Surrealismo total

O CIRCO ANTES DE PEGAR FOGO

Um marciano que chegasse agora à Madeira e se inteirasse da situação política, julgaria estar numa situação de risco e prestes a entrar num incontornável “buraco negro” sem retorno possível. Dois exemplos:

- O putativo presidente a ser eleito para “mandar” na Assembleia Legislativa é o resumo em caricatura da perversidade do regime não apenas democrático, mas sobretudo partidocrático. Digo putativo porque a figura em causa e respetivo partido sempre se comportaram, face ao ato eleitoral de setembro último, como aquelas meninas que antigamente iam passear as suas pequenas malinhas ali para a Rotunda, noite dentro, a ver quem daria mais pelo serviço. Depois, a ditadura partidocrática leva a que as elites da nomenclatura dirigente façam o que bem lhes apetece, desde que ninguém do seu círculo restrito perca tacho e benesses, se possível ficando uma boas sobras para o círculo à volta. 

É isso que ora estamos a viver: o surrealismo político total, decorrente de uma obsessão pelo poder a todo o custo, sem ética defensável, cedendo em toda a linha a um partido menor e satisfazendo a chantagem de um tipo impante de vaidade e sem classificações para o cargo. Em suma: pessoa a quem, como dizia o Reagan, ninguém em seu juízo compraria um carro em segunda mão. E é tal figura que se propõe e vai ser votado para figura máxima da representação da Autonomia Regional. Muito triste, mesmo.

- Ao aliar-se com um partido menor, os social-democratas acabam a ceder em toda a linha, criando mais secretarias para satisfazer o parceiro, o que faz engordar a orgânica do governo desnecessariamente, acarretando todo um manancial de novas despesas. A maralha do pequeno partido, louca para abocanhar um naco qualquer, vai ir entrando pelas portas laterais e mesmo pelas dos fundos. Jobs for the boys nunca foi tão pertinente! E isto também porquê? Porque os atuais secretários regionais, ou algumas delas, ousam dizer “daqui não saio”! 

Então, claro, toca de arranjar ou inventar secretarias à la carte! E que dizer de fazerem regressar alguns figurões, quem sabe, algum até que foi corrido a meio da legislatura para agora voltar à antiga casa? É pela competência, ou porque também fez chantagem? Será que vamos voltar aos serviços para o advogado da Guarda, e aos barquinhos voadores? E naquela vergonha dos concursos do fim do ano e dos fogos de arte&ofício a retalho, ninguém vai mexer nisso? Vai continuar a ser possível “encher-se”, sempre os mesmos, mas distribuindo alguns dividendos? Muito triste mesmo, mas sobretudo mau demais: só mesmo numa parvónia insularizada no pior sentido,  sem estrutura crítica e sem jornais decentes.

Em conclusão, o marciano quer fugir daqui rapidamente, pois sabe que nada será mais como dantes e não ficará pedra sobre pedra após o descalabro: em próximas eleições, seja lá isso quando for, o partido maioritário de quarenta anos vai finalmente desaparecer do mapa. Mas pior: só vão poder queixar-se deles próprios, dos seus chefes ineptos e loucos, da sua incapacidade para elevar o nível. Afinal, gente que não sabendo estar, não ficará para a história, nem sequer para a hora que passa…

(Turista Marciano)