SINAIS DOS TEMPOS

NO LAR DA DEMOCRACIA

Alguns antigos barões da Madeira Nova denotaram estupefacção ontem durante o desenrolar da cerimónia de condecoração do Padre Tolentino, aliás Cardeal Tolentino Mendonça.

Desde logo, figuras como José Miguel Mendonça, Alberto João Jardim e Guilherme Silva, no meio da plateia do Salão Nobre da ALM, mostraram estranheza quando, tratando-se de uma homenagem da Região ao novo coca-bichinhos dos arquivos romanos, ouviram o coro convidado atacar com uma peças de music-hall muito Broadway em vez dos castiços Hinos de Portugal e da Madeira.

A era de Zé Presidente já mexeu com o Parlamento, perpassando pelos passos perdidos, gabinetes e sala de sessões uns odores a Fantasma da Ópera e Corcunda de Notre Dâme, ou não fosse o próprio Zé um fóssil mal recauchutado da eterna política tabanqueira.

Outro sinal de que a coisa é mesmo para mudar foi o critério do prémio endereçado a Tolentino, a Insígnia de Mérito: a aposição da medalha dá-se antes de o contemplado machiquense mostrar obra feita enquanto cardeal, já que praticamente acaba de ser nomeado pelo afoito Francisco - o Pedro latino-americano que num ápice descobriu as características e qualidades do Rato dos Papéis madeirense.

Levanta-se um problema: sendo esta a mais alta condecoração da Madeira, que prenda lhe daremos quando ele apresentar algum trabalho nas funções em que foi investido?

Um pouco de precipitação dos loucos com assento na Casa da Democracia.

Um dos 'velhas guardas' críticos de Zé Rodrigues comentou: Aquele (Zé) quer mostrar à custa do favorito do Papa Francisco que há no mundo quem chegue ao céu com menos peso político-religioso do que os 3 deputados do CDS. 

Face ao ambiente que o rodeava, prova de que a nossa aldeia se mantém fiel aos costumes dos séculos XVII e XVIII, Tolentino meteu uma 'bucha' no discurso para desabafar: "Sinto-me muito pequeno."

Momento importante da intervenção foi a confissão de sua eminência ao falar da medalha: "Tantos outros dos nossos concidadãos provavelmente a mereciam mais do que eu." 

Neste passo, os olhos da plateia convergiram para a mesa da presidência. Zé Manel Rodrigues corou. Tolentino insiste: "Não faltam iminentes valores à nossa terra nem gente que se distinga pela força do seu pensamento criador, pelo impacto da sua obra ou pelo seu exemplar espírito de serviço à comunidade." Os olhos da plateia pegaram num vaivém entre Zé Manel e um deputado da bancada socialista que não conseguimos identificar.

Os circunstantes puseram-se a fazer contas quando Tolentino enveredou pelo recado pessoal, com a história um pouco baralhada do ponto de partida de cada qual vs pontos de chegada.

Uma câmara registou esse momento, mostrando Zé Manel a consultar o tlm, a ver se havia algum sms de última hora. E Zé não levantou daí os olhos porque, de rajada, o cardeal machiquense atirou com aquele "o mais importante da vida é passar o testemunho". 

Quando a oração resvalou para os congressos partidários - todos o perceberam -, algumas alas tentaram desmontar a pista do conselho deixado para se "saber de onde é que o outro partiu ou está a partir".

O altruísta Tolentino Mendonça também meteu o bedelho, salvo seja, na questão dos cuidadores - os voluntários que querem ser pagos pelo governo voluntariamente. De facto, ninguém pode cuidar dos outros se primeiro não se cuidar de si próprio. E ninguém cuida de si próprio com rezas. As caixas do supermercado não reconhecem o terço.

Por falar em pagamentos, Pedro Calado chegou a arregalar-se quando Tolentino Mendonça se ofereceu para pagar a dívida, o que não seria espanto nenhum tendo o Vaticano experiência nos meandros financeiros. Mas o vice lembrou-se logo de que como os coveiros dos bancos ambrosianos temos cá muitos. Aliás, Tolentino fazia retórica, ao dizer que a dívida está do seu lado. É um dizer.

Os velhos barões, e alguns dos novos políticos mais perspicazes, saíram da sessão com as leituras feitas. O tempo é mesmo de as instituições públicas mandarem na religião e os religiosos como Nuno das 4 Fontes (que de ex-superior agora bate a pala ao cardeal Tolentino) tratarem das causas públicas.

Repare-se que Zé Manel Rodrigues mandou rezar missa do parto na capela da ALM, hora santificada bem regada de licores e aguardentes que depois levou o grupo da Assembleia até ao Apolo, todos aviados, às 8 e meia da manhã, com Zé, Rubina Leal e companhia a cantar 'missas do parto, oh Maria', ao compasso das palmas. 

Acho que este ano não houve bicho careta governamental que não desse missa do parto!

E enquanto os políticos rezam missas, são os operacionais católicos a tratar da vida pública. Ontem mesmo, o eixo da intervenção de Tolentino Mendonça na ALM girou em torno de recomendações actuais e minuciosas à Educação e ao Ambiente na Madeira. Jorge Carvalho e Susana Prada tomaram as suas notas, o primeiro sobre as áreas educativas mais carecidas de formação e Susana para não se esquecer das soluções ecológicas integradas que Tolentino referiu.

Já no exterior da casa de maluquinhos - nisto é que nada muda -, um dos velhos barões comentou baixinho para os velhos comparsas, ao ver um toldo e cadeiras para 250 pessoas com um écran gigante à frente e que não abrigou mais de 20 pessoas (que se sentaram a descansar das voltas na baixa). Dizia o barão: podem inventar o que quiserem para arrebanhar os fiéis, que sem espetada e vinho da freguesia não há banhos de multidão.