NOVO GOVERNO

POLVOROSA CRESCENTE

Miguel Albuquerque leva hoje à comissão política regional decisões e nomes que os membros daquele órgão estão fartos de conhecer pelos jornais. O ambiente está ao rubro, em termos das novas chefias no parlamento, mas também no âmbito da constituição do governo, tarefa partilhada com altos e baixos por Albuquerque, Rui Abreu e determinados sectores da comunicação social.   

O 'GATO' DA ECONOMIA

Depois de este pelouro ser atribuído à tutela de Rui Gonçalves/João Machado, a solução encontrada para o litígio que se seguiu, propondo divisão de sub-áreas económicas por alguns secretários, não chegou a consumar-se. A famigerada Economia, graças à parte da comunicação social que trabalha incansavelmente para apagar fogos no meio dos novos titulares, tentando encaminhar os pelouros para os lugares que entende convenientes - a famigerada Economia acaba por ficar com Eduardo Jesus, a quem estavam destinados Turismo, Transportes e Cultura.

Mas tal decisão caiu mal em sectores laranja e até entre figuras gradas da oposição que se diziam disponíveis para democraticamente deixar este governo mostrar o que vale.  

"Como é que a Economia fica entregue a um empresário que sempre teve como função principal vender serviços às empresas e fazer projectos com apoios do IDE?", pergunta com alguma exaltação um expert na matéria. "A ECAM deve ser a empresa campeã de candidaturas apresentadas ao IDE, que é tutelado precisamente pela área governamental da Economia."

Como se sabe, a empresa de Eduardo Jesus é a ECAM - Empresa de Consultoria e Assessoria Empresarial da Madeira, também parceira em realizações aparatosas com conhecidas organizações a operar na Região. 

"O secretário da Economia vai fechar a sua empresa ou estará no cargo enquanto alguém da sua confiança continua no mercado?", espeta por seu lado um social-democrata notável. "Até aqui, isso era notícia em todo o lado. Agora não se fala de incompatibilidades? Vendo bem, não é preciso chover no molhado, porque as incompatibilidades são óbvias."

Um deputado a entrar em funções no próximo parlamento desabafa: "Nunca julguei que as coisas se precipitassem desta maneira no PSD e no governo. A trapalhada de Santana Lopes começou no acto de posse. Estes aqui começam muito antes. Dá a ideia de que o Miguel e o Rui Abreu arranjaram uns nomes e agora procuram uma orgânica onde os meter. E veja-se este desvio: Miguel Albuquerque disse que o governo ia todo na lista da ALM para não haver dúvidas. Rui Gonçalves e Humberto Vasconcelos em que lista foram, que não dei por eles?"

A 'MULHER DE CÉSAR' E AS FINANÇAS

A solução da Economia configura um daqueles casos perversos para quem faz carreira pública e que fazem lembrar o drama da mulher de César, que além de séria devia parecer sê-lo. Exactamente a mesma situação que sentimos nos protestos que nos têm feito chegar pelo facto de Andreia Jardim transitar da Vice-Presidência do actual governo para a chefia de gabinete de Rui Gonçalves, futuro secretário das Finanças. 

Sabemos que a escolha partiu exclusivamente do novo governante, na sequência do entendimento entre ambos os quadros na gestão cessante. Mas é de dentro do próprio PSD que, sem estar em causa a competência do quadro seleccionado para o cargo, sai uma crítica muito prática. "Por mais honra e qualidades postas no desempenho do serviço, nunca se livrarão de uma suspeita em matéria de procedimentos", observa o social-democrata. "Será como se o presidente que sai ao fim de 40 anos continuasse com um periscópio ligado dentro da área nevrálgica do governo, tomando conhecimento, ao minuto, da vida financeira do governo e da Madeira."

Há social-democratas que têm atrás da orelha esta pulga: Rui Gonçalves é secretário regional por imposição do primeiro-ministro e da ministra das Finanças, que 'aconselharam' Miguel Albuquerque a não se meter em aventuras na área das Finanças. Não é de descartar essa pressão. Corre nos meios financeiros que Maria Luís Albuquerque tem grande consideração pela competência de Rui Gonçalves, a ponto de ter tentado levá-lo para trabalhar no seu Ministério.  

Outro elemento do PSD, acabado de chegar à elite, alerta-nos para o caso da Secretaria de Rubina Leal. "Que renovação é esta, de meter em chefe de gabinete da secretária Rubina a dra Cecília Viveiros, que já pertencia ao viciado gabinete de Jardim Ramos?"

Há quem pense que a renovação devia passar pelos lugares secundários. A nova gerência executiva entende que não.

LÍLIA BERNARDES DECLINA CONVITE

A propósito, sabemos que a jornalista Lília Bernardes recebeu convite para coordenar o gabinete de imprensa do governo regional. Mas a antiga correspondente do DN-Lisboa e actual colaboradora do Público deu resposta negativa.

Já Marco Cabral, segundo apurámos, continua nos quadros do governo. Da assessoria de comunicação social da Vice-Presidência, passa a colaborar ao nível das mesmas funções com os novos secretários Sérgio Marques e Eduardo Jesus.

PERSISTE O 'NÓ CEGO' CHAMADO LIDERANÇA PARLAMENTAR

Enquanto a vida do governo anda em loucos solavancos, "ao sabor de interesses internos e externos" (há quem já dê razão a Jardim, para quem qualquer governo de Albuquerque seria entregar o poder aos ingleses), enquanto isso, as ondas parlamentares continuam ameaçando naufrágio, no que toca ao PSD.

Mantém-se o silêncio oficial à volta de quem será o líder parlamentar. As vagas contrárias à liderança da Rua dos Netos rejeitam a escolha de Jaime Filipe Ramos. Ainda que de momento se trate do mais capaz para o cargo, ninguém aceita essa decisão, defendendo a necessidade de um período de nojo na carreira do deputado, para que se esbatam os rumores sobre lobbies económicos misturados com a vida parlamentar.

Mais: caso seja líder parlamentar, Jaime Filipe entrará por inerência na comissão política regional. "Lá estamos nós numa renovação à moda de Albuquerque e Rui Abreu!", briga um dos baluartes do partido, a que se juntam mais vozes agastadas de futuros deputados. Curiosamente, desde os mais velhos aos mais novos... passando por amigos pessoais de Albuquerque que julgávamos incondicionais. Mas não são. Acham que há perigos no ar e não pactuam com a situação.

O caso de Miguel de Sousa, citado como futuro vice da ALM, também dá que falar. Anti-renovação, eis os comentários.

"Isto está tudo muito confuso", diz-nos um nome conhecido e respeitado no Laranjal. "Lá em cima (nas cúpulas), passam para os jornais uma história falsa sobre a desistência de Pedro Calado, que nada tem a ver com dinheiro, deixem-se de nos chamar tontos. Por outro lado, não se percebe quem é que manda no partido. Pelo que vejo, quando o Miguel estiver fora, quem vai mandar nos secretários é o Rui Abreu."

O assunto é outra vez o governo. Sérgio Marques com áreas sob tutela que vão das obras públicas aos assuntos parlamentares e à comunicação social. Ninguém vê qualquer coesão nesse amontoado. Mas uma das tarefas de Sérgio será resolver o caso do JM, varrendo-o da tutela do governo, enquanto reencaminha, como não podia deixar de ser, a publicidade e os pedidos de assinaturas para o DN - que Jardim cortou há muito tempo, unilateralmente.

Veremos se a comissão política do pós-jardinismo será a continuidade das anteriores, que se sentavam para dizer 'sim senhor' ao líder - ou se a contestação partidária que se generaliza se reflectirá na reunião que começa esta tarde às 6.

Às tantas, quem sabe, aquilo é só fumaça e afinal o governo de Albuquerque ganha mesmo "contornos definitivos" a partir de "ajustamentos internos", como desdramatiza o DN de hoje.