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domingo, 28 de outubro de 2018



Secretaria Regional de Educação: 

Os filhos pródigos e os escravos



Nos últimos meses falou-se de um processo disciplinar alegadamente levantado ao diretor de uma escola do Curral das Freiras por questões políticas e que, segundo alguns, culminou com a fusão dessa escola com outra de Santo António.
Sobre os factos em si, poucos terão conhecimento de causa. Eu não os tenho, só sei o que li. Mas posso dizer qual a interpretação do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas pela Direção Regional de Educação, que foi exposta no ofício 2496 de 10 de outubro de 2018:

O exercício da ação disciplinar, mormente, a decisão de instaurar ou não procedimento, envolve e dota o detentor deste dum poder que, para além da observância de critérios de igualdade, comporta ainda juízos de apreciação sobre a conveniência e oportunidade no seu exercício à luz dos interesses para o serviço, juízes esses que só o próprio serviço estará em condições de apreciar e ponderar, explicitando-os e fundamentando-os.” (ipsis verbis)

Bom, Marcello Caetano – fascista  - não diria melhor[i].
Esta interpretação significa que para uma ação igual que constitui infração disciplinar, haverá uns aos quais serão levantados procedimentos disciplinares e outros que serão impunes. Deixo ao leitor a tentativa de adivinhar quem serão os beneficiados e os prejudicados com esta interpretação….
Mantenho a discordância relativa a esta interpretação pois, para além de outras normas[ii], esta viola o princípio da igualdade estabelecido na Constituição da República Portuguesa: Artigo 13.º -Princípio da igualdade:
“1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.

O caso em concreto
Um encarregado de educação, entre outras acusações, declarou que um professor recebeu presentes de alunos (que por acaso inclui os que tiveram melhores notas) à vista de toda a turma.
Segundo esse encarregado esse facto deveria ser punido à luz do Artigo 297.º -Fundamento do despedimento ou demissão por motivo disciplinar, SUBSECÇÃO III - Extinção por motivos disciplinares, da Lei 35/2014[iii]:
1 - O vínculo de emprego público pode cessar em caso de infração disciplinar que inviabilize a sua manutenção. (…)
3 - Constituem infração disciplinar que inviabiliza a manutenção do vínculo, nomeadamente, os comportamentos do trabalhador que: (…)
j) Em resultado da função que exerce, solicite ou aceite, direta ou indiretamente, dádivas, gratificações, participação em lucro ou outras vantagens patrimoniais, ainda que sem o fim de acelerar ou retardar qualquer serviço ou procedimento;”
                 
Segundo a Direção Regional de Educação[iv], “Da análise do recurso apresentado, salvo melhor opinião, não resulta a prática de factos que constituam infração disciplinar”. (ipsis verbis)
Então, para a Direção Regional de Educação aceitar “dádivas, gratificações, participação em lucro ou outras vantagens patrimoniais,” “em resultado da função que” o funcionário público “exerce”, não é infração disciplinar…
Levando ao limite esta interpretação conclui-se que: não é infração disciplinar um funcionário público ser corrompido…

Conclusão.
Estimado Leitor, se tiver que haver escolha sobre quem despedir na Secretaria Regional de Educação, irão ser despedidos os “bons soldadinhos”, ou os familiares e maçons?

Por fim deixo uma série de ditos de Marcello Caetano (escritos em 1932!!!), que a Justiça Portuguesa respeita muito e até aplica:
“... A infracção disciplinar, contrariamente ao que sucede com a infracção criminal, não está subordinada ao princípio da tipicidade, sendo certo, por isso, que os preceitos que referem factos disciplinarmente puníveis são indicativos, meras normas de orientação para servirem de padrão ao intérprete, apontando-se, todavia, logo aí a violação de deveres funcionais donde resultam as infracções de deveres profissionais, as infracções aos deveres de conduta na vida privada".
Também para Marcello Caetano, in "Do poder disciplinar" (1932), págs 79 e 80 " ...interessa ao serviço público, ao seu perfeito funcionamento, à sua completa eficácia que os agentes mantenham na vida privada uma conduta digna. Esse dever varia com a natureza do serviço e a notoriedade que a função empresta ou a própria pessoa que a exercer adquiriu. Mas o que entender por conduta da vida privada? Trata-se da vida que decorre fora do exercício das funções mas não da vida íntima do funcionário. Enquanto os factos não passam do segredo do lar não revestem o carácter de uma publicidade indecorosa, o poder disciplinar nada tem com eles. Só quando afectarem a honra e o bom nome do funcionário afectam o serviço, entram no domínio das faltas puníveis".
Estas ideias não são compatíveis com o Estado de Direito Democrático!
Queremos que as opiniões de Marcello vigorem em Portugal, ou queremos que os seus defensores ardam no Inferno? Essa é uma escolha que cada um terá que fazer, e o fará votando ou deixando de votar…
 





[i] E até escreveu algo do género.” O mesmo visa, como qualquer poder administrativo, assegurar a realização e prossecução do interesse público como fim último e primacial da Administração, sendo que tal desiderato, enquanto última instância finalista, será atingido através doutro objectivo que é o fim de defesa do prestígio dos serviços e do bom funcionamento dos mesmos (...)”
[ii] “Artigo 188.º
Cessação da comissão de serviço
1 - A sanção disciplinar de cessação da comissão de serviço é aplicável, a título principal, aos titulares de cargos dirigentes e equiparados que:
a) Não procedam disciplinarmente contra os trabalhadores seus subordinados pelas infrações de que tenham conhecimento;”
Se não proceder disciplinarmente contra os trabalhadores subordinados, tem a punição de cessação da comissão de serviço, então, é obrigatória a instauração de procedimento disciplinar quando existem fortes indícios que ocorreu uma infração disciplinar.
 Mais ainda, o artigo 194º - Obrigatoriedade de Processo disciplinar, não estipula qualquer exceção para a instauração de um procedimento disciplinar. As únicas exceções são as estabelecidas no artigo 207º, em que a palavra escrita é “deve” não é “pode”, e nada fala sobre o “interesse público da decisão”.
[iv] Acrescento que a escola que recebeu a participação disciplinar, até agora não respondeu a esse pedido de instauração.

4 comentários:

Anónimo disse...

O Estatuto do Trabalhador em Funções Públicas devia ser aquilo que o Câncio acha que deve ser.

Anónimo disse...

O Santo agora trocou de profissão, passou de Eng. do Ambiente para Advogado?
Fantástico.

Anónimo disse...

o Secretário da Educação decidiu acabar com o diretor da escola do Curral para domar todos os outros, mostrou que é ele que manda ao destruir no mais conceituado dos diretores e acabar com ele. Todos os outros tem que lhe beijar a mão pois se não o fizerem passam a poeira, pois se o impoluto diretor do curral levou sem dó nem piedade como ficarão os restantes? Turmas com mais Professores que alunos em tantas escolas, horas extraordinárias pagas ao fim de semana, horas extraordinárias pagas nas férias, empresas próprias a venderem serviços às escolas, explicações pagas dos diretores do 1º ciclo, acidentes de alunos escondidos, associações de pais que são autenticos sacos azuis dos diretores, amigos e amiguinhos com horas de lordes. Os diretores da Madeira não são Homens livres, são lacaios do poder e se deixarem de o ser...

Anónimo disse...

Muito preocupante, deste mandato retiramos fusões, perseguições e o suposto descongelamento da carreira (que foi chutado convenientemente para mandatos futuros). Foi uma oportunidade perdida.