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quarta-feira, 18 de abril de 2012

Cultura, Culturas

GUERRA NA HOTELARIA FAZ HOJE 35 ANOS

FUNCHAL A FERRO E FOGO


Brutal carga policial sobre os trabalhadores da Hotelaria, em 18 de Abril de 1977, ensanguentou as ruas funchalenses. (Fotos Rui Marote, in 'Achas na Autonomia')


O clima de guerra civil que durante o PREC dividia o importante Sindicato da Hotelaria, estrutura com 5 mil associados à época, propagou-se com brutalidade e sangue às ruas da capital madeirense em 18 de Abril de 1977, faz hoje 35 anos. Obra da repressão policial das mais violentas da história insular recente.
Em confronto alinharam-se, de um lado, um largo segmento de trabalhadores progressistas e, no campo adverso, apoiantes da direcção eleita presidida por Ernesto Gomes, acusado de traição à classe para facilitar as pretensões do patronato.
Na altura, a Madeira fervia de manifestações e contra-manifestações pelo Funchal fora, constantes do fenómeno separatista consubstanciado à bomba e ao incêndio em automóveis de activistas de esquerda. O mote para um ano violento, nesse 1977, foi dado logo em Janeiro, quando da visita do embaixador russo Kalinine, recebido na Pontinha por uma concentração flamista hostil. Os separatistas diziam estar em luta para evitar a vinda para cá da "matilha do KGB", disfarçada num consulado soviético com instalação supostamente prevista para o Funchal.

Os simpatizantes da Flama reuniam-se descontraidamente por aí. Na imagem, São Vicente. (in 'Achas na Autonomia')


A posterior visita do embaixador americano Frank Carlucci também não seria pacífica, numa altura em que o Funchal andava com bandeiras da Flama içadas por todo o lado; as paredes da cidade pintadas com bandeiras azul e amarelo que a esquerda borrava a vermelho; alguns hotéis recebiam a 'moeda' separatista zarco; as associações de estudantes conotadas com o movimento independentista ganhavam eleições no Liceu; os simpatizantes da independência faziam reuniões de cara descoberta fora do Funchal, por exemplo em São Vicente, com festas ao som do 'Bailinho da Madeira' e do 'Madeira és livre'; Bacanhim, Mesquita Spranger e mais operacionais da 'noite flamista' iam ao aeroporto deixar comunistas que expulsvam da ilha.
Neste ambiente, tinha-se como dado irrebatível que a PSP apoiava os independentistas e perseguia dirigentes e activistas de esquerda. Um facto. Como se viu no 18 de Abril de 1977.


Sindicato da Hotelaria: um dos travões ao fenómeno separatista


Poucos dias antes, um grupo de trabalhadores ocupou o Sindicato da Hotelaria, então na Rua das Hortas, para impedir a entrada do presidente Ernesto Gomes. O secretário do Trabalho, Bazenga Marques, intima a entregarem a chave do sindicato,os activistas ocupantes, a quem o presidente Ernesto classificara de "grupo de extremistas". Entre os ocupantes encontra-se Leonel Nunes, então líder da JS-Madeira.
Nesse dia, perante a recusa da devolução da chave, a Polícia invade a sede sindical e desaloja os contestatários. Seguindo-se então uma manifestação de cerca de mil trabalhadores frente à antiga Junta Geral, na Avenida Zarco, onde funciona já, como hoje, o governo regional.
Alguém faz constar que os manifestantes congeminam a ideia de invadir as instalações oficiais.
Pouco depois, surgem do alto da Avenida Zarco elementos de várias secções da polícia de choque, armados até aos dentes, em corrida desenfreada e carregando sem contemplações sobre todos quantos se encontram na zona do conflito, sem olhar a quem pode ser manifestante, simples curioso, transeunte apanhado na confusão ou mesmo turista pasmado com as movimentações. Os feridos multiplicam-se e a polícia, enquanto desmobiliza a concentração na Avenida Zarco, estende a 'bastonaria' pelas ruas e praças contíguas, entrando em estabelecimentos como a 'tasquinha' Vera Cruz, onde agride quem lá se refugiou para escapar às agressões ou apenas se encontra ali no papel de cliente. O sangue corre pela cidade.
No meio da refrega, com largas dezenas de feridos, a multidão destrói o 'Peugeot 403' de Ernesto Gomes, estacionado na Avenida Arriaga, diante do Turismo.
Leonel Nunes, por motivos inversos, também ficará, pouco tempo depois, sem o seu bonito 'Metropolitan' (na imagem). Foi um dos muitos carros destruídos na época pela sanha da Flama contra os madeirenses progressistas que tentavam evitar o regresso às práticas fascistas dos tempos da 'velha senhora' - combate em que muito se empenharam os bravos trabalhadores do importantíssimo segmento económico-social da hotelaria madeirense.
Depois destes 35 anos, será que os corajosos activistas daqueles tempos acham que valeu a pena? O povo madeirense merece o risco de tantos românticos da política, daqueles que sonharam com uma Região democrática?
Leonel Nunes não é de lamentos. Se o fosse, podia desfazer estas dúvidas. Ele que, depois de uma vida dedicada ao bem comum, num trabalho arriscado e sem folgas, acabou por sair do parlamento devido às opções eleitorais de um povo ingrato e mercantilista.



O 'Metropolitan' de Leonel Nunes, nesta foto estacionado junto do Hotel Reid, seria destruído num atentado flamista.



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