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terça-feira, 10 de setembro de 2019



BIOSFERA, PARA QUE TE QUERO?



Ricardo Meneses Freitas


Vou começar este texto com uma declaração inequívoca: É positivo para a Madeira ter a Reserva da Biosfera de Santana como será positivo ter a Reserva da Biosfera do Porto Santo. Fixada que está a condição para que não me acusem de ser má língua, mergulhemos um pouco sobre o que significa uma Reserva da Biosfera.
As Reservas da Biosfera da Unesco são áreas que gozam de um estatuto de proteção próprio, e de um consequente plano de ação, que prossegue três funções:
- Conservação dos ativos ambientais (paisagem, ecossistemas, espécies);

- Desenvolvimento sociocultural, económico e humano sustentável;
- Logística de suporte (monitorização, I&D e ações de educação).
Olhando para o site da Reserva da Biosfera de Santana, é fácil perceber que o mesmo não tem atividade significativa desde, sensivelmente, 2014. Para tal basta dar uma olhadela nos projetos e perceber que os mesmos já estão terminados ou deles já não se fala (salvo algum projeto que desconheça). Olhando para o Plano de Ação que granjeou o título à Reserva, na página 149, verificamos que o mesmo previa 20 cientistas nacionais envolvidos permanentemente e cerca de 60 ocasionalmente, 1 a 2 cientistas estrangeiros permanentemente e 10 a 20 ocasionalmente e cerca de 6 teses de mestrado por ano. No mesmo diapasão, o potencial para o desenvolvimento económico e humano sustentável alvitrava grandes desenvolvimentos que ninguém os vê. Olhando para a função conservação, é discutível que se tenha alcançado resultados positivos quando o problema das infestantes se alastra, a pressão humana aumentou significativamente devido ao turismo e por último, quando vemos o Governo Regional alcatroar um acesso dentro da Zona Núcleo da Reserva (a zona mais importante da Reserva).
Resumindo, a Reserva está ao “deus dará”, o plano de ação está morto e não se vislumbra indicadores de realização que meçam a evolução dos objetivos e metas estabelecidas. A unidade de gestão, a cargo da empresa municipal de Santana “Terra Cidade”, parece gozar do mesmo obscurantismo não se vislumbrando qualquer atividade recente relacionada com a Reserva da Biosfera (não tem site e o facebook da empresa não tem atividade desde 2015).
A pergunta que se impõe é: Para que raio serviu se meter nesta aventura quando corremos o risco de nos ser retirado o estatuto por incumprimento do Plano de Ação?
Com a pergunta no ar, a chocalhar o escândalo internacional que seria ver-nos retirado o estatuto, atentamos ao nosso Governo Regional a efetuar a candidatura para a nova Reserva da Biosfera do Porto Santo. Peço ao leitor que não se esqueça da frase/mote de abertura deste texto.
Todo o conceito de gestão das Reservas da Biosfera está assente num forte envolvimento da comunidade local na sua gestão, devidamente orientada pela Unidade de Gestão. Há um conceito holístico nas três funções da reserva que implicam uma estratégia de desenvolvimento sustentável muito concertada que coloque a gestão da Reserva no núcleo de todas as intervenções locais. Por isto, quando candidatamos um território a este estatuto temos de assegurar dois pilares fundamentais:
- Garantir recursos humanos e materiais para o desenvolvimento do Plano de Ação e para as ações de monitorização;
- Garantir um forte envolvimento da comunidade local no desenvolvimento das atividades e dos projetos previstos no Plano de Ação e no desenvolvimento futuro do território.
Olhando agora para os recursos financeiros e humanos que o Porto Santo tem, facilmente nos apercebemos que a Câmara Municipal não tem qualquer capacidade para prosseguir uma estratégia destas. Percebemos facilmente também que sustentabilidade é das coisas que mais faltam no Porto Santo, isto é, é um território com assimetrias semestrais brutais, passando a população residente de 5000 no Inverno para mais de 25000 no Verão, extremamente dependente do comércio externo para quase tudo e com uma crescente descaracterização sociocultural ditada por uma aposta num destino de praia, festas e bebedeiras.
Não digo que esta candidatura não possa ser profícua. Tem esse potencial! Mas, como em Santana, o Governo Regional comete o mesmo erro e não pensa na futura Reserva como uma estratégia de desenvolvimento coerente, não procura uma base de apoio alargada na população local e junto de TODAS as forças vivas dos municípios, e, olhando para Santana, não consigo deixar de reparar no desinteresse do Governo Regional no apoio à Reserva de Santana desde que a autarquia mudou de cor política (refiro-me, por exemplo, aos projetos, alguns europeus, com participação de diversas entidades sob tutela do Governo Regional que parecem ter desaparecido desde 2013). Este é, porventura, o fator mais importante nesta questão. As autarquias de Santana e Porto Santo não têm capacidade para prosseguir uma Estratégia/Plano de Ação deste calibre sem que haja um envolvimento sério da estrutura Regional. Se o Governo Regional segue a estratégia de que tanto se queixa Miguel Albuquerque, que implica extravasar os limites democráticos das instituições para impor outras soluções políticas, o melhor é parar já com a Candidatura à Reserva da Biosfera do Porto Santo e tentar salvar a cara da Reserva de Santana. É que a ser retirado o estatuto fica tanto chamuscada a imagem de Santana, como a da Madeira.
Para terminar, deixo-vos o link para um relatório de atividades da Reserva da Biosfera da Ilha do Corvo (http://base.alra.pt:82/Doc_Req/Xrequeresp532.pdf
para contextualização do escrito neste texto.

5 comentários:

Anónimo disse...

Meu caro, se não sabe do que fala, mais vale estar calado. Mas se quer um pouco de história, aqui vai. Para quem não sabe, a gestão das Reservas da Biosfera é obrigatoriamente feita a nível local, ou seja, pelos municípios. O Governo, quando muito, apoia a pretensão de um município e dá contributo técnico. Mas, para tal, a entidade de gestão local tem de pedir apoio. Quanto à Biosfera do Porto Santo, é um projeto da Câmara apoiado pelo Governo e que será gerido pelo Porto Santo, não pelo Governo. O mesmo passou-se em Santana. Se tivesse ido às sessões de esclarecimento da Reserva Porto Santo saberia. Se não sabia, passa a saber.

Quando o CDS ganhou a Câmara de Santana, fê-lo a dizer que o povo não comia Reserva da Biosfera. Assim sendo, mesmo após várias diligências do Governo para reanimar a gestão da Reserva de Santana, as mesmas caíram em saco roto. Aliás, nem o apoio nacional dado pelo Comité da UNESCO tem sido aceite pelo Presidente da Câmara. Se Santana perder o galardão (quase certo), deve-se única e exclusivamente ao seu Presidente e não ao Governo, como você afirma. Neste caso, o Governo nada pode fazer por Santana. Se quem é responsável deixou um projeto interessante e com potencial para transformar o concelho morrer por falta visão de longo prazo, de que forma é que pode o Governo ajudar?

Dito isto, da próxima direcione o seu azedume para aqule partido que de repente passou a se preocupar com o Ambiente e Alterações Climática ali no início de junho, mas que deixou morrer, no único concelho que governa, um projeto interessantíssimo e com potencial para desenvolver a costa norte.

Mas já agora, também aproveito para lhe devolver a bola, pois quis misturar propositadamente alhos com bugalhos. Fala do asfaltamento de um acesso, que deduzo que sejam as Ginjas. E você diz que está na zona núcleo, quando esta está no concelho de Santana e não no de S. Vicente, onde estão as Ginjas. Você pode enganar os incautos ou menos conhecedores destes temas, mas a mim não. E por último, digo uma coisa. Pessoalmente, não concordo com esse asfaltamento pois acho que é desnecessário e o dinheiro podia ser usado noutra coisa. No entanto, a estrada do Pico das Pedras está asfaltada, passa no meio da Laurissilva e não foi por isso que esta deixou de ser considerada Património da Humanidade ou de obter o Galardão da Reserva da Biosfera.


Ricardo Menezes disse...

Não vou estar aqui a responder mas a si faço uma excepção. Se de facto as Ginjas não passa no núcleo peço desculpa e aceito a correção. Sobre o resto, eu estive na equipa que elaborou a candidatura, liderado pela Susana Fontinha a partir da Secretaria do Ambiente.

Sobre as intervenções em zonas de núcleo, é bem explicito que deve ser preservado. Por não ter havido uma auditoria, não quer dizer que esse asfaltamento não crie problemas.

Sobre quem não está a fazer o seu trabalho e ao contrário do que diz, apenas salientei a coincidência de a inatividade ser coincidente com a mudança de cor politica. Fiz no entanto questão de colocar um "TODAS" em letras garrafais para que me fizesse entender. O que estava sub-entendido é que estes projetos não podem ficar à sombra das cores partidárias vigentes. É preciso garantir que todas as forças políticas estão de acordo para salvaguardar essas situações. Digo-lhe mais, nada impedia o complexo das instituições do governo regional de continuar as atividades de I&D e monitorização, admito que às tantas algumas o façam e não partilhem dados com a unidade de gestão.

Sobre as possíveis configurações da unidade de gestão não é como diz, nada impede de criar uma comissão onde estejam entidades regionais, figurino que foi pensado para a Reserva da Biosfera do Porto Santo. Se reparar no relatório de atividade da reserva do Corvo, cujo link coloquei, reparará que a maioria dos projetos tinham liderança nas estruturas do Governo Regional dos Açores.

Para bem da Madeira espero que as diversas entidades se entendam e coloquem as guerrinhas de parte. Aprendam a viver em democracia. Aprendam que em política não há inimigos, há adversários. Aprendam que há interesses superiores da população que se sobrepoem aos joguinhos de poder.

Anónimo disse...

Um projecto com tanto cientista, só permanentes eram 20, e tanta tese de mestrado não foi demasiado ambicioso? Não terá havido falta de visão? Potencial para desenvolver a costa norte,porquê?
Santana, Reserva da biosfera, Laurissilva Património Mundial, e ainda o Governo quer asfaltar mais estradas! Se Santana perder o galardão, é melhor analisar com realismo e ver se não foi um caso de dar o passo maior que a perna.Lá que o povo não come reserva da biosfera é verdade, como não come asfalto nem betão.

Anónimo disse...

Muito bem explicado. O projecto na Ilha do Corvo, Açores, é muito interessante.Assim,sim.

Anónimo disse...

Costumo acompanha o fenix e gosto quando leio uma resposta com principio meio e fim...
Uma boa noite para todos os que acompanham esta página.