ARTIFÍCIO NOS CÉUS DO FUNCHAL
E FOGUETÓRIO NA LEVADA DO CAVALO
Com a troca de cor no governo nacional, há na RTP-Madeira muito nervosismo e um conveniente desvio político na agulha editorial. O documento de jornalistas a denunciar as 'ameaças' dos chefes do Centro não servirá de muito
Quem não sabe vender fecha a loja. |
Os jornalistas da RTP-Madeira estão apreensivos com a expectativa de mais um ano de péssimo ambiente nos corredores do Centro Regional. Já tem cerca de meio ano um documento assinado por alguns componentes da Redacção da casa com queixas de marginalização e ameaças por parte do director de conteúdos, Miguel Cunha, documento esse enviado à vogal do Conselho da Administração com o pelouro das ilhas, Cristina Vaz Tomé, e ao presidente do Conselho Geral Independente da RTP, António Feijó. Passado este tempo, os profissionais da informação televisiva têm para si que o mau ambiente é para continuar, como ficou visto na 'chouriçada' em que, diz-se internamente, se tornou a cobertura da noite de São Silvestre. Com a agravante do comando da transmissão à base dos habituais 'gritos', dentro do Centro, que deixaram alguns operacionais em pânico.
Unilateralmente, o director de conteúdos determinou que, desta vez, fossem quadros da Informação a materializar internamente a emissão de fim-de-ano, incluindo o realizador, quando o know how para estas ocasiões reside obviamente na Produção. O comando 'histérico' da emissão desagradou a toda a gente. A contrastar com a monotonia, lá fora, do programa de directos, centrado, ninguém percebeu porquê, no 'atelier' de Nini Andrade. Com passagens aos hotéis onde os repórteres 'chamados' não faziam reportagem nenhuma, limitando-se todos a apresentar o director da unidade hoteleira para fazer a propaganda da casa.
Apesar da qualidade desta transmissão, "confrangedora e indigna de uma televisão profissional", na opinião de profissionais da casa que corroboramos plenamente, os quadros que há 6 meses se queixaram a Lisboa apoiavam a dinâmica do centro feita com programas do género, aceitando na altura que "muita da programação" podia ser considerada "mais apelativa, menos monótona e agradável para quem assiste".
O que movia os jornalistas descontentes era, então como hoje, a circunstância de a área de Informação estar a ser secundarizada e deixada cair num "declínio" cada vez mais evidente. Um flagrante contra-senso numa RTP regional quando, como assumiam os mesmos profissionais, as notícias desempenham "um papel fundamental na vida da empresa e no dia-a-dia dos cidadãos que residem na Madeira e, talvez ainda mais, nas comunidades de emigrantes".
Os jornalistas apontavam o "retrocesso impensável" que detectavam havia 3 anos, "em áreas tão sensíveis [da Redacção] como o agendamento, a edição, a coordenação e os alinhamentos dos diferentes espaços informativos".
Em matéria de agendamento, o documento referia a não existência de qualquer apoio em papel aos jornalistas, que muitas vezes chegavam ao local onde lhes diziam estar o entrevistado à espera, a determinada hora, sem que encontrassem entrevistado nenhum, porque afinal não houvera contacto prévio.
Mais grave é a situação, descrita no documento, em que o jornalista vai encontrar um entrevistado que, com perguntas previamente combinadas com a coordenação, "sabe melhor ao que vai" do que o próprio jornalista, que não recebe pistas que lhe permitam preparar o trabalho. Um caso para ser o convidado a propor os temas e as questões, deduz-se.
O Leitor não precisa de trabalhar em Jornalismo para constatar o caricato desta situação. E desta: o jornalista, quando informado devidamente, prepara uma entrevista e estabelece os contactos e o encontro com o entrevistado, sendo porém obrigado a desmarcar tudo porque entretanto houve... uma mudança de agendamento! Situação que evidentemente "descredibiliza a empresa e dá uma má imagem da casa", como se lamenta no documento a que nos referimos.
Interromper um serviço a meio para começar outro que por sua vez não chega ao fim "por falta de tempo no próprio dia" também não é situação rara, por mais ridícula que pareça. Espantando também que os jornalistas sejam obrigados a fazer várias reportagens por dia... "algumas em horários coincidentes e sem tempo para a recolha de imagens". Neste bizarro pormenor, faz-se o trivial: recurso às imagens de arquivo, com o trabalho suplementar de verificar se os locais mostrados não foram alterados ou se nas imagens aparecem pessoas entretanto falecidas, além do uso de imagens iguais em matérias diferentes.
A justificação que davam aos jornalistas na altura é que as muitas reportagens feitas se destinavam a "garantir 40 minutos de telejornal diário". Mas o que acabava por acontecer era "ficarem imensas reportagens penduradas vários dias, para não dizer semanas". As que não eram intemporais claro que seguiam para o lixo.
O critério editorial também preocupa os jornalistas. Abrir os noticiários com peças próprias, sim, como é óbvio. O que não é razoável, lastimam os profissionais, é "as aberturas de telejornais regionais serem feitas com estudos internacionais (sem enquadramento regional) e estatísticas em dias de acontecimentos mais importantes que marcam o dia".
Por cima de tudo isto, paira ainda uma discrepância enorme de noticiário para noticiário, conforme o coordenador que trata da linha orientadora. A ponto de se descobrir quem foi o coordenador a partir da forma apresentada - e do conteúdo, óbvio.
Os jornalistas também criticavam que ao domingo só houvesse notícias do dia no TJ das 9 da noite, já que às 7 entrava o 'Jornal Local', uma camada de enchidos recolhidos nos dias anteriores.
'Vox pop' - outro caso de descontentamento na casa. Ou seja, a ilação sobre um pensamento popular 'geral' a partir da recolha de escassas opiniões da rua. Conforme as conveniências, dizemos nós.
"Não se pode dizer que a maioria dos madeirenses concorda ou discorda ouvindo apenas 3 ou 4 opiniões", lê-se no documento. "Uma reportagem deste género deve ser sempre sustentada com sondagens ou dados que possam justificar os depoimentos da população e justificar a importância da notícia, caso contrário estamos a especular e não a fazer jornalismo."
Outras queixas falam da ausência de reuniões de planeamento, ou de reuniões unicamente para "transmitir decisões já tomadas".
Quanto à marginalização dos jornalistas e ao desprezo por eles, destaque para o facto de que eles partem para entrevistas sem dar qualquer parecer sobre os temas ou sobre quem entrevistar. Isto apesar de, na altura, a RTP-M ter um coordenador de desporto, uma coordenadora, um responsável pela área de Informação e um assessor de Direcção. Ninguém trocava cavaco com os operacionais.
Os autores do documento reconhecem, todavia, que os coordenadores exercem a sua missão... "esvaziados de funções". Porque Miguel Cunha, à época subdirector de conteúdos (hoje não se conhece bem a designação do seu cargo), "chama a si todas as tarefas e não dá qualquer margem para que a equipa que chefia e coordena a redacção possa trabalhar sem constrangimentos".
Resultado: perante uma dúvida qualquer, o jornalista passa por cima dos coordenadores e vai directamente com o director (?) de conteúdos, para não perder tempo a ouvir dos supostos coordenadores respostas do género: "Não fui eu que fiz a agenda", "pergunta ao Miguel".
Estes problemas chegaram a ser levantados em reunião de Redacção, porém as pessoas que tiveram "coragem de falar" perderem a vontade de os repetir, depois de "chamadas pelo subdirector para uma conversa a dois, em tom de ameaça".
Aliás, como se lê no documento, todos os dias há trabalhadores da casa maltratados, "ou porque não conseguiram terminar o trabalho a tempo ou porque não avisaram disto e daquilo..."
Os subscritores condenam a forma "pouco elegante" como quase todos os funcionários da RTP-M são tratados, nas atitudes de Miguel Cunha e "mais um ou outro membro da equipa". Comportamento grosseiro que abrange, imagine-se, os contactos com instituições externas e fontes jornalísticas - o que revela uma arrogância de quem se acha importante ignorando que a importância é só e apenas do medium aonde foram 'bater', complementamos nós.
Os autores do documento sublinham que a ameaça é o "clima predominante na Redacção", mas também nos outros sectores da empresa. "É também o medo de represálias que nos tem feito aguentar o dia-a-dia, mas estamos a chegar ao limite das nossas forças", avisa-se na queixa.
O ambiente na passagem de ano foi de molde a desfazer as esperanças num futuro mais consentâneo com uma empresa que faz televisão e onde há necessidade de bom ambiente. Notam-se algumas alterações comportamentais, é verdade, depois da mudança de governo em Lisboa. Os próprios coordenadores de Informação, ao que se diz, abandonaram a solidariedade com o homem dos conteúdos.
É tempo de se agarrar cada um ao seu lugar.
Sim, pode ter sido casual o ano de 2016 começar na RTP-M com uma entrevista de fundo a Carlos Pereira do PS. No 1.º de Janeiro, sim. Mas lá que o líder socialista tem sido presença asfixiante na pantalha da Levada do Cavalo nos últimos tempos, isso é indesmentível. Por acaso, no 1.º do ano, ao correr da entrevista no écran dos sabidos controleiros do centro regional, Carlos Pereira até chamou sábio a António Costa.
Todos uns sabichões.
Bem, é ir gravando em doce travelling, ao correr das conveniências de cada qual.
Nota - Tal como a comunicação que o então deputado do PND Dionísio Andrade fez há tempos ao Conselho Geral Independente da RTP, denunciando a promiscuidade entre o centro da Levada do Cavalo e a Porto Santo Line, o documento dos jornalistas também não resultou em nada. E agora muito menos resultará.
É que, a ver se seguram nos tachos, com os socialistas na mó de cima, vagueiam nos corredores do poder alfacinha os administradores da RTP central, liderados pelo incrível Gonçalo Reis.
5 comentários:
A RTP/Madeira é paga pelos contribuintes madeirenses, e não pode estar ao serviço dos interesses privados e particulares! Desde há muito tempo que o grupo Sousa meteu lá os seus pontas-de-lança! A RTP/M tem que ser dirigida por jornalistas íntegros, sérios, honestos, competentes, e que respeitem a deontologia profissional! O problema do jornalismo em alguns órgãos de comunicação social na Madeira é estar nas mãos de mercenários da informação e de alguns comissários empresariais e políticos!
Caro Calisto, não só o Miguel Cunha deve ser o alvo de tais acusações. Há um grupinho de chefinhos que já apanhou a "doença"; sem esquecer os funcionários dos "jeitinhos" que recebem os "bombons".
Muito há para dizer, isso é a ponta do icebergue, tem mais muito mais....
Das ameaças até ás ilegalidades laborais que acontecem. Mas a RTP-M há-de renascer das cinzas. Abraço.
Fechem a RTP-Madeira. Acreditem que nada se perderia.
... e já agora também o teu trabalho.
A nossa a minha RTP Madeira?
Cruzes credo não quero uma casa tão grande.Basta-me um T 1.
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