O regresso às vitórias morais

Se perder a maioria absoluta era objectivo do PSD e se perder 3 vezes consecutivas era objectivo do PS, vou ali e já venho

No tempo em que os animais falavam cá na Tabanca, isto é, quando vencia quem tinha mais votos e mais mandatos, as eleições eram lutas de partidos contra partidos e no fim ganhava o PSD jardinista.

A democracia mal despontava nos idos de 70-80 e os adversários do crescente Laranjal tentavam explicar aos seus eleitores como é que cada derrota sofrida afinal era uma vitória histórica para as suas cores.

Uns haviam ganho estrondosamente porque apenas baixaram 3 deputados e não os 5 ou 6 que os adversários agouravam. Outros ganharam as eleições porque obtiveram o seu melhor resultado de sempre, aumentando 7 décimas aos antigos 2,7% - e da próxima vez figurariam de certeza entre os membros da assembleia de freguesia. 

Não é caricatura, por mais que os Leitores mais novos se riam com este 'paleio de chacha'.

Durante muitos anos, não se encontrou um único perdedor nas milhentas eleições realizadas na Tabanca. 

Apesar do défice democrático, da comunicação social vendida ao poder, da utilização dos meios governamentais como propaganda e apesar das últimas chuvadas, havia sempre uma ponta por onde o derrotado agitar mais uma 'vitória histórica'. 

E o PSD continuava a governar alegremente nas Angústias e nas Câmaras.

Se fosse no futebol, os dirigentes políticos madeirenses eram despedidos à primeira eleição

O tempo ensinou.

As tradicionais oposições tornaram-se adultas, percebendo que precisavam de saber conviver com o sistema político de excepção instalado na Madeira para, racionalmente, combatê-lo com alguma eficácia.

Foi o tempo de reconhecer a necessidade de cada partido trabalhar a sério em vez de explicar a derrota por um prisma de falso colorido.

Dá melhores resultados. E deu.

No futebol, o treinador é monitorizado jogo após jogo. Bem pode alegar erros do árbitro, a bola que foi duas vezes à trave e o penálti falhado - que no momento certo não escapa à chicotada psicológica.

Aconteceu também na política regional, na fase adulta da Democracia e da Autonomia. Alguns líderes oposicionistas não resistiram aos maus resultados. Porque o erro era de estratégia e liderança, e não culpa do vento.

Mas voltámos ao tempo das vitórias morais.  

A política ilhoa caiu para um nível intragável. 

O cartão vermelho de e para Emanuel 

A pitada de futebol neste artigalho vem a propósito da entrada de rompante de Emanuel Câmara no ano das três eleições: assumiu-se como o único árbitro no terreno e anunciou aos 4 ventos que tinha preparado o cartão vermelho para 'arrancar a lapa da rocha', ou seja, para expulsar Albuquerque e o PSD-M do governo  para fora.

Ontem mesmo, ouvimos Emanuel, no discurso da noite eleitoral, negar que o PSD tivesse ganho as 3 eleições deste ano. Não senhor, disse ele. O PS-M foi o "grande vencedor" das europeias porque a Dra Cerdas foi eleita para o PE. E estas nacionais também foram ganhas pelo PS, que foi buscar mais um deputado, num total de 3, para S. Bento.

Albuquerque, vá lá, ganhou as regionais de há duas ou três semanas, reconheceu o chefe socialista (de direito) pela primeira vez.

Numa palavra: para Emanuel, o PSD não derrotou Costa este ano por 3-0; perdeu por 1-2.

Voltámos assim ao tempo em que se perde mesmo com mais votos nas urnas - caso do PSD nas europeias, em que esmagou o PS, e agora nas nacionais, em que teve mais votos e o mesmo número de deputados do que o rival.

Rui Barreto: eleitorado deu-lhe mais uma oportunidade para demitir-se discretamente

Pessoalmente, sinto cada vez mais dificuldades em interpretar resultados eleitorais nesta terra. Vejo os resultados, imagino uma análise, mas depois ouço reacções nas sedes dos partidos e leio títulos dos panfleteiros de serviço e caio no vazio.

Na minha forma de ver, Rui Barreto devia ter percebido ontem que o eleitorado decididamente não quer nada com o CDS que ele dirige a meias com o Zé. 

Barreto ficava muito bem na fotografia se anunciasse imitar a demissão da derrotada Cristas - e quem ficasse na Mouraria que tratasse das coligações em curso.

Mas não. O CDS, na óptica de Barreto, alcançou mais uma vitória moral, como nos tempos de Ricardo Vieira e de Zé Manel.

Mesmo a distância infinita dos dois primeiros, é o terceiro partido mais votado, viram?

Ascenção perdedor assumido foi sincero ou está manhoso?

Paulino Ascenção destoou destes comportamentos faz-de-conta. Assumiu o péssimo resultado do Bloco, a somar aos anteriores, e anunciou movimentação partidária em breve para a tomada de grandes decisões. 

Deixo porém uma nota: o actual chefe do BE já se deu um pouco a conhecer e não me admiro que dessas grandes reuniões dos órgãos ele ainda saia com posição reforçada na liderança, pese a série de cabazadas que averbou este ano.

Herlanda: uma peça revisteira na noite eleitoral

Herlanda Amado teatralizou o resultado 'mais do mesmo' alcançado pela CDU, isto é, um resultado que não ata nem desata. 

Desatou um bocadinho nas eleições regionais, mas da pior maneira: nessa noite, o eleito Edgar Silva disse que a 'vitória' de ter perdido um deputado residia no facto de o PSD ter perdido a maioria absoluta.

Brilhante! 

E disse-o de forma patética, como Herlanda fez ontem. Deverá ser um registo treinado lá para dentro das paredes de vidro. 

Herlanda não ficou atrás da Laura Alves ou da Ivone Silva nos melhores momentos das consagradas actrizes portuguesas.

E no entanto, mais uma vitória moral.

JPP mesmo de cabeça a baixo também ganha sempre

O JPP patinou, arvorou-se em terceira força da Região, daí a pouco arvorou-se em quarta força da Região, meteu os pés pelas mãos com o 3.º lugar em Santa Cruz e estatelou-se ao comprido na intervenção final da candidata derrotada Lina Pereira. 

Outra vitória moral.

Toca a organizar um retiro espiritual para pensar no futuro. 

Albuquerque tem cada saída!...

E o PSD? Se utilizarmos o velho método pré-histórico segundo o qual ganha quem tem mais votos e mais mandatos, o Laranjal soma 3 vitórias este ano. 

Mas importa meter aqui uma observação, a respeito de Miguel Albuquerque ter afirmado ontem à noite que o PSD, por ter ganho essas três vezes em 2019, alcançou os seus objectivos. 

Longe disso, meu caro Albuquerque. Não me tapes o sol com a peneira.

Perder a maioria absoluta era um objectivo para este ano?

Deixar escapar para o PS o deputado nacional até aqui pertença do Bloco era objectivo?

Não era certamente. 

O PSD ganhou três vezes, mas ficou perigosamente aquém dos seus objectivos.

O PS dá-se ao luxo de desprezar o político madeirense mais competente do momento

Então quem ganhou? O PS?

Claro que não. Olhando para a lua e não para o dedo, o PS é um grande derrotado este ano. Foi bom ter subido muito nas regionais e foi bom ter alcançado mais um deputado nacional ontem. Mas os objectivos, depois de tanto investimento financeiro em propaganda, em estados gerais, em branqueamentos e promoções nas televisões e "jornais" onde passa a vida montado, com um governo e um partido nacionais empenhadíssimos no mapa cor-de-rosa para Portugal, com um primeiro-ministro obcecado que até se exibiu na dança da chuva em Machico - com todas essas, evidentemente que os objectivos do PS-M saíram furados.

O projecto era governar e o PS só vai governar se o conluio PSD-CDS, pregado com saliva, estoirar em breve. Em segunda mão, digamos assim.

Portanto, amigo Emanuel Câmara, está na hora de puxares do cartão vermelho. 

Mostra-o com autoridade ao Rui Barreto e ao Teófilo Cunha, que averbou terceira derrota em Santana - e vê se apanhas na 'leva' o Zé Manel.

Mostra-o ao Ascenção, porque o rapaz pode estar outra vez manhoso e renascer do nada, como no caso das passagens aéreas mafiadas. 

Mostra-o ao meu conterrâneo Filipe, a ver se se estanca a hemorragia verde naqueles lados.
Mostra-o a Edgar Silva, por tentativa de escarnecer do adversário em campo. 

Mostra-o a ti próprio, porque, mesmo que argumentes com as exibições mal conseguidas do PSD e com os 60% de posse de bola do PS, a verdade nua e crua é que perdeste três jogos consecutivos e não há massa associativa que aguente. 
Não te esqueças de meter no relatório do jogo as 'sacanices' ao Carlos Pereira, no âmbito da tua conspiração aparelhada com o Victor e o Profe Mentiras: primeiro fazendo tudo para impedir a candidatura do teu antecessor, depois o isolamento do homem na campanha, e ontem a tua insistência na ideia irrealista de que a 'vitória' foi alcançada graças à tua liderança (liderança tua quando não lideras nada), para lá da indicação à Jota para ignorar o cabeça-de-lista eleito nos seus cânticos entoados durante os 'festejos'. 
Não seria mal pensado reconhecer que o Carlos Pereira, com as suas virtudes e os seus defeitos, é o quadro melhor preparado do Partido Socialista - e, sem disputa, de todo o panorama político-partidário regional. 
Todos reconhecem isso àquele socialista, menos o PS. Este 'PS'.

Quanto ao PSD, Emanuel, mostra lá um laranja carregado e com pena suspensa para o chefe deles. À menor barracada no carnaval que se segue, agora em torno da coligação tabanqueira, e apesar das 3 vitórias ao pé-coxinho, rua com Albuquerque!
Não tenhas piedade, que é bem feita. O PSD, trôpego das pernas como anda, entendeu adquirir uma uma bengala na loja dos chineses...

Para finalizar, vê se resistes à tentação de mostrar cartão ao eleitorado. Deixa-o continuar a dormir na bancada. Se acordar, és tu a sair, muito mais depressa do que esperas. Alguns saem contigo. Outros não chegam a entrar. Como o do 'efeito vitorioso' afinal virtual.