A "LEALDADE" SEGUNDO A BÍBLIA LARANJA
Virgílio Pereira segue o filho Bruno e apoia Jardim na corrida em curso na Rua dos Netos. Tal como noutros barões do laranjal, a "lealdade" justifica o inesperado passo. Mas há dicionários comuns com a definição precisa dessa palavra... traiçoeira.
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Virgílio Pereira cedeu ao compadre Jardim e à carreira do filho. Esperava-se outra postura no Outono de uma carreira autónoma que registou momentos empolgantes. |
No PPD-Madeira, deslealdade é falar e agir com frontalidade, se for a contragosto do chefe.
Lealdade consiste em dizer o que o chefe quer ouvir.
É o dicionário em uso naquela casa.
Mas há um mundo cá fora.
Nestes dias, por exemplo, a voz corrente na rua dá como o mais recente nome no rol dos desleais, quem diria, Bruno Pereira, até há pouco tempo herdeiro de uma certa imagem de rebeldia passada por seu pai, Virgílio Pereira.
Ou seja: chefe Jardim chama leal a Bruno por este lhe ter dado apoio na corrida eleitoral interna; o povo na rua faz-lhe cair em cima uma chuva de raios e coriscos entendendo que ele aplicou friamente uma 'facada' no presidente da Câmara.
O pai de Bruno, Virgílio Pereira, também se assumiu este sábado como apoiante da candidatura do compadre Jardim. Acreditamos que tenha cedido ao choradinho do chefe, suficientemente descarado para pedir perdão pelas patifarias que lhe infligiu nestes anos todos - em troca de apoio público agora, numa hora tão difícil para o ditador.
As explicações é que denunciam quão artificial é a posição, praticamente conjunta, de pai e filho.
Virgílio Pereira justificou a escolha de Jardim contra Miguel Albuquerque, seu antigo delfim na Câmara do Funchal, brandindo a sua lealdade ao chefe - que não fidelidade, sinalizou.
Até à última, o nosso Amigo Prof. Virgílio dá-lhe com uma no cravo, outra na ferradura, para manter o suspense: eu faço e aconteço, mas atenção que também defendo...
Ora, como o Professor sabe melhor do que nós, os clássicos consideravam "fidelidade" o cumprimento dos deveres de cada um para com o soberano; e "lealdade" o cumprimento dessa fidelidade juntando-lhe afecto pessoal.
Ou seja: segundo os gramáticos, pode haver fidelidade sem lealdade, mas não lealdade sem fidelidade.
Mas trabalhemos com a linguagem corrente.
Os barões que já se pronunciaram leais ao chefe (ou fiéis, tanto faz agora) estão a ser leais a si próprios.
Eles alegam: os apoiantes de Miguel Albuquerque são os ressabiados do partido, que não foram chamados a preencher lugares públicos, e outros que acabam mandato que não pode ser renovado.
Possivelmente. Mas os apoiantes do grande chefe são os "outros", os que conseguiram colocação bem remunerada, para si ou para os seus. Nem mais.
Se os barões fossem leais a Jardim, diziam-lhe na cara o que dizem nos almoços da má-língua
Lealdade a Jardim? Lealdade condicional. Lealdade a si próprios, aos seus interesses, isso sim.
Se fossem leais ao chefe, os barões dir-lhe-iam frontalmente o que pensam dele, hoje por hoje. Mas não são leais. Não querem ser transferidos para o grupo dos "ressabiados", onde (ainda) não há tachos para distribuir.
Se esses barões sentissem a menor sinceridade nos seus assomos "leais", repetiriam diante do chefe Jardim aquilo que dizem cá fora, cada vez mais à descarada.
E que dizem eles na rua?
Todos sabem: que o rei ficou tonto, que não ouve ninguém, que arranjou um governo para desgraçar a Madeira, que perdeu a vergonha e colocou bem da vida amigos e mais próximos, que errou quando se pôs contra o governo de Lisboa, que delira quando invoca maçonarias, trilaterais e magia negra, que está doente, que só quer saber da vida privada que faz, que está a mais e que o povo não aguenta mais a sua linguagem ordinária.
Leais são os que falam cara a cara
Se os barões fossem leais ao chefe das Angústias dir-lhe-iam frente a frente o que espalham em público e em toda a parte: que a sua vigência está fora de prazo, que já não tem espaço para sair da vida pública com um mínimo de dignidade, que hoje é ele o problema da Madeira, que devia imaginar um pretexto qualquer e desaparecer da circulação.
Mas não são leais, no dicionário normal, os que batem lealdade no peito.
Mais leais são aqueles que refutam as ideias do chefe com o rosto descoberto e não apenas nos almoços ajantarados do D. Pepe, Madeirense e Beerhouse.
Pode-se dizer que Miguel Albuquerque representa o laranjal situacionista versão 2. Que também tem uma clique na bicha para colocar no aparelho público. Que, apesar da experiência municipal, não garante um governo consistente.
Sabemos lá o que pode sair dali, ou de outro grupo qualquer?!
Agora, desleal?! Por se candidatar à vista de toda a gente, no cumprimento do que permitem os estatutos do seu partido?! Desleal por apresentar aos seus companheiros militantes um projecto político-partidário para eles estudarem e decidirem se merece voto ou não?
Do que os barões da "lealdade" não se apercebem é que Jardim está a vê-los a todos. Ora se ele sabe ler a "lealdade" que eles apregoam dedicar-lhe!
O laranjal extravasa de hipocrisia!
Há barões indignados com o que estamos a escrever aqui?
Pois assumam que não andam por aí a sugerir um chuto no traseiro do chefe!
Desafiamo-los a barafustar e a desmentir-nos.
Cá nos defenderemos apontando nomes e situações.
Cambalhotas no laranjal
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A pressão prejudicou uma carreira que deveria ter agora um rumo diferente. |
E Bruno Pereira?
Escolheu o caminho do passado, julgamos nós. E julgam quantos o acusam de 'vira-casacas'.
Como político, está no direito de optar por onde achar melhor. Convém é preparar-se para as consequências, que podem ser agradáveis, porém mais provavelmente dolorosas.
Bruno atirou fora o capital de um certo afastamento em relação ao sistema aparelhista dos Netos. Apanhou por tabela internamente, à conta da tal rebeldia do pai. Nunca foi de receber abraços do chefe Jardim, fora os encontros familiares.
Porém, e talvez por isso, o seu trabalho junto de Miguel Albuquerque, se abespinhava Jardim, valia-lhe um lugar para quando chegasse a hora da renovação do partido.
Tanto estava Bruno mal visto por Jardim que este, para tentar erradicar os resquícios de Albuquerque à face da Terra, lançou Sérgio Marques como potencial candidato à Câmara, em vez de Bruno. Albuquerque e mais vereadores laranja levantaram-se em protesto e ameaçaram com uma lista de independentes, encabeçada pelo vice desprezado.
Surpreso, chefe não teve remédio senão engolir Bruno Pereira como o "candidato natural do PSD"... à custa de novo enxovalho para Sérgio Marques.
Agudiza-se a luta intrapartidária Miguel-Jardim. Que faz Bruno? Colabora num rude golpe na candidatura de quem o defendeu, Miguel Albuquerque, seduzido pelo canto de sereia entoado nas Angústias.
Bruno será combatido pelas duas facções
Bruno deve sabê-lo, repetimos. O povo na rua já lhe reserva uma derrota quando das próximas autárquicas.
O povo da rua tem uma noção de lealdade que é diametralmente diferente da vendida pelo grande chefe.
O povo da rua nem se esquece de que Virgílio Pereira foi apelidado de incompetente por não saber gerir a Câmara do Funchal sem dinheiro, ofensa que o levou à demissão no Verão de 1994. Nem se esquece de que Jardim convocou um congresso especialmente para expulsar Virgílio da comissão política, só porque o professor classificara de garotice o miserável projecto parlamentar dos social-democratas destinado a testar o estado psíquico de um antigo líder do PS-Madeira.
Bruno Pereira perdeu-se na opinião pública e levará tempo a recuperar.
Pode muito bem contrariar estas expectativas, à custa do arcaboiço político já demonstrado.
Mas os caminhos disponíveis estão minados.
Entre os "leais" a Jardim, sedentos de cargos, será visto como um concorrente a derrubar quanto antes - e terá vida muito difícil, com permissão do próprio Jardim, uma vez servido.
Se voltar ao seio do miguelismo, teoria estapafúrdia que já ouvimos por aí, será sempre visto com desconfiança, como aquele que de um momento a outro muda de camisola.
Derrota mais do que certa nas autárquicas
Pelos contornos da situação, julgamos que Bruno Pereira perderá de facto as eleições no Funchal, dentro de um ano.
Aderiu à facção descendente do PPD e caiu no descrédito, pelo menos pelas primeiras reacções. Nunca se sabe se não encontrará pela frente uma equipa de independentes com Rubina Leal, Pedro Calado e outros nomes sonantes da área miguelista. Não se sabe. De quem não conseguirá fugir é do confronto com uma Oposição experimentada que certamente estudará forma de pela primeira vez arrebatar a Câmara do Funchal ao PPD.
A Oposição prepara-se para o estracinhar.
A começar pelo arranque da candidatura manchado pela determinação superior de que vai encabeçar uma lista escolhida... pelo chefe!
A propósito, quando seu pai Virgílio Pereira foi chamado à pressa de Bruxelas para salvar o compadre Jardim nas eleições municipais de 1993, fez questão de ser ele a escolher pelos menos os primeiros sete da lista.
Os tempos eram outros. Virgílio tinha campo de manobra, sem um filho na lista de Jardim e outro a trabalhar na Presidência, às ordens do chefe.
Já desta vez, o rei das Angústias engoliu a candidatura de Bruno mas, para torcer o pepino de pequenino, mostrou quem vai mandar na Câmara, apontando logo nomes da futura lista.
O homem julga que ganhará as eleições...
Enfim, a ver de que valerão a Bruno as "lealdades à moda PPD" em 2013, quando a Oposição lhe cair em cima.