AS NOVAS VANGUARDAS CAFOFIANAS

Gil Canha

Como podem ver pelas fotografias, esta peça em exposição num café da Rua Bela Santiago, bem podia estar exposta numa galeria de arte, num museu, e quem sabe, se um dia não poderá ser exibida na famosa Tate Modern londrina ou mesmo no MoMA de New York, juntamente com o Secador de Garrafas de Marcel Duchamp ou no meio duma instalação colorida de Andy Warhol.

Este “ready-made” cafofiano é muito mais discreto e sóbrio que a célebre “Fonte” de Duchamp, pois procura a penumbra, a discrição e a banalidade dos lugares comuns.  Aliás, se formos a ver, a célebre escultura em bronze de Fernando Pessoa sentado ostensivamente numa mesa de café, em frente à Brasileira, no Chiado, é lixo ao pé desta nova arte urbana.

A Câmara de Paulo Cafofo e a sua obsessão por esplanadas de vários feitios e formas, ganhou o seu esplendor artístico em Santa Maria Maior, numa rua muito frequentada por locais e turistas, que não se cansam de admirar com indisfarçável espanto, a pequenina mesa, encavalitada sobre uma armação em ferro, como se estivesse a levitar graciosamente sobre uma movimentada urbe, ruidosa, poluída, e cruel, onde os transeuntes têm que apurar todos os sentidos, para não serem colhidos pelos automóveis em grande velocidade - uma bela metáfora futurista que faria cobrir de inveja Marinetti e Santa Rita Pintor. 

Mas esta obra de arte tem um pormenor que ultrapassa todas as outras. É que a obra é vivida, isto é, existe uma personagem biológica real que completa e ocupa habitualmente este quadro/instalação. Normalmente, sabemos que está lá a misteriosa figura/cliente, porque sai uma pequena nuvem de fumo de cigarro do interior, e uma mão, não muito peluda, mas branca e lesta, que levanta e descansa mecanicamente uma chávena de café na mesa, junto a um jornal aberto, tudo o resto se dilui no bar, entre a luz e a sombra, que só uma Sfumato  dum Leonardo da Vinci conseguiria captar.

Apesar de algumas críticas de alguns vilões distraídos que tropeçam nos ferros durante a noite, a “Pequena Esplanada” (nome carinhoso como é referida por artistas locais) já lançou Paulo Cafôfo no movimento artístico internacional de novas vanguardas, o que de certa forma irá apaziguar e serenar o sr. Presidente, após o trágico porradão eleitoral que levou em cima das arcas no Domingo.