OBRIGADO, SR. RODRIGUES

Gil Canha

Há para aí um deplorável alvoroço por causa da candidatura do Sr. José Manuel Rodrigues a Presidente da Assembleia Legislativa Regional, inclusivamente, algumas mentes mais doentias até foram buscar a citação do velho Séneca, que, “mesmo mais alto, um anão no cimo duma montanha é sempre um anão” e outras adjetivações insultuosas e igualmente condenáveis que, por pudor e por respeito à moral cristã, não quero aqui referir nem reproduzir. Só cidadãos exageradamente aborrecidos, azedos, e cheios de tédio, é que não vêem o belo alcance da nomeação do sr. Rodrigues para o bem-estar regional e para a atividade lúdica de certos cidadãos cuja filosofia de vida, é o divertimento.

Como é de conhecimento público, faço parte dum grupo de folgazões que durante anos se divertiu “à grande e à francesa” com o dr. Jardim. Infelizmente, o homem reformou-se, e lá se foi a nossa inesgotável fonte de retoiça. 

Depois desses tempos maravilhosos, tenho a confessar que a coisa se tem degradado até o fastio, e já não há ninguém com as hilariantes e grotescas tiradas do dr. Jardim - do “povo superior”; de dar o nome dos seus secretários mais fieis a escolas; nem da engraçada “exportação de inteligência”; nem dos “chineses por aí dentro”; nem da conspiração da Trilateral e do Bush, etc… 

Aliás, o nosso amigo Baltasar, por nos ver acabrunhados e deprimidos por falta de bazófia, sempre nos incentivou a aguardar por tempos mais alegres e divertidos. 

E então dizia: - ânimo pessoal! Nem tudo está perdido! É verdade que o Cafôfo e o Iglésias são cinzentos, frios, vazios e banais, e sem réstea de sentido-de-humor, dali não tiramos nada! Mas, sempre temos o Arroz-de-Lapas e a Caldeirada para nos divertirem com as suas bacoradas e com os seus cruzeiros a Itália. Vejam, não é lindo e divertido, contemplar esta ilha entregue à mais vil ladroagem e o povo sempre alegre, com as beiças besuntadas de graxa de carne-de-espeto. Então rapazes?! Tristezas não pagam dívidas! Ânimo, porra! Ânimo que isto promete! 

E o grupo combalido, aguardava com um fervor quase religioso que aparecesse no meio do nevoeiro uma espécie de D. Sebastião da pândega que nos alimentasse a nossa eterna sofreguidão pelo riso e pela paródia. Mas essa esperança messiânica ia-se desvanecendo, situação que se agravou com as últimas eleições legislativas regionais, quando se descobriu que o novo parlamento seria uma coisa insípida, quase monocromática, cheia de gente vulgar, toda arrumadinha e séria, como se estivessem à volta dum caixão, num velório, a cheirar a vela morrenta de igreja. 

Enfim… o ambiente festivo ia-se apagando, e nem a mão da providência divina poderia salvar-nos do cataclismo iminente do aborrecimento e do fastio. No meio deste desespero existencial, o amigo Eduardo ainda nos incentivou: – Conheço bem o Albuquerque e a malta dele! Eles ainda nos podem surpreender a qualquer momento com alguma galhofa inesperada! 

Cá nada! – replicou Dionísio – depois do autocarro para o Museu das Mudas, o Brava Valley e aquela história mirabolante que ele não podia deitar o monopólio dos Sousas abaixo por causa do tribunal… que o Albuquerque nunca mais nos alegrou com nada… - e a sala voltou a mergulhar num ambiente pesado e fúnebre. 

Repentinamente, a porta abriu-se, e à nossa frente, surgiu a saltitar de alegria e a abanar a foice de apanhar erva-às-vacas, o nosso Manuel Bexiga. E ofegante disse: – Corre pela cidade que o José Manuel Rodrigues vai para Presidente da Assembleia, dizem os jornais que o cargo está garantido e que os loucos do PPD já assinaram! 

Fez-se silêncio… depois, a sala estremeceu numa algazarra indescritível, uns abraçaram-se felizes, outros rebolaram no chão com as bocarras escancaradas, agarrados à barriga numa risada infernal, e alguém gritou feliz: - liguem para o Coelho! Liguem para o Coelho! 

Depois de muitos abraços, de urras, e morras aos críticos do sr. Rodrigues, o pessoal ajoelhou-se, e de mãozinhas para o céu, todos agradeceram ao sr. Rodrigues por nos proporcionar alegre divertimento por mais quatro anos. E um dos presentes, para galhofa geral, até imitou o Albuquerque a engolir um elefante dez vezes maior do que ele, e outro, abriu a porta da casa de banho, e imitou o sr. Rodrigues a sair da viatura oficial, com o peito todo inchado, e o traseiro para fora, como aquelas negras que sofrem de esteatopigia. 

E com o sorriso de orelha-a-orelha, Baltasar sentenciou: 

- Eu não disse a vocês que o circo ia chegar mais cedo do que vocês esperavam!