TEMOS TRAPALHADA
A nova liderança do PS-Madeira recua no caso das listas próprias que Carlos Pereira prometeu no encerramento do congresso, ao princípio da tarde, em referência às autárquicas de 2017. Parece-nos óbvio que Paulo Cafôfo não gostou dessa abordagem, quando ainda tem pela frente dois anos para governar o Funchal. Um comunicado divulgado há pouco é do mais desconcertante possível.
Ouvimos a parte do discurso de encerramento do congresso, hoje, em que o novo líder Carlos Pereira garantia que o Partido Socialista concorreria às autárquicas de 2017 com listas próprias em todos os concelhos. Propósito que arrancou aplausos aos congressistas e mereceu destaque por parte da comunicação social que seguia os trabalhos. Era a ruptura com a política das autárquicas de 2013, da responsabilidade de Victor Freitas.
Eis senão quando, horas depois, nos chega um 'Comunicado' assinado por Jaime Leandro, que era secretário-geral do PS com Victor Freitas, mas também assinado por Amândio Silva, do 'Departamento de Comunicação do PS-Madeira', com umas quantas 'clarificações' às ideias ditas pelo líder que nos deixam perplexos.
"Face às declarações do Presidente do PS-M, Carlos Pereira, proferidas hoje na sessão se encerramento do XVII Congresso Regional, em que foi afirmado que o PS-M concorrerá em listas próprias em todos os concelhos da Região, impõe-se clarificar que:"
E o comunicado 'clarifica' de maneira que não nos parece 'clarificar' o que quer que seja, pelo contrário.
Vamos transcrever tudo direito como vem no comunicado, para não dizerem que a trapalhada é nossa. Eis as clarificações:
"1 - O PS-M não voltará a abdicar do seu espaço político, como fez nas ultimas eleições autárquicas relativamente aos municípios de Santa Cruz e de São Vicente, abrindo espaço a outras forças partidárias, de resto como foi também afirmado no mesmo contexto;
2 - As mencionadas afirmações não podem ser entendidas como tendo sido aplicadas ao caso específico do Município do Funchal, que como se sabe é governado por uma Coligação que integra também o Partido Socialista;
3 - Igualmente, não se pode inferir que não serão consideradas outras coligações, sempre que estejam em causa os legítimos interesses das populações e os do Partido Socialista;
4 - A estrutura concelhia do PS-M e os seus autarcas, do Funchal, conhecem o pensamento do Presidente do Partido Socialista sobre esta matéria a qual não foi alterada pelo que foi dito."
É lógico admitir que Paulo Cafôfo, presente no encerramento, se sentisse desconfortável ao ouvir a intervenção do líder PS dizendo que, da próxima, haverá listas do PS 'sozinho' em todos os concelhos. Afinal, o Funchal integra "todos os concelhos". E pode deduzir-se das palavras de Carlos Pereira que o mandato da coligação 'Mudança' na capital, com o PS lá dentro, não estaria a resultar, daí ser preciso concorrer sozinho. Natural o desconforto de Cafôfo, se é que foi assim.
Mas este comunicado só vem complicar mais a situação criada. Avança que o discurso de Carlos Pereira se dirigia a S. Vicente e a Santa Cruz. Muito bem. Mas isso não resolve o melindre funchalense.
"As mencionadas afirmações não podem ser entendidas como tendo sido aplicadas ao caso específico do Município do Funchal", diz a nota socialista. Não podem? Ora essa! Então o Funchal não é um dos "todos os concelhos da Região" onde o PS, como anunciou o líder, concorrerá com listas próprias?!
"Igualmente, não se pode inferir que não serão consideradas outras coligações, sempre que estejam em causa os legítimos interesses das populações e os do Partido Socialista", 'clarifica' o ponto 3 do comunicado. Mas isso pode acontecer nos 11 concelhos! Ou nessas eleições, como nas outras, não estarão em causa, nos concelhos todos, "os legítimos interesses das populações e os do Partido Socialista"? Então, pode haver coligação em todos os 11 concelhos.
"A estrutura concelhia do PS-M e os seus autarcas, do Funchal, conhecem o pensamento do Presidente do Partido Socialista sobre esta matéria a qual não foi alterada pelo que foi dito." Sim? Então, dissesse o que dissesse, não estava a exprimir "o pensamento do Presidente do Partido Socialista sobre esta matéria"! Quer-se dizer: Carlos Pereira fez a primeira intervenção num congresso como líder dizendo coisas apenas por dizer, porque aquilo que ele pensa realmente é diferente, como Cafôfo e Miguel Iglésias, da concelhia do Funchal, bem sabem - e esse pensamento que eles conhecem não foi alterado pelo que ele disse.
Temos uma ideia do político Carlos Pereira que não se compagina com esta situação. Por isso, achamos que o novo líder do PS-M deve explicar aos madeirenses, a quem vai pedir votos daqui a pouco:
- O PS vai ou não concorrer com listas próprias em todos os concelhos da Região?
- Disse-o para arrancar palmas ao congresso e agora manda publicar um comunicado a dizer que o que disse não significa o que realmente pensa?
- Para sabermos o que realmente pensa o líder, temos de o perguntar ao presidente da Câmara e ao presidente da concelhia do Funchal, que são quem conhece o seu pensamento?
Sem nos estarmos a imiscuir na vida interna de um partido político, sentimos a obrigação de notar: Carlos Pereira, se queria arrancar o seu mandato a dizer coisas, tinha realmente de ser atrevido e criativo, anunciar novidades. Mas no caso das autárquicas parece ter ido longe demais. Deixou a 'Mudança' funchalense numa posição incómoda.
A menos que esteja mesmo decidido a concorrer com o PS sozinho em 2017 no Funchal, e então achou melhor clarificar tudo já. Mas então, para quê este comunicado?!
Ora, Carlos Pereira não quis anunciar nomes para as listas nacionais de Outubro porque, explicou no congresso, tem apenas 3 anos de partido mas sabe que não deve avançar com notícias antes de falar com os órgãos do partido. Com as autárquicas, o critério foi outro.
Repare-se: gostámos do que ouvimos da intervenção final do líder socialista. Carlos Pereira esteve comunicativo, num discurso claro e interessante, com ilustrações para toda a gente perceber as partes aborrecidas dos números, da dívida, do rectificativo. Valia a pena pegar numas partes do discurso e comentá-las. Mas agora, com estas 'clarificações' sobre as listas próprias, apenas um par de horas depois do encerramento, vamos aguardar a ver se a trapalhada fica por aqui.
E nem sequer deixamos uma pergunta com algum cabimento, que seria saber se Carlos Pereira está por dentro deste estonteante comunicado. Parece uma dúvida surreal. Mas no contexto criado...