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quinta-feira, 30 de abril de 2015

1.º DE MAIO DE 1974


UMA TARJA E UMA FOTOGRAFIA 
PARA A HISTÓRIA DA MADEIRA




Quem foram os entusiastas da Revolução dos Cravos que no histórico 1.º de Maio de 1974 manifestaram na rua o desagrado pelo exílio no Funchal dos mais altos responsáveis da ditadura fascista, exibindo uma faixa com um sugestivo e atrevido slogan? 

"Marcelo, Tomás & C.ª fora da Madeira/Não somos caixote de lixo"- eis a mensagem que correu mundo e ficou para a História da Madeira e de Portugal.
Passados 41 anos sobre essa imponente manifestação, chega-nos este documento pela mão de um dos participantes no cortejo revolucionário desse Maio: Jorge Reis, que se tornaria uma das vozes mais conhecidas da nossa rádio.
Jorge Reis surge à direita na fotografia (de que desconhecemos o autor) segurando o esclarecedor cartaz. No outro lado, atrás de Eduardo, que segura também a faixa, é Carlos Reis a gritar os slogans da manifestação, no mesmo 'comprimento de onda' de Costa Dias, Paula Henriques, Zeca Góis e outras caras conhecidas da altura - e de hoje.
Curiosamente, alguns dos componentes deste grupo, um dos que integravam a monumental manifestação do 1.º de Maio de 1974, eram companheiros na mesma turma do curso comercial, na Escola Industrial.
Alguns iriam aderir à UEC (União de Estudantes Comunistas), organização liderada por um futuro oficial militar, Rui Nunes. O número 2 da UEC seria o próprio Jorge Reis, que no desempenho do cargo participou no I Congresso do PCP em Lisboa, com Álvaro Cunhal, no Pavilhão dos Desportos, hoje Carlos Lopes.
Quanto aos autores do célebre cartaz, os protagonistas da fotografia não se recordam. Jorge Reis conta que o seu grupo chegou ao Largo do Município, de onde partiria o desfile, e de repente havia uma faixa à sua disposição, essa do 'caixote do lixo'. 
No grupo de outra mensagem revolucionária - 'Independência das colónias e regresso dos soldados' - enfileirava Paulo Martins, activista do movimento que deu origem à célebre UPM e depois UDP, hoje Bloco de Esquerda.
Guida Vieira, que saiu no desfile sem ainda pertencer a qualquer grupo organizado, confirma aquilo que a esse respeito nos recorda Diamantino Alturas: que a manifestação nasceu de um grupo mais esclarecido, já politizado antes do 25 de Abril, que se concentrava no projecto jornalístico 'Comércio do Funchal'. 
Nos dias a seguir ao 25 de Abril, os únicos ventos que haviam chegado à Madeira da Revolução resumiam-se ao exílio de Marcello, Thomaz e ministros do antigamente no Palácio de São Lourenço. Os progressistas receavam uma possível reacção do regime deposto no Funchal. Tolentino de Nóbrega, colaborador do 'Comércio', encarregou-se de endereçar um telegrama à Junta de Salvação Nacional, dando conta do impasse na Madeira. Entretanto, a redacção do CF e vários colaboradores empenharam-se em consumar no Funchal uma megamanifestação como as que se anunciavam para o País inteiro.
A ala moderada do grupo, segundo evoca Guida Vieira com base em informações posteriores de Paulo Martins, organizou a manifestação e tratou das faixas com as palavras de ordem. A ala que já esboçava um activismo mais radical - o próprio Paulo Martins, Luís Teives e Liberato Fernandes (hoje nos Açores) fizeram coro com a mensagem contra a Guerra Colonial.
Uns laivos de divergências quase imperceptíveis na altura mas que se acentuariam irremediavelmente com o passar do tempo. 
Quanto ao cartaz que não queria ver a Madeira servir de 'caixote do lixo' aos fascistas derrotados, acabou nas mãos do grupo de manifestantes que vemos no registo fotográfico a passar na Rua do Bettencourt, à frente do Bazar do Povo.

Mais importante do que saber com precisão de onde partiram as mensagens foi a oportunidade para dar asas aos sonhos de liberdade reprimidos desde sempre. Como recorda Jorge Reis, "aquilo foi chegar ao local da manifestação, pegar na tarja que nos entregaram e gritar palavras de ordem a exigir a partida imediata da Madeira do Marcello e do Thomas". Ditadores que nesse dia viveram dentro das muralhas de São Lourenço merecidas horas de terror - o tempo em que a monumental manifestação do 1.º de Maio assediou o Palácio com a reivindicação constante da original faixa. 
Os capatazes do Estado Novo não respiraram fundo uma vez passado o 1.º de Maio. Spínola teve de mandar para a Madeira, a toque de caixa, um homem da sua confiança, Carlos Azeredo, para evitar tragédia com as figuras depostas. O povo não parava de entoar o slogan do 'caixote do lixo' nas imediações do Palácio. Marcello pediu a Azeredo que o levasse daqui - para a Argélia, Marrocos, fosse para onde fosse. E o enviado de Spínola teve mesmo de se apressar, metendo pela calada da aurora os detidos no 'Pirata Azul', a fim de no Porto Santo apanharem transporte rumo a terras de Vera Cruz - mais seguras para eles do que o Funchal.  

Passaram-se 41 anos sobre a memorável jornada popular anti-fascista. E a luta continua, como se vê na propaganda para este 1.º de Maio de 2015.









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