GUARDIOLA OLÉ
Este homem já tem o seu lugar nos compêndios científicos do futebol mundial. Ele conseguiu provar, na prática, uma verdade aparentemente condenada à teoria: sem bola, o adversário não nos faz golos.
Muitos treinadores sonharam com esse estilo de jogo, o de esconder a bola ao adversário. Mas só Pep Guardila foi bem sucedido na sua aplicação. Comandar os acontecimentos através da posse de bola, eis a fórmula mágica para tantos títulos conquistados com toda a normalidade nos últimos quatro anos de Barcelona.
O ataque a começar no guarda-redes Víctor Valdés. A bola não pode ser despachada com aflição, ao pontapé para a frente, como outros fazem nas suas áreas. A bola só pode continuar nos pés de um colega. Pujol manifesta uma impaciência capaz de torpedear os arredores do estádio? Pois que se acalme, doseie os nervos e, com aquele sem-jeito indisfarçável, coloque a bola na jurisdição de um companheiro. Depois... Piqué sai a jogar, Daniel Alves é defesa e ala, o meio campo funciona como zona aduaneira obrigatória. Xavi, Iniesta, Messi, a bola gira e gira, os atacantes entram no carroussel, tabelas e mais tabelas, explorar a menor distracção do adversário, descobrir a nesga da floresta de pernas para rasgar o passe fatal... Deu canto? Um canto é meio golo? Pode ser, mas, e se não entrar? Meio golo não é posse de bola, vá lá circular a bola do quarto de círculo para trás, nada de balões para a área, vá começar de novo na zona recuada... O adversário interceptou o lance? É cair em cima à laia de matilha a disputar um osso, ninguém descansa, todos trabalham, por alto, a meia altura, de carrinho... Recuperou-se a bola, foi rápido, mais uns minutos para fazer alastrar a posse aos 70 e 80%.
Resultado: 13 títulos conquistados em 4 anos: 2 Mundiais de Clubes da Fifa, 2 Ligas dos Campeões da UEFA, 2 Supercopas Europeias, 3 Campeonatos Espanhóis, 3 Supercopas da Espanha e 1 Copa do Rei.
Contam maravilhas do San Lorenzo de Almagro, importante clube de Buenos Aires que viajou em 1947 pela Europa conseguindo, com o seu futebol vistosamente filigranado, resultados impensáveis e estonteantes, como 6-1 sobre a Espanha perante o espanto de dezenas de milhares de espectadores de Madrid, e outros inusitados 10-4 espetados na Selecção de Portugal, em jogo na capital lisboeta.
Mas a velocidade do futebol é outra hoje em dia. Não custa considerar que o Barcelona destes quatro últimos anos se consolidou como a melhor equipa de todos os tempos, ao nível mundial.
Os grandes também perdem. Depois das dores de cabeça criadas a tantos adversários - que paciência para correr atrás da rapaziada blaugrana desta era Guardiola! -, eis que, numa só semana, o Barça perde o campeonato espanhol para Ronaldo, Mourinho e companhia e salta fora da Champions às mãos dos pragmáticos ingleses do Chelsea. Ocasião para Pep dar forma à ideia que alimentava havia tempos: dar por concluído aquele período riquíssimo ao serviço do clube que o lançou como jogador e como treinador. Obviamente, Pep Guardiola poderia continuar. Talvez devesse fazê-lo. O balanço final, ao fim de seis ou sete anos, ser-lhe-ia bem favorável, a ele mas também ao clube. Porém, o criativo técnico sabe que é preciso sair na hora ideal. Ele percebeu que um génio também se cansa nas ideias. Jogos de três em três dias, como ele referiu, criar soluções, motivar o balneário, enfrentar imponderáveis... Não há super homens.
Do Barcelona sai um grande treinador e um enorme cavalheiro. Um vulto do desporto que parte pela porta maior do Camp Nou.
Chapeau, Pep.
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