A FESTA DO PSD 'NÃO ME TOQUES'
RESULTARIA MAIS NA QUINTA DAS CRUZES
Miguel Albuquerque sempre se desembaraçou bem do seu papel no Chão da Lagoa. Mas motivar e levar 40 mil ao delírio não é com chàzinhos e jazz, como o antecessor Jardim sabia
A política é como a fruta, tem a sua época. Daí arriscarmos o politicamente incorrecto com um alvitre despretensioso: a Festa anual do PSD nesta era Miguel Albuquerque nada tem a ver com a Herdade das Carreiras, ou Chão da Lagoa 2, se insistirem. Estamos mais a ver o actual presidente social-democrata comemorar a fundação do Laranjal sentado à tardinha num Jardim do Museu das Cruzes ou, cedendo muito, no Parque de Santa Catarina, entre os mais graduados dos órgãos do partido vestidos com traje ligeiro, os milhares de militantes sentados em cadeiras com algum gosto e não aquelas de plástico da Brisa Maracujá, e em palco a Orquestra Clássica para acompanhar as vozes de Vânia Fernandes e de, por exemplo, Luís Represas. O 'Paz, pão, povo e liberdade' interpretado a duas vozes e uma dança estilizada do Hino da Região pelos jovens de uma concelhia qualquer. Rómulo calado a ouvir Passos prometer que não há mais impostos até às eleições e Miguel Albuquerque numa aula de sapiência sobre as correntes de ar atlânticas em tempo de Angústia. Intervenções com uns acordes de jazz em fundo no lugar daquele ta-ta-ran-ta-ran-ta-ta-ran do Vasco e seus amigos.
Honestamente: apesar da euforia e do louvável empenhamento da comunicação social em geral para encher aquilo amanhã lá em cima, duvidamos que na hora da verdade contem mais do que uns 10 mil foliões, incluindo os ressabiados e os infiltrados.
O militante laranja tem a sua idiossincrasia, redundantemente muito particular. O social-democrata de gema não está para subir ao alto como se lá fosse para ouvir a Jesus Cristo mais um sermão da montanha cheio de promessas de milagres. Já ninguém vai no milagre do lázaro ou do cego.
Até ao ano passado, o povo metia-se na camioneta com militância mas também com aquele desejo muito ilhéu de desfrutar de um dia de arraial partidário bem regado.
Perguntamos: quem vai lá para cima ver Albuquerque rodeado de Albu-queques a beber um sumo de pêra na barraquinha do Porto da Cruz, um chá na das Achadas, um carioca 'descafeinado' na da Ponta do Pargo? E quem fica lá para ouvir aquelas intervenções amanteigadas e cirurgicamente consonantes de Miguel e Passos Coelho?
A populaça só ia lá para cima quando tinha a certeza de ver aqueles manguitos em palco dirigidos à oposição, os insultos e assobiozinhos aos maricas colonialistas, as alusões às calças arriadas pelos colaboracionistas de Lisboa, os incitamentos contra jornais e jornalistas, as pragas em cima dos inimigos e traidores da sua própria terra. O que dava razão de ser à delirante jornada eram os pulos no palco principal, com toda a gente menos os directores regionais a cantar "e quem não salta não é da malta", mais o "Quem é que não acha". E eram as tarjas dos jovens liderados pelo nosso amigo Zé Pedro com ameaças de partir as trombas à facção do Rómulo - e avisando, enquanto Albuquerque discursava, que "presidente só há um, o Alberto e mais nenhum!" Era ainda o suspense da iminência permanente de zaragata entre correntes inimigas do delfinário. As denúncias contra a oposição que furtivamente no meio dos eucaliptos e pinheiros filmava os momentos mais significativos da festa - como a 20.ª aguardente emborcada pelo líder para mostrar ao exotismo continental o que é um chefe com eles no devido lugar. Isso é que era o espírito de Laranjal que mobilizava 40 mil em delírio.
Agora imaginemos o que não será amanhã. Miguel Albuquerque, já de si em período de reabilitação (as melhoras, Presidente), a deslocar-se ao aeroporto para receber o careta do Passos. Depois, uma torradita com meia de leite em local recatado. Umas bicadas entre dentes ao 'sacrista' do Portas. E depois toca a subir à serra, ena que chatice de calor, ora porra com esta poeira, cuidado com os sapatos do sr. primeiro-ministro, aliás líder nacional, afastem esses fotógrafos daqui, mas onde é que há uma sombrinha...
E o povo: ai que saudades daqueles tempos em que o Alberto João chegava cá acima dando logo sinal que tomara conta da festa, com uma saudação preliminar em palco. Aquele dedo médio espetado em direcção à capital alfacinha durante o banho de espuma. Aqueles berros com a mensagem "que se f... a Assembleia da República", nos despiques com as viloas espontâneas.
Além de pouca gente, amanhã vai ser uma seca, desculpem lá os organizadores. Têm a certeza de que Jardim terá pachorra de marcar presença numa festa para dormir? E os delfins derrotados vão dar-se à maçada que tinham em anos anteriores? Guilherme Silva estará lá outra vez com a sua camisa azul? Correia de Jesus irá? Hugo Velosa e o seu chapéu? Ventura Garcês? Gonçalo Santos? Conceição Estudante? Jardim Ramos? João Reis?
Duvidamos.
Essas personalidades, tal como o povo em geral, iria lá acima com que expectativas? Que poderiam ouvir de sensacional?
Como é que Albuquerque pode arrebatar a multidão numa intervenção que, dadas as características de cada um, será mais uma não-intervenção?
Jardim levantava o povo no planalto gabando-se da "obra feita".
Albuquerque terá de pôr em relevo a "obra desfeita".
Jardim dizia: "Nós fizemos uma marina no Lugar de Baixo!"
Albuquerque dirá: "Nós vamos desintegrar aquela coisa esquisita do Lugar de Baixo!"
Jardim: "Nós aumentámos espectacularmente o número de escolas!"
Albuquerque: "Nós vamos fechar espectacularmente o número de escolas!"
Jardim: "Nós estamos a levar as vias expresso a toda a ilha!"
Albuquerque: "Nós vamos suspender essas insensatas ligações a toda a ilha!"
E assim por diante. Se o actual presidente está mesmo disposto a mandar abaixo as 4 mil obras inauguradas no período desenvolvimentista, tem os 12 anos de governo ocupados.
Atenção que não estamos a dar razão à política do betão ou à política da picareta. Estamos a dizer que cada um tem as suas características. E as de Miguel detestam as aventuras na serra com o Johnnie Walker. Jardim ficou com o braço 'entremelado', mas confiou no Dr. Marcelino - médico do povo, da caça e das engrenagens políticas. Miguel, no caso da 'pedra no rim', confiou numa equipa de médicos teoricamente mais sensata e cirurgicamente correcta. Segundo nos contam, o Dr. João Faria Nunes apareceu a suspirar no facebook depois do susto no bloco operatório - festejando o sucesso da intervenção com gin.
Estão a ver?
São estas expectativas que temos para o Laranjal de amanhã. Pairam no ar apenas umas dúvidas sobre temas sem grande expressão. Por exemplo, tentámos saber nas Angústias se a Sissi também vai à Herdade, porém deram-nos uma explicação gaga. O designer recentemente contratado fez-nos um desenho, mas ficámos na mesma. Até que o porteiro esclareceu: eles não podem responder a isso, por razões de segurança.
Perguntámos também o porquê de não terem sido dirigidos convites à Oposição, o que seria um sinal de boa vontade em harmonia com o espírito de renovação e democratização do Establishment Azul. Foi-nos revelado que Rui Abreu chegou a abordar alguns oposicionistas, tendo desistido ao terceiro. Todos estavam a exigir tempo de antena em palco e não se contentavam com os velhos 2 minutos.
Quanto às presenças oficiais na serra, ninguém vai faltar, até para disfarçar o provável fracasso. Apenas o secretário da Agricultura estava em dúvida, porque chegaram a dá-lo como desaparecido numas veredas do oeste. Mas Humberto Vasconcelos já apanhou rede e deu sinal de vida: estava a estudar in loco como salvar uns palheiros. Aliás, um trabalho urgente. Já disseram ao governante que para a semana recebe nova carrada de adjuntos e assessores. E o Golden já está superlotado.