócios. Mas, sem a bênção do eterno chefe que geriu milhões e milhões da Europa e de Lisboa, não se percebendo por isso como caiu a Madeira no buraco actual - sem a bênção dele, nenhum empresário conseguiria concluir, de uma assentada, um hotel de 100 milhões e um edifício como o Minas Gerais, e ao mesmo tempo candidatar-se, dentro de um consórcio, à construção e exploração do novo terminal de cruzeiros de Lisboa.
Literalmente falando, é obra! 
Diríamos 'bom proveito' não fora o facto de o chefe que propicia todo este sucesso à classe empresarial o fazer à custa de altos preços no porto, exclusividade prática na linha Madeira-Porto Santo e sequestro dos madeirenses que só gostam de viajar por mar - porque nem a Lisboa ou Canárias se podem deslocar. Até o 'Armas' zarpou de vez!
Ou seja: antigamente, não tínhamos aeroporto e só saíamos de barco. Agora é o contrário.
Jardim agarra-se 'com unhas e dentes' aos dois trunfos que, a seu ver, lhe podem dar muitos anos de vida nas Angústias. E não pode perder nenhum desses dois trunfos: precisa de mostrar ao eleitorado que os homens do dinheiro, que criam emprego, estão com ele; e precisa de mostrar aos homens do dinheiro que tem o eleitorado a dar-lhe poder para continuar a distribuir adjudicações.


Albuquerque e Jardim no Porto Santo: os empresários encalacrados


Ânsia de mandar é isso. Jardim prefere viver infeliz, com os próprios companheiros de partido contra si, sem cumprimentar ninguém, assobiado nos actos públicos e guardado por batalhões de seguranças nos poucos lugares aonde vai... prefere essa vida incómoda a passar à reserva, como faz qualquer cidadão que conheça o significado de 'saber sair'.
Consabido que é o interesseirismo da populaça, nada garante que o homem não vença as autárquicas de Setembro. Porém, ainda que ganhe por 11-0, a sua vida continuará um inferno, e ainda mais penoso do que até aqui. Não sabemos ainda o que desta crise pensa a chamada 'viloada', mas a outra meia Madeira já não o suporta a ele, chefe laranja. Tudo acabará em Dezembro de 2014. Então, sairá vergado sob o peso de uma humilhante derrota dentro do seu próprio partido.
Em busca desse objectivo, Miguel Albuquerque elabora estratégias para levar ao terreno em Janeiro, quando já estiver fora da Câmara do Funchal. O edil parte do princípio de que o seu adversário principal em Dezembro seguinte será Jardim. E prevê uma guerra sem tréguas para desalojar o mentor da Madeira Nova. 

Neste momento, Albuquerque faz o mesmo que Jardim: férias no Porto Santo. Os empresários, sempre previdentes, certamente vão rever as listas dos jantares. 

PS - Lapso relevante: este texto foi alterado para corrigir um lapso involuntário e sem intenção de ofender, mas que podia suscitar interpretações injustas. Lapso da nossa inteira responsabilidade. Dizíamos, na redacção original, que a Quinta Leacock pertence a António Henriques. Quando, conforme a correcção que com toda a oportunidade nos enviaram, na forma de comentário à peça, o conhecido empresário apenas possui uma das moradias construídas dentro da referida quinta, onde decorreu o jantar a que nos referimos.
Para total esclarecimento, convidamos o Leitor a ler o comentário abaixo.
Da nossa parte, apresentamos as nossas desculpas a António Henriques, ao Grupo Leacock e aos Leitores.

2 comentários:

Unknown disse...

Caro Luís Calisto,

Apenas uma correção: a urbanização do Ribeiro Salgado foi construída pelo grupo Leacock em terrenos da sua propriedade. Nesta urbanização foram vendidas casas geminadas já construídas, e, lotes para construção de moradias unifamiliares. O Sr. António Henriques, à semelhança de várias outras pessoas, adquiriu um lote e construiu. O dito senhor não é proprietário da "Quinta Leacock". A urbanização do Ribeiro Salgado continua a ser gerida pelo grupo Leacock, e os terrenos adjacentes continuam propriedade do referido grupo.

Luís Calisto disse...

Agradecemos a correcção ao lapso grave desta peça, o qual, reparamos agora, até podia suscitar interpretações insinuantes. Vamos corrigir o texto e assinalar a correcção.
Mais uma vez, obrigado pela preciosa informação que desfaz o nosso erro, cometido sem intenção de ofender quem quer que seja.