faz pontaria ao Domingo de Ramos
Falta quase um mês para o Domingo de Ramos, que calha dia 1 de Abril, uma semana antes do Domingo de Páscoa, mas o sr. Américo resolveu acelerar a produção de palmitos que os católicos procuram na quadra que se aproxima. Na manhã de hoje, o homem, sentado num dos bancos de pedra entre a Assembleia Legislativa e a TAP, manuseava galhos de palmeiras com uma destreza inacreditável para a sua idade respeitável.
Um jeitão para filigranar palmitos que faz pasmar. |
O homem conversa sem parar de entrelaçar as folhas que vai lascando consoante a exigência do arranjo. Até formar um xadrez bem justificado, quadradinho a quadradinho. "Não estamos em condições de andar a perder tempo, temos de pensar e depois criar maneiras de ganhar a vida", diz ele, fixando os interlocutores com o seu comunicativo olhar azul.
Como vão as coisas, sr. Américo não se fica pelos palmitos dos Ramos, antes labora o ano inteiro para cobrir as vendas fracas com os dias de sorte. É que, fora da época religiosa, o produto serve para "bonitos arranjos florais sem fim". O artista espantava-se, quando o Savoy estava de pé: "Fui mesmo eu que fiz estes arranjos, há tanto tempo?!" E que arranjos, esses que se aguentaram mais de 20 anos em boas condições. O segredo é smples: mandar uma nuvem de laca para cima do palmito e ele nunca mais se degrada. Adorná-lo? Sim, com sprays de tintas coloridas daquelas que se usam em flores artificiais.
A crise afugenta potenciais clientes. A ver
se há milagre no Domingo de Ramos.
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Uma fatia boa de clientes seriam os turistas que diariamente chegam em paquetes de cruzeiro para visitar a Madeira. Seriam, mas não são. "Não posso vender isto para bordo, porque eles pensam que leva droga aqui", abana-se o sr. Américo. Sem turistas, resta o cliente madeirense, sobretudo o católico e na época dos Ramos.
Pecado a perdoar na Páscoa
O homem arranja o material de várias maneiras: oferecido, comprado... E, quando falha, é roubado, confessa ele. Ainda esta manhã, teve de utilizar dois transportes, um da Camacha às Neves, para se abastecer de ramos "na Quinta do Blandy", porque há sempre um modo de o fazer ali, mais outro transporte para a baixa do Funchal, onde montou atelier na Rua António José de Almeida, à frente dos deputados. Noutros dias, trabalha mesmo em frente à Sé e noutros ainda vai para a zona do Lido.
Palmeiras roubadas a utilizar em dia santificado? Bom, numa altura daquelas os céus perdoam pecadilhos que não fazem mal a ninguém. Mais perigoso é o fisco, se descobrir empresários do calibre do sr. Américo canicense que se desviam dos deveres estabelecidos pelas Finanças. Já chegam os outros empresários que ganham milhões sem pagar impostos e acabam sempre perdoados quando os governos simulam ganas de actuar impiedosamente.
No Savoy, antes da demolição, havia palmitos nas decorações saídos
destas mãos havia mais de 20 anos.
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