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segunda-feira, 6 de março de 2017

Opinião



Vamos brincar à caridadezinha



Vitorino Seixas


O presidente da Casa do Povo de Santa Maria Maior desafiou Miguel Albuquerque a criar um ATL e um Centro de Dia na sessão de inauguração das novas instalações da Casa do Povo, cedidas pelo Governo Regional. Em reposta, o presidente do Governo Regional lançou o desafio “para a Casa do Povo ter esse ATL o meu amigo tem de desenvolver todas as diligências, no sentido de esta ser constituída como uma IPSS” ¹, pois há 17,5 milhões de euros para apoios às Instituições Particulares de Solidariedade Social.

Ao ler estes desafios, surrealistas, lembrei-me dos versos da canção de José Barata Moura:
“Vamos brincar à caridadezinha,
festa, canasta e boa comidinha” ².

Na verdade, o que se espera de um presidente do Governo Regional é rigor na concessão de apoios, os quais são financiados através dos impostos cobrados aos madeirenses. Rigor não é incentivar a criação de uma IPSS com a finalidade de aceder ao “pote” de 17,5 milhões de euros. Rigor é conceder apoios a entidades cujas respostas sociais visam a satisfação dos graves problemas sociais regionais. Mas, será que se justifica mais uma IPSS? Muito provavelmente não, pois a freguesia de Santa Maria Maior dispõe de um moderno Centro Cívico ³ onde já funciona um Centro de Dia, uma Universidade Sénior e diversas atividades para crianças e jovens.

No entanto, a exigência de rigor também se aplica às IPSS. O novo “Estatuto das IPSS” ⁴, estabelece duas exigências: as contas devem ser apresentadas à Secretária Regional da Inclusão e Assuntos Sociais, para verificação da sua legalidade; as contas devem ser publicitadas obrigatoriamente no sítio institucional eletrónico da instituição, até 31 de maio do ano seguinte a que dizem respeito.

Para termos uma ideia do montante dos apoios atribuídas às IPSS, basta consultar a última listagem disponível dos “Apoios atribuídos pelo Instituto de Segurança Social da Madeira, (…) 2015” ⁵ que foram concedidos a IPSS, entidades legalmente equiparadas e outras instituições que prosseguem fins sociais, os quais totalizaram 19,4 milhões de euros.

Das 66 entidades beneficiadas com os apoios, verificou-se que 3 receberam mais de 2 milhões de euros, 1 recebeu mais de 1 milhão de euros, 7 receberam entre 500 mil e 1 milhão de euros, 11 receberam entre 200 e 500 mil euros e as restantes 43 receberam menos de 200 mil euros. Feita a segmentação por montante de apoio, que entidades publicaram as contas de 2015 no seu sítio institucional eletrónico?  

Considerando a amostra das 23 entidades que receberam apoios superiores a 200 mil euros, constatou-se que apenas 10 entidades possuem sítio institucional eletrónico, mas um deles não é atualizado desde 2015. No entanto, destas 10 entidades, apenas 3 publicaram as contas de 2015 no seu sítio, nos termos do Estatuto das IPSS. Não deixa de ser curioso que nenhuma das 8 entidades que receberam financiamentos mais elevados (superiores a 769 mil euros) tenha publicado as contas de 2015.

Em abono da verdade, deve dizer-se que a maioria das IPSS desempenha um relevante papel social na Madeira, o qual muito deve ao empenho e dedicação das equipas e dos seus dirigentes. Contudo, não podemos esquecer que muitas das suas atividades não seriam possíveis sem o financiamento público ou, por outras palavras, sem os contribuintes que são os grandes financiadores das IPSS.

Neste contexto, tendo em consideração que o propósito das IPSS é “dar expressão organizada ao dever moral de justiça e de solidariedade, contribuindo para a efetivação dos direitos sociais dos cidadãos” ⁴, a prestação de contas públicas é um sinal não só de agradecimento, mas também de respeito pelo sacrifício dos contribuintes.

Do mesmo modo, em sinal de respeito pelos contribuintes, a resposta de Miguel Albuquerque ao presidente da Casa do Povo de Santa Maria Maior deveria ter sido outra:

“Não vamos brincar à caridadezinha,
festa, canasta é falsa intençãozinha,
Não vamos brincar à caridadezinha” ².
                                                                           
¹ “Casa do Povo de Santa Maria Maior já tem instalações”
² “Vamos brincar à caridadezinha”
³ Centro Cívico de Santa Maria Maior
⁴ Decreto Legislativo Regional nº 9M, de 2 de dezembro de 2015
⁵ “Apoios atribuídos pelo Instituto de Segurança Social da Madeira, (…) 2015”

9 comentários:

Anónimo disse...

O problema é que muitas das verbas que saem dos contribuintes são para pagar chorudos ordenados e despesas de representação aos dirigentes das IPSS. Veja-se o que se passou recentemente em Machico. E depois aparecem IPSS como cogumelos, porque a "porca"(orçamento regional) tem muitas tetas, e vai sempre jorrando muitos milhões!

Anónimo disse...

O orçamento da Segurança Social sai do Orçamento de Estado. Os valores estipulados são nacionais ,por utente conforme as respostas sociais ( centro de dia, centro de convívio, lar de infância e juventude, ATL, apoio domiciliário, etc). Chorudos ordenados? Não é verdade.Em regra, as direções das ipss são constituídas por voluntários.
Quando se fala em 17,5 milhões, temos de saber para que se destinam estes milhões. Quantos utentes são abrangidos, que tipo de utentes,quantos trabalhadores empregam,etc. As ipss prestam serviço público e como tal, para o serviço público que prestam, recebem apoios públicos.
A obrigatoriedade das ipss apresentarem as contas, no site institucional, ocorre em 2017 (contas de 2016) pela 1ª vez. No ano passado, tal como em anos anteriores, enviaram as contas à SS, em prazo estipulado. As ipss em 2016 (até 1 de dezembro)tiveram de alterar os estatutos de acordo com as novas regras.
O apoio às ipss faz-se mediante acordos, conforme legislado.
Há regras e tem de haver regra com tudo.

Anónimo disse...

Quem elaborou este texto anda bem atento. E se uma IPSS não publicar as contas, a "teta" continua a jorrar leite na mesma? O princípio da transparência não quer nada com a Madeira, infelizmente.

Eu, O Santo disse...

Não interessa só a publicação das contas, mas a descriminação dessas contas, para podermos aferir quanto do apoio vai para os apoiados, i.e., o dinheiro que não é gasto em ordenados de dirigentes, administrativos, em viagens (quem viajou,...), em aluguer de instalações administrativas, carros, etc...)
As IPSS não devem ter como único contribuinte o Estado. ( o mesmo digo quanto aos clubes e associações. O Estado só deve apoiar até metade do orçamento da IPSS/Associação/Clube).

Anónimo disse...

As contas são discriminadas de acordo com as regras da contabilidade.O que deve ser feito está na legislação, não é como cada um quer ou entende.É o mesmo que acontece na contabilidade pública.Há regras, há normativos legais, há mapas e quadros aprovados e definidos. IPSS não são clubes, mas podem ser associações.Há IPSS que prestam, por exemplo, apoio domiciliário a idosos e a pessoas com deficiência, muitos deles com pensões minímas. O Estado apoia, de acordo com um valor acordado, por utente, a nível nacional. Os dinheiros para este serviço público prestado por ipss, são do orçamento de Estado e são iguais para o País inteiro.
Um trabalho com interesse, era ver para que serviram 17 milhões e meio de euros e ver quem podia fazer mais e melhor com o mesmo dinheiro.E saber quantos idosos, jovens, crianças, adultos beneficiaram desses serviços.

Eu, o Santo disse...

Vou ser sincero não li a legislação sobre isto nem conheço as regras de contabilidade, mas quase que aposto que as contas serem descriminadas de acordo com as regras de contabilidade nada diz sobre:
Ordenado dos dirigentes máximos da IPSS,
Quem viajou a conta da IPSS,
Dinheiro efetivamente gasto no apoio direto do utente da IPSS, ie, não contar com serviços administrativos e gastos em instalações administrativas, agua, luz, telefone, carros, gasóleo, etc..
Número de utentes efetivamente apoiados pela IPSS
Gasto em consumíveis e sua identificacao, exemplo, papel, papel higiénico, computador, TV, ...

Eu quero provas que o dinheiro investido numa IPsS é bem gasto.
E concluo o seguinte, se só a Secretaria conhecer esses números, então da mesma forma que pode haver benefício de algumas IPSS em detrimento de outras, poderá haver umas que cumprem, umas que aldrabam e outras que simplesmente não cumprem. Por isso deve ser exigida a publicação dessas contas no sistema da IPSS e no sistema da Secretaria com todas as IPSS apoiadas.

Anónimo disse...

Tentem saber quanto ganham os dirigentes da "garota do calhau" por mês?

Eu, o Santo disse...

Tal como sugerido pelo anónimo das 12:48 passei os olhos na "garota do calhau". Pelo que percebi:
Os membros dos órgãos sociais nada recebem, mas nada diz sobre quanto os chefes e dirigentes recebem (se existirem).
A associação recebe cerca de 230mil euro de subsídio e gasta cerca de 210 mil em ordenados.
O relatório não diz quantas pessoas lá trabalham, nem descreve a razão de ser dos cerca 6mil euros em deslocações.
A associação diz que tem 80 utentes dia. Se forem sempre os mesmos, cada utente custa 2500 euro por ano, ou 200 euro/mês.

Anónimo disse...

80 utentes por dia com que atividades? Idosos? Crianças? Pessoas portadoras de deficiência?
Almoçam? Só lancham?