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sábado, 25 de abril de 2015

NOVOS ARES


O PSD-M ESFORÇA-SE 
POR APRENDER ABRIL





O PSD bem tenta, o que é louvável, mas depois de tantos anos a delirar sobre 'comunas' e a cantar o 25 de Novembro, as vedetas da moderna vaga laranja precisam de muito treino para lidar com cravos. Reconheçamos, entretanto, que se está a respirar muito melhor do que no tempo das comemorações abrilistas incendiadas pelo inveterado agitador da Madeira Nova e seus obedientes jagunços



Fomos então por aí abaixo esta manhã, a horas frescas, tentar saborear o regresso do 25 de Abril anunciado com trompetas e flores. A Madeira despedira-se da democracia em 1926 e o reencontro estava marcado para hoje, depois daquela fugaz alegria em 1974.
Pela Rua 5 de Outubro abaixo, eis a sede de um partido nascido graças ao 25 de Abril e que tanto maltratou este tempo todo a imagem do acontecimento libertador há 41 anos.

...Há 41 anos, quando julgávamos que a movimentação repetia a pólvora seca do 16 de Março, um mês antes. Mas não. O 25 de Abril era a sério. Ao início da manhã, chegavam ao quartel de Tavira pelo RCP e EN notícias, marchas militares e comunicados do MFA pedindo serenidade ao povo e ordenando às forças paramilitares que se mantivessem nas unidades, a fim de se evitar derramamento de sangue. Manhã cedo, o povo enchia as ruas de Lisboa. O fascismo caíra. Os cravos pintavam lapelas, cabelos e tapa-chamas das espingardas G-3. Liberdade, liberdade.

Coisas que povoam a cabeça à descida para o 25 de Abril na cidade. Ao tentarmos guinar para a Rua Marquês do Funchal, raios, polícia e gradeamentos a impedir o avanço de carros para o lado do Colégio. Começamos, simbolicamente falando, a celebrar Abril condicionados por barreiras!


Barreiras em dia de Abril. A necessidade obriga, mas simbolicamente ficou mal.

Devem ser os da Câmara que querem silêncio e solenidade na parada do Largo do Colégio, antes da sessão nos Paços. Que ideia, uma cerimónia no município à hora prevista para o 'grito do Ipiranga' no parlamento! 
Pouco depois, saberemos que o representante do PND na sessão municipal, Baltasar Aguiar, abandona a sala precisamente por discordar dessa coincidência.
Pena que a obsessão pelo protagonismo, de alguma das partes, municipal ou parlamentar, ou das duas, impedisse o cidadão de assistir a ambas as sessões. Ubiquidade, só Santo António.

Ainda arestas de Abril. Que não se comparam com velhas histórias de comemorações da Revolução nesta original terrinha. Num dos loucos anos do PREC, o vermelho dos cravos do 25 de Abril misturou-se com o sangue de democratas que tiveram de enfrentar provocadores da FLAMA à solta. Vadios contratados por reaccionários capitalistas passeando livremente pelas ruas do Funchal, de t-shirt flamista, nas barbas da polícia e dos militares - apesar de a 'Frente de Libertação' se tratar de uma organização ilegal e clandestina.
A reacção nessa altura estava na mó de cima, estribada nas posições do PPD e do seu chefe, director do Jornal da Madeira, sujeito do regime anterior que numa página do JM elogiava o bando de bombistas e noutra acusava inquisitorialmente os signatários de um texto de apoio ao 25 de Abril, apontando-os como se fossem perigosos cadastrados. Respirava-se medo, nessa comemoração de Abril.

Apeados, descortinando um deputado além, vendo passar ali um novo governante, todos de fato impecável para brilho da cerimónia parlamentar, eis-nos no Largo da Restauração. Eduardo de Jesus passa na Placa Central, diante da secretaria que já dirige. Fala ao telemóvel. Indumentária clássica, em honra de Abril. 
Cassete atrás. 

Incidentes de antanho

Naquele 25 de Abril do PREC, os filhos dos progressistas divertem-se numa sessão de pintura ao ar livre, no Largo da Restauração. Os flamistas descem Golden abaixo com as suas camisolas brancas devidamente identificadas. Apupam. Dirigem 'manguitos' para o lado dos 'comunas'.
Indignados, activistas de esquerda de cravo ao peito decidem apresentar uma queixa ao ministro da República. O separatismo é proibido, passeia-se na cidade provocatoriamente, com distintivos da FLAMA, então urge reagir.
O nosso Land Rover azul da RDP está equipado para fazer reportagem. Alô Central, notícia para gravar, escuto! E segue a notícia: há ameaça de incidentes e um comunicado de protesto na forja.
A tensão cresce no centro do Funchal, com manifestantes e contra-manifestantes a distâncias perigosas uns dos outros.

Um Land Rover com história.

Hoje, cerca de 40 anos depois, era dia de reencontrar Abril, depois do longo sequestro. Membros do governo e alguns deputados fazem hora no requintado Café del Mar. Nestes dois anos, frequentaram mais os cafés populares logo acima na António José de Almeida, mercado mais recheado de votos. Se Albuquerque se lembrasse disso e fosse ao Apolo tomar café, como noutras situações, ouviria o orador acidental que andava dentro e fora com a chávena na mão, fazendo rir ao dizer coisas sérias.
"Isto nunca esteve tão mal! No tempo de Salazar, não tínhamos dívida! Para que é que queremos esta democracia?"
Albuquerque não ouviu, mas o seu mandatário Emanuel Rodrigues, primeiro presidente da Assembleia, sentado a uma mesa do café, como habitualmente, certamente apanhou aquelas verdades. O pregador imprevisto não matava saudades de Salazar, simplesmente desabafava o seu desencanto, projectava a tristeza de tantos desesperados. 
O nosso programa é sentir o ambiente do novo Abril, e depois seguir a cerimónia pela TV. Mas, maldição, para os lados da Assembleia não descortinamos carro de exteriores, nenhuma azáfama que dê ideia do directo.
Não é possível! Não? Mas é. 
Embora contrariados, por motivos sentimentais, temos de aprender que naquela televisão não há impossíveis. Transmite-se directos de tanta palha e depois quando as pessoas querem assistir a um acto público com o significado do de hoje... 
Fixação estranha da RTP-Madeira (leia-se direcção) andar constantemente de costas voltadas para os madeirenses que são a razão de ser do centro regional. É por isso que em matéria de empatia popular - zero.
Se não há transmissão na TV, que ao menos a rádio nos bafeje com esse serviço público - rezamos baixinho. 


Na zona do Apolo, o pregador imprevisto não dá tréguas: "Que raio de 25 de Abril é este?! Olhem bem: não se vê ninguém sorrir. Estão p'raí tristes. Num 25 de Abril! Toda a gente infeliz! Portugal é um país de velhos! Não se vêem crianças pelas ruas! Não há alegria! Coitadas das mulheres, não podem ter filhos, porque não há dinheiro para criar filhos. As mães não conseguem comprar leite para os filhos! O Passos Coelho leva tudo. Isto é um país de velhos! E vai ficar pior!" 


A RDP está no ar com a sessão parlamentar. Em directo. Na sua vez, Sílvia Vasconcelos não se esquece do tema: "As mulheres continuam a usufruir de salários discrepantes relativamente aos salários dos homens." Como o homenzinho do povo, a deputada do PCP releva devidamente que "as mulheres continuam a padecer de humilhações de género e retracção de direitos laborais que, inclusive, condicionam a sua livre opção e pleno usufruto à maternidade".
Na sua intervenção, Sílvia Vasconcelos enuncia a situação dramática transversal a vários planos da vida regional: o desemprego, a emigração forçada, a pobreza. Temas comuns a todos os discursos dos diversos oradores da manhã. "Não foi para isto que se fez Abril", diz a deputada, para citar a letra da conhecida canção: "Só há liberdade a sério quando houver a paz, o pão, educação, saúde, habitação..."

Liberdade a sério! Em termos formais, respiramos neste 25 de Abril ares salutares. A presença do governo regional no parlamento, ficando a escutar críticas e avisos com placidez, sem chamar nomes aos oposicionistas, é um bom prenúncio. Insistimos: a democracia não é apenas o sorriso de que falava o homenzinho no Apolo. Mas há razões para saudarmos a mudança de estilo. Carlos Pereira discursa: "Não nos esquecemos do que passámos neste parlamento, mas também fora dele." 
Fora do parlamento, num ambiente político perverso e antagónico à verdade democrática - precisa o líder parlamentar e futuro presidente do PS-M se não houver surpresas. Não se apagam sem mais nem menos  "os longos anos de ofensas, de humilhações, de insultos, de gritaria." E de violência verbal, conclui a ideia.



Comemorações para acabar mal

A bordo do jipe azul da RDP, a equipa de reportagem constata que aquele 25 de Abril acabará mal. Os grupos de apoiantes e de adversários da democracia abrilista movimentam-se pela Avenida do Mar, sob vigilância de agentes que vigiam mais os democratas de cravo ao peito do que os flamistas provocadores. Vemos o arranque da carga policial. Quando os abrilistas tentam empurrar a mole de separatistas para o leste da Avenida. Os cassetetes caem-lhes em cima, violentamente. Uma professora conhecida apanha do agente caceteiro enquanto chora raiva dirigindo-se ao agressor: "Estamos no 25 de Abril, eles andam com as camisolas da FLAMA e vocês permitem isso, voltam-se contra nós."
Mas não há tempo a perder. Para os agentes, ou bem dialogar ou bem desancar nos democratas.
Perdido no meio da multidão, vemos um homenzinho com o seu fatinho e o cravo, mais o lenço apertado contra a testa de onde escorre um fio de sangue. Com a rapidez possível, o homem está dentro do Land Rover azul. Entregue nas urgências, ouvimos a enfermeira, de olho no cravo à lapela do ferido: "Vá andando nessas 'comunices' de Abril até aprender."
Torna-se difícil voltar com o jipe transmissor à Avenida, pelo que, seguindo uma informação, subimos pela Conde Carvalhal até à zona das bandeiras pintadas na parede. É verdade: lá estão dezenas e dezenas de jovens com camisola da FLAMA que assumem a guarda à bandeira azul-amarela, pintada de fresco no muro da então Escola Hoteleira. "Somos sim senhor da FLAMA, vamos tornar a Madeira independente e pôr os comunas todos do mar para lá. Diga os nossos nomes bem explicados."
Ainda ouvimos: "Digam lá em baixo para eles virem agora aqui borrar a bandeira!"
Ficou gravado, toca a zarpar para o centro dos acontecimentos. De caminho, o aviso ao 27 da Rua dos Netos: "Alô Central, móvel 2 chama. Entrevista gravada com jovens separatistas, na Americana, dá para meter nos noticiários de cá e de Lisboa às treze."


Expulsar 'comunas'

Expulsar os 'comunas' da Madeira para fora era mote das intervenções do PPD, nessa altura. Entendendo-se como 'comuna' qualquer simpatizante do 25 de Abril - esse sentimento tão maltratado ano após ano pela maioria instalada no poder regional. Como recordou hoje Dionísio Andrade na intervenção parlamentar, houve um tempo em que aos deputados que queriam celebrar a data de Abril era cortada a luz - e de facto ouvimo-los cantar o Grândola às escuras, na casa da democracia, num qualquer 25 de Abril. José Manuel Coelho recordou, também na sessão de hoje, outro episódio, o de um deputado laranja que não gostou de ver um cravo na tribuna onde ia usar da palavra e resolveu atirar o pobre cravo ao chão. 
Abril nada pôde contra o Laranjal ultramontano que o chefe montou nas ilhas.
Ouvimos pela rádio vários intervenientes considerar que só de há 10 anos para cá o 25 de Abril foi varrido do parlamento, na medida em que as sessões desde então realizadas não admitiam discursos dos partidos lá representados.



Discordamos: o 25 de Abril nunca recebeu homenagem condigna por parte da sede da Autonomia, a não ser pontualmente por tacticismo cínico do líder agora deposto, por objectivos eleitorais. Nunca houve celebração de Abril sem que se dissesse o piorio do espírito abrilista, em contraponto com as virtudes do 25 de Novembro. Era celebrá-lo a 26, a 27... Vergonhosos preconceitos, vestígios do regime salazarista.

Diabruras do PREC

Apoiamos José Manuel Rodrigues quando, como fez hoje, põe em evidência que "foram precisos uns longos 40 anos para chegar a este dia em que o parlamento da Madeira assinala de forma solene e digna o momento histórico do 25 de Abril". Afinal, como também faz notar o líder do PP, a democracia e a autonomia são "conquistas maiores do 25 de Abril".
Não podemos, porém, deixar de pôr em causa o que vemos como certo exagero na intervenção de Rodrigues, na sua abordagem aos defeitos do processo revolucionário. "O que hoje, como ontem, rejeitamos é a revolução que pretendia transformar Portugal num país marxista-leninista", discursou esta manhã. Elogiando depois o 25 de Novembro que, a seu ver, recolocou o processo político no seu caminho original.
O mesmo discurso que o anterior chefe da Madeira sempre utilizou para condicionar eleitores. "Pelo meio, forças extremistas tudo tentaram para implantar uma ditadura comunista", assusta-nos José Manuel Rodrigues. Assusta-nos? Ditadura, mas de direita, foi o que o povo madeirense permitiu imperar ao longo destes anos. Não achamos mesmo nada que o totalitarismo marxista de que fala Rodrigues tivesse constituído ameaça para Portugal e a Madeira.

"Tempos porcos e maus"

"Tempos porcos e maus" - eis como Adolfo Brazão, por sua vez, classifica a época da ameaça comunista referida por Rodrigues. 
O deputado social-democrata que falou de Abril nesta sessão ilustrou com uma experiência pessoal os "tempos feios" de 1975. Contou que, deambulando pela Avenida da Liberdade, se deparou com "um bárbaro e incompreensível ataque ao consulado espanhol, onde ignorantes personagens, inimigos da cultura e da educação e do civismo, atiravam janela fora quadros, mobílias, obras de arte." Na opinião de Adolfo Brazão, "independentemente da causa, foi absolutamente bárbaro".

Não será bem assim. Que a violência é condenável, de acordo. Só que há sempre um contexto a considerar. Também assistimos ao vivo à jornada de vandalismo, na sede do consulado espanhol. O Marítimo jogava esse fim-de-semana nos arredores da capital, por coincidência. Também deambulávamos pela Avenida da Liberdade, com dois ou três colegas de equipa, quando nos deparámos com a cena. Ficámos umas duas horas à frente da Rua do Salitre, onde se situavam a chancelaria e o consulado de Espanha. Curiosos a ver o cenário que Adolfo descreve correctamente. 
Que conjuntura provocou tal acção destruidora? Nada menos do que o fuzilamento em Espanha de 5 activistas anti-franquistas. O ditador Franco agonizava, prejudicado pelos ventos democráticos que chegavam de Portugal. Então, valiam todas as atrocidades para o caudilho espanhol continuar agarrado à cadeira do poder. Mesmo fuzilar revolucionários, a pretexto de eles terem assassinado polícias e cometido crimes afins.
Como se sabe, pouco depois a ditadura em Espanha também caía. 
É por isto que o "independentemente da causa" é muito relativo.
Adolfo Brazão - que, note-se, na sua intervenção não regateou elogios à aurora libertadora nacional -, recordou os seus medos vividos dentro do PREC lisboeta. Tinha de recolher-se, evitar circular, com receio de ser considerado anti-revolucionário.
O receio cá na Madeira não era de ser anti-revolucionário. Era de ser acusado de simpatizante de Abril.

Vamos tentar acabar a manhã de reportagem no célebre Land Rover azul  da RDP, que revimos bem nítido hoje, assediado pela multidão, na esquina do Golden. 

Viatura parada. Na divisão de trás, tudo pronto para o representante dos progressistas do Largo da Restauração - um futuro jornalista da rádio e da TV - gravar o protesto contra as actividades descaradas da FLAMA, comunicado que seria devidamente entregue ao ministro da República.
Em meio da gravação, interrompem da Rua dos Netos. "Alô móvel 2, Central chama. Regressem imediatamente, porque nada disso vai para o ar."
O magote que acompanhava o activista da gravação não pôde deixar de ouvir a mensagem áudio.
"Estão a ver? Estes também são da FLAMA!"

Conseguimos arrancar do local ilesos. Mas sem condições para explicar aos progressistas que de certeza os chefes da Rua dos Netos se referiam às declarações da FLAMA, na Estrada Conde Carvalhal.


O presidente não discursou 

Com o passar dos anos, as formas de apoiar ou condenar Abril perderam o radicalismo de outrora. Hoje, na sessão comemorativa, cristãos-novos da Revolução expressaram-se livremente aos média. Em matéria de estilo e comportamento, a situação regional mudou. Mas a verdade é que os barões do Laranjal, talvez porque passaram décadas obrigados a mostrar ao chefe uma postura de troglodita em matéria democrática, nunca tiveram o menor jeito para lidar com cravos. É tudo muito artificial. Ainda hoje, o presidente da Assembleia Legislativa, postura que não nos lembramos de ter visto em nenhum dos seus antecessores, dirigiu uma sessão comemorativa sem fazer ele próprio o seu discurso.
Os deputados representam o seu partido e os eleitores - e por eles usaram da palavra. E quem deve representar a instituição parlamento? 

Para todos os efeitos, o Parlamento-instituição não disse o que pensa do 25 de Abril nem se explicou sobre a serôdia adesão da casa da autonomia e da democracia ao Dia da Liberdade.
Persistem pegajosos resquícios da noite negra que sucedeu à negra noite do salazarismo. Complexos, receios.
Como dizia numa pastelaria da Elias Garcia, já depois das comemorações no parlamento, o antigo alferes Freitas, que marchou de Santarém com Salgueiro Maia, naquele tempo a gente tinha-os no sítio.

5 comentários:

Coelho Gaulês disse...

O povo é quem mais ordena!

Anónimo disse...

Para o Cafofo existe dois tipos de democracia , aquela que ele revindica quando são os outros a mandar e aquela que ele exerce quando manda. faz lembrar o Salazar que no fundo no fundo tambem se considerava democrata

Carlos Martins disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Anónimo disse...

A TV o que não esquece nunca é de colocar o patrocinador a comentar... Há que não esquecer a ajudinha de outrora...

Anónimo disse...

Caro Luís Calisto,

Daria um óptimo trabalho de (alguma,pouca) investigação, verificar onde andam os jovens flamistas e comunas nos dias de hoje. Penso que alguns andam aos abraços nas mesmas agremiações. O passado, fica na coerência dos ...erros de juventude !