O
Conflito
O Conflito[i] é
algo inerente à Vida: muitas experiências e coisas são únicas e são impassíveis
de serem partilhadas. O exemplo mais comum é a Alimentação: se a presa não for
caçada o predador morre de fome. Mesmo na existência humana, muitas coisas não
são partilháveis, tais como o emprego, o cargo, o subsídio, o título de melhor,
aquele período de tempo, por mais que certas religiões tentem impor o valor da
cooperação. Dizem que outras religiões tais como o Islão mostram que o caminho
da Vida é o Combate (jihad), tal como
Heráclito:
“saber que o Combate é comum, a Justiça é o
Conflito e todos os seres surgem através do Conflito e da Necessidade"
Heráclito, frag. 80 D.K.
Para mim é claro,
sem Conflito não há Justiça; sem Oposição não há Existência[ii].
“Não penseis que vim trazer a paz à terra;
não vim trazer a paz, mas a espada. 35Porque vim separar o filho do
seu pai, a filha da sua mãe e a nora da sua sogra; 36de tal modo que
os inimigos do homem serão os seus familiares.”
Mateus X, 34 -36
Assim, a interpretação
desta passagem da Bíblia é a declaração de Jesus que vem trazer a Justiça, não
a Paz.
O conflito é o
resultado da competição entre grupos ou indivíduos sobre uma qualquer coisa. A
esmagadora maioria das vezes, essas coisas em disputa não são partilháveis ou
as utilizações dessas coisas não podem coexistir simultaneamente[iii].
Nos casos em que
poderá existir uma coexistência simultânea de utilizações, a competição poderá
degenerar numa cooperação, por via de uma negociação.
O homem
diariamente gere conflitos: decidir é escolher qual (ou quais) das opções
compatíveis ou não entre si que irão ser vividas ou feitas. Sobre o início do
conflito já falei noutro sítio.
O Decisor tem
que admitir que por vezes é preciso guerrear (i.e., impor a paz nas condições
do Decisor):
“Mas o sábio, dirão, só empreenderá guerras
justas. Como se tivesse de deplorar, caso se recorde que é homem, muito mais o
facto de ter de reconhecer a existência da guerra mesmo justa – porque, se não
fossem justas, ele não teria de as empreender e, desta forma, para o sábio,
jamais guerra alguma haveria. É, na verdade, a iniquidade da parte adversa que
impõe ao sábio que empreenda a guerra justa. Mas essa iniquidade, porque é dos
homens, ao homem tem que ser dolorosa, mesmo que dela nenhuma necessidade de
empreender a guerra nasça. Portanto, estes males tamanhos, tão horrendos, tão
cruéis, todo aquele que com dor reflete tem que confessar que são uma desgraça;
mas todo aquele que os suporta ou neles pensa sem dor na alma e continua a
julgar-se feliz, esse caiu numa desgraça muito mais profunda, porque perdeu o
próprio sentimento humano.”
Santo Agostinho Cidade de Deus
Resumindo também
o Virtuoso guerreia: suas batalhas são justas
(pois é preciso combater as injustiças).
Volto a repetir,
por vezes é preciso combater… e injustiças gerais tendem a afetar
particularmente todos os indivíduos:
"A
experiência parece ensinar que, no interesse da paz e da concórdia, é
conveniente que todo poder pertença a um só. Nenhum Estado, com efeito,
permaneceu tanto tempo sem nenhuma alteração notável como o dos turcos e, em contrapartida,
nenhuma cidade foi menos estável que as cidades populares ou democráticas, nem
onde se tenham dado tantas sedições. Mas se a paz tem de possuir o nome de
servidão, barbárie e solidão, nada há mais lamentável para o homem do que a
paz. Entre pais e filhos há certamente mais disputas e discussões mais ásperas
que entre senhores e escravos e, todavia, não é do interesse da família, nem do
seu governo, que a autoridade paterna seja um domínio e que os filhos sejam
como escravos. É, pois, a servidão, e não a paz, que requer que todo poder
esteja nas mãos de um só; tal como já dissemos, a paz não consiste na ausência
de guerra, mas na união das almas, isto é, na concórdia."
ESPINOSA: Tratado Político.
Montesquieu por
seu lado defende:
“Mas, entre as sociedades, o direito à defesa natural
leva às vezes à necessidade de atacar, quando um povo percebe que uma paz mais
prolongada colocaria outro Estado em condições de destruí-lo e que o ataque é,
neste momento, o único meio de impedir esta destruição. Segue-se daí que as
pequenas sociedades têm o direito de fazer a guerra com mais frequência do que
as maiores, porque se encontram com maior frequência no caso de temerem ser
destruídas.
O direito à guerra deriva então da necessidade e do justo
rigoroso” .
Montesquieu, espírito das leis
Eu, O Santo
[i] Conflito no sentido de disputa.
[ii] Pior, sem conflito há uma “Paz Podre” em que os indivíduos concentram-se em
“não ser quem são”. Que coisa haverá mais i-sagrada que esta?
[iii] Exemplo. Um terreno
não pode ser mantido virgem, servir para a construção de uma casa ou ser um
jardim simultaneamente, embora só interesse ser virgem de manha, ser moradia à
noite e jardim à tarde.
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